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O Mal que habite longe de mim! – por Pylla Kroth

Desde minha última crônica na semana passada tenho refletido sobre a existência do mal e as questões relacionadas a ele, sobre a natureza humana e suas peculiaridades, seus mistérios e obscuridades insondáveis, suas inclinações e capacidades e conhecimentos do bem e do mal. E quanto mais penso a respeito do assunto, mais me assombro e me intrigo. Quanto mais mergulho em teorias e tentativas de respostas e me aprofundo nelas, ocorre-me tal como versa o poeta Ricardo de Carvalho Duarte, o Chacal, em seu “Delírio Puro”, numa estrofe que gosto de citar: “(…) no fundo do poço que me banho tem uma claridade que me namora. Toda vez que eu vou ao fundo me confundo quando boio, me conformo quando nado, me convenço quando afundo”!

Não sou teórico, acadêmico ou intelectual, sou apenas um “especula”, muito “especula”, e isto vem desde criança, em tudo que desperta minha atenção e interesse. Mas observo o mundo, as pessoas, e com eles aprendo cada dia, e meu aprendizado eu procuro compartilhar, com humildade, sem afetação, na minha vida, nas minhas músicas, no meu dia a dia, com meus afetos e com aqueles que me cercam. E puxando a brasa para o meu assado, como diz o gaúcho, há muita música e arte que questiona, de forma simples ou complexa, ao sabor das inspirações de seus compositores, a questão do mal e da natureza humana, inclusive em suas performances.

Lá por 1984, o Camisa de Vênus, banda do baiano Marcelo Nova, lançou um álbum chamado “Quem é você” e nós daqui da terrinha, que acompanhávamos a evolução do rock, também fizemos uma música com o mesmo título por coincidência! Entre as faixas do dito cujo há uma intitulada “O Mal Que habita Em Mim”, que vem muito de encontro a esta linha de pensamento que comecei esboçar nos meus escritos da semana anterior. Em um primeiro momento poderia ser definida quase como uma oração, uma prece, onde implora “Oh, Deus, perdoa o mal que habita em mim!” em mais de uma ocasião ao longo da letra. Mas também descreve as características deste mal, em certo ponto até penalizado pelo próprio: “O Mal que habita em mim, coitado, tem andado a delirar!”. A parte mais interessante da análise, em minha opinião, é quando descreve o seguinte: “Nas vezes em que ele quer me confundir, sorri e pede licença para partir. Parece que finalmente vai sumir. Mas é quando mais devo me prevenir deste mal que habita em mim. Sabe de coisas que não sei, de drogas que eu não experimentei, vivendo sempre como um fora-da-lei, e de trevas em que eu nunca penetrei!”.

É curioso, penso eu, e até mesmo assustador se pararmos para refletir que possivelmente dentro de cada um de nós habita este mal, inclinado à trapaça, à ilusão, conhecedor e capaz de coisas que não imaginamos. Neste momento, pensando nisto, creio muito que sairia espontaneamente da nossa boca a mesma exclamação: “Deus, perdoe o mal que habita em mim!” Nunca antes tinha pensado que talvez seja precisamente isto que Jesus Cristo tenha querido ensinar aos seus seguidores quando lhes deu a oração dominical com o fechamento da prece exatamente nestas palavras: “E livrai-nos do Mal. Amém!”. Lembrei-me agora da criança da piada bem conhecida que responde quando interrogada sobre o que mais temia na vida: o “Malamém”! (risos) Efetivamente acredito que é o que mais devemos temer mesmo!

