Acorrentados – por Márcio Grings
Deu certo barulho o depoimento que o santa-mariense Fabrício Silveira colocou em seu Facebook no início do mês. Na postagem, Fabrício, que hoje mora em Porto Alegre, chama a atenção para o quanto nossa cidade parece estagnada no tempo, e consequentemente, entre outras coisas, não gera oportunidades profissionais para os seus.
Ainda segundo o ponto de vista dele, em Santa Maria apenas proliferam “farmácias, carroças de cachorro-quente e lojas de R$ 1,99”. Ele ainda fala de desentrosamento social, ausência de dinâmicas produtivas, proclama que nossa classe política é burocrática, fisiológica e atordoada, além de afirmar que a burguesia local é cansada e empobrecida.
Por último, usa simbolicamente o monumento “O Idealista”, instalado na Avenida Dores para concluir sua visão das coisas. Ele diz que a estátua de Juan Amoretti é a perfeita metáfora “de alguém que quer voar, mas está acorrentado”.
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Conheci Fabrício, ou “Cenoura”, como grande parte dos amigos mais chegados o chamam, ainda nos anos 1980. Ele era um dos integrantes do Névoa Púrpura, grupo local que ajudou a agitar a cena roqueira aqui da província. Atualmente, o jornalista Fabrício Silveira é pesquisador e professor junto ao programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Unisinos. Ano passado lançou um livro muito bacana: ”Rupturas Instáveis – Entrar e sair da música POP”, publicação editada pela editora Libretos. Recomendo.
Formado na UFSM, Fabrício é um bom exemplo de profissional que tranquilamente poderia estar atuando em Santa Maria. No final das contas, como tantos outros talentos, saiu daqui em busca de uma nova Terra Prometida. Todos nós precisamos de oportunidades, e já vi muita gente boa saltando fora da carroça para alçar voo em diversos outros lugares. Eu mesmo, que nem sou tão bom assim, muitas vezes pensei em fazer isso. Talvez por ruindade mesmo, nunca o fiz.
Vejo aspectos positivos em Santa Maria, tanto que na maioria das vezes quando dou uma banda por outras cidades, visualizo o lado bom de morar aqui. Apesar de já diagnosticarmos inúmeros sintomas negativos de uma metrópole, sim, ainda somos positivamente provincianos. Gosto do ritmo do interior, é bom estar a 15 ou 20 minutos de qualquer lugar, poder dar uma escapadinha rápida na Serra e curtir a quarta colônia a pouco mais de meia hora de carro.
No meu ponto de vista, chegar mais cedo em casa é qualidade de vida. Por outro lado, nos sentimos esmagados por essa engrenagem enferrujada que move o sistema há décadas, onde cada passo à frente, parece demandar um esforço sobre-humano.
Essa semana eu fui almoçar na casa de um amigo que mora no bairro Itararé, e ao passar pela ponte que sobrepõe parte da estrutura da Gare da Estação Férrea, pude assistir de camarote uma das magníficas visões da minha infância definhando como um moribundo em estado terminal.
A máquina da politicagem atropelou, engoliu e triturou nossa ferrovia, e com isso, sem dúvida é uma das responsáveis por essa maldita conta. Usemos a Europa como exemplo de como o tal abandono foi um erro brutal. Inacreditável o que fizemos com nossos trens!
Não sei por que, mas acho que sou um dos poucos que gosta daquela estátua de metal presa as correntes na Avenida Dores. Nunca vi ninguém elogiando o dito monumento. Devo ter empatia pela imagem, talvez simplesmente pelo fato de lembrar-me de alguém que conheço muito bem. Inclusive, esse sujeito poderia ter posado de modelo para Amoretti.
Por quê? Por que muitas vezes o cara quis bater asas em outros céus, mas de uma forma ou de outra, nunca conseguiu avançar um centímetro sequer. Tenho certeza: são aquelas malditas correntes que o aprisionam eternamente a Santa Maria. Coitado dele.
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