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Guerra Urbana. As ordens que vêm das prisões

É incrível o quanto pode ser frágil uma sociedade. Por mais democrática que seja, por mais legitimidade que possam existir em seus governantes, sempre é possível a um pequeno grupo, se não reprimido (dentro da lei), comandar o terror sobre uma população inteira.

O exemplo mais gritante dessa desconexão óbvia da sociedade vem do Primeiro Comando da Capital (PCC). A facção lidera o crime organizado em São Paulo – e quem duvida que possa estender seus laços pelo país inteiro? Eu não.

Especialmente depois de ler a reportagem assinada por Luciana Nunes Leal, que o jornal O Estado de São Paulo está publicando em sua edição deste domingo.

Com base em depoimentos de integrantes do Ministério Público paulista à CPI do Tráfico de Armas (que, por sinal, tem o santa-mariense Paulo Pimenta, deputado federal pelo PT, como relator, e cujos trabalhos devem encerrar em novembro), e com amplo material recolhido no último ano e meio do próprio MP, a repórter monta um mosaico suficientemente forte para demonstrar o quão forte pode ser um movimento criminoso. E, na contrapartida, o quão fraca e frágil pode ser uma sociedade.

O PCC domina o crime em São Paulo. E torna-se cada vez mais forte a partir de uma organização interna invejável, que faz dos seus 6 mil integrantes, distribuídos por mais de uma centena de presídios paulistas (onde a maior parte deles está encarcerada), verdadeiros braços do terror urbano. É deles que vêm as ordens que colocam em pânico uma população inteira. Duvida? Confira você mesmo, na reportagem:

”Ordens mostram o poderio do PCC
Nas mensagens, facção orienta até sobre uso de drogas ou fixa prazo para devedores; quem desobedece morre

“Aprecie com moderação” não é só a recomendação obrigatória nas propagandas de bebidas alcoólicas. É também uma ordem expressa, escrita em português tosco, dos chefes do Primeiro Comando da Capital – transmitida pelos “salves”, a forma de comunicação entre a cúpula da facção e os criminosos.

Com 6 mil membros espalhados por 134 prisões, pelos cálculos do Ministério Público Estadual, o PCC tem uma organização metódica que permite aos líderes, a maioria deles presos, controle quase absoluto do que ocorre dentro e fora das cadeias.

As anotações vão do estoque de armas às receitas e despesas mensais. Nem o número de “batismos” – a cerimônia de ingresso de um “irmão” – escapa do controle do comando do PCC.

Os salves fazem parte de um extenso material colhido pela polícia e pelo MPE no último ano e meio. No dossiê estão anotadas contribuições mensais e punições aplicadas para faltas que vão da mentira à talaricagem (mexer com a mulher do companheiro), com punições que variam da suspensão à morte. “Eles sabem o que estão fazendo”, disse o promotor André Luiz Felício, na terça-feira, à CPI do Tráfico de Armas. “Se eles estão organizados intramuros, temos que nos organizar do lado de fora”, completou Felício, que faz parte do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) em Presidente Prudente.

Encontrado em meados de 2005, o salve sobre álcool e drogas exige que os “irmãos” não falem demais, revelando a estranhos assuntos internos da facção. O não-cumprimento da ordem implica “punições sérias dentro da nossa disciplina”.

O “salve para a rua” tem seis itens, cheios de mensagens de paz e justiça. O aviso principal está no número 5: “Meus irmãos, o objetivo desse salve é que o irmão que faz uso de bebida ou qualquer tipo de drogas, que saiba usá-la, e principalmente em ambientes mais freqüentados, para que de forma alguma use o nome da nossa organização em vão. Qualquer situação enterna da organização só diz respeito a nós”. A ordem deixa “bem claro para todos os irmãos que permaneçam na rua” – em liberdade – que deslizes não serão perdoados.

A ordem foi transmitida em 21 linhas em páginas de caderno espiral grande. Mas os chefes usaram mais 56 linhas para exaltar sua suposta ideologia. “Irmãos, como vocês todos sabem a nossa raiz e semente foi plantada dentro do sistema carcerário e com essa semente plantada, foi todos os espaços adquiridos e ocupado por nós. Agora a conquista é na rua.”

Como a maioria dos “salves”, este é assinado pelo sintonia geral, elo entre a cúpula e as “células” nas ruas. A função de sintonia geral também requer autoridade para divulgar decisões como a de punir inadimplentes. Basta ver o que diz outra mensagem. Em 23 de fevereiro de 2005, o PCC divulgou um “salve geral” específico para a cobrança de empréstimos. “Deixamos todos cientes que foi trocada uma idéia referente aos companheiros que se encontram com dívidas atrasadas.” O aviso não escapa dos gerúndios típicos de telemarketing: “Vai ter os espaços de 20 dias para estar acertando suas dívidas e solucionando seus problemas”.

O alerta aos inadimplentes é rigoroso. “Com este prazo, o mesmo não chegando com seus compromissos, irá ter uma cobrança à altura do seu BO, podendo sofrer uma conseqüência severa (punição) dependendo da gravidade da situação”. A sigla BO, de boletim de ocorrência, significa crime, infração. O PCC comunica que será o juiz também nos casos de…”


SE DESEJAR ler a íntegra da reportagem, pode fazê-lo acessando a página do jornal O Estado de São Paulo na internet, no endereço http://www.estado.com.br/editorias/2006/.

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