Ainda no âmbito musical, artístico, performático, tenho pensado muito na definição do “diabólico” nestes dias. Minha mulher assistia noutro dia a um vídeo de uma banda de Black Metal cujo vocalista se serve de um agressivo e poderoso vocal gutural. Uma pessoa leiga do assunto ao lado, vendo e ouvindo, comentou: “que coisa incrível, né, isto sair de dentro de uma pessoa?! Até parece que tem um “encosto”!” (risos) Outro menino de uma banda do mesmo estilo comentara noutra ocasião que alguém lhe perguntara “ah, então você toca numa daquelas bandas que fazem “voz de demônio”?” (risos) E eu vejo muito, especialmente dentro deste estilo, as pessoas definirem, principalmente os leigos, o visual, a postura, a performance dos músicos como “aquilo é demoníaco, aquilo é diabólico!”, havendo bastante preconceito inclusive.

Onde quero chegar com estas observações é que, de tanto pensar a respeito do mal, cheguei à conclusão simples de que diabólico não é o músico que se traveste em corpse painting, que maquia o rosto e o corpo de branco, preto e vermelho, que ás vezes desenha um crucifixo invertido na própria testa, põe lentes de contato incolores nos olhos, veste-se de preto, spikes, correntes e tachões. Não. Este cara, na maioria das vezes, é apenas um assalariado do entretenimento, que fez de sua performance, sua expressão artística, uma maneira de atrair a atenção de seu público e ganhar seu sustento, e não há nada de errado com isto uma vez vivendo num país democrático cuja constituição preza pela liberdade de expressão artística.

Este cara, muitas vezes, no dia a dia sai na rua de cara limpa, vestindo uma camisa xadrez e uma calça jeans surrada, almoça aos domingos com os avós ou os pais e diz amém na hora da prece respeitosamente, ás vezes até frequenta alguma igreja cristã ou pelo menos não é totalmente ateu e crê em algo mais sem ser necessariamente satanista (não entrando nos méritos do satanismo ser bom ou mau ou nada disso!), faz suas doações a ONGs e entidades filantrópicas, dá aulas gratuitas de música para crianças com baixas condições financeiras ou doa para leilão um de seus preciosos e desejados instrumentos de trabalho a fim de arrecadar fundos com objetivos beneficentes. (Sim, estou citando alguns exemplos bem conhecidos, Tom Cato Visnes e Adam Nergal Darski, do Abbath e Ov Hell, ex-Gorgoroth, e do Behemoth, respectivamente.).

Então quem é uma pessoa diabólica, Pylla? Pois já não falei? Dei tantas pistas! Para mim, diabólico mesmo, demoníaco é o cara que pensa o mal, pratica o mal, planeja o mal o tempo todo, alimenta diligentemente o mal que habita nele, e dorme e acorda “matutando” como ele irá, hoje e nas próximas horas ou dias, fazer o mal para alguém e tirar proveito disso; como irá trapacear, iludir, enganar e causar dano no outro e no que é do outro para beneficiar apenas a si mesmo, ou o que ele acha que seja beneficiar. Destes, lhes digo, o mundo infelizmente está cheio. Lobos travestidos em pele de cordeiros, que nunca passaram um pingo de maquiagem preta e branca na cara, a qual anda sempre “deslavada” por aí, com um falso sorriso bonachão, que cumprimenta todo mundo na rua, que ri e fala palavras amenas e açucaradas, vestindo terno de bom corte e cores claras, que aperta muitas mãos e se desvela em elogios vazios; que bate palmas e aplaude faceiro, que abraça pela frente, cravando ao mesmo tempo o punhal por trás, que se inclina respeitosamente diante da face, mas pelas costas é só o sorriso de escárnio que tem para oferecer. Especialmente, eu diria, agora, em anos de eleições! Diabólico, diabólico! Ó, Deus, nos livre deste Mal, amém!

É difícil, difícil manter a Esperança, eu sei, mas se a oração tem poder, a cautela também tem, e bastante! Acautelai-vos, portanto, como diz a escritura sagrada, acautelai-vos dos homens ímpios, onde o mal fez morada e encontrou guarida sem precisar lutar muito com o Bem que ali deveria estar e que fugiu diante de tanto terror! Cautela e serenidade é a chave para manter a Esperança em dias melhores! E o Mal, que habite bem longe de mim! Longe de nós!

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