Em frente à Casa do Povo – por Máucio
Em frente a Câmara de Vereadores da cidade tem o toco de uma árvore que foi cortada, não sei quando, nem por que, nem por quem. O vestígio do ato, no entanto está lá, como um cartão postal – um totem para quem quiser orar. Cada vez que passo por ali penso que a cena é uma amostra do padrão da consciência ecológica de nossa comunidade.
Sabemos que nossos antepassados não possuíam o menor pudor em derrubar matos, tinham a sensação de que as florestas eram intermináveis e muitas atrocidades foram cometidas até chegarmos aonde chegamos. Hoje as cidades possuem vegetação escassa, e a nossa não foge desse quadro preocupante e o pior, os projetos de arborização são inexistentes, apenas teóricos ou pontuais, realizados por iniciativas isoladas. Enquanto isso a população continua derrubando as poucas árvores que ainda restam, sob os mais variados pretextos.
A falta de fiscalização e uma legislação, inicialmente bem intencionada, mas que é hoje muito obsoleta e de duvidosa eficácia legitimam e estimulam ações depredadoras de conseqüências irreparáveis.
De onde eu moro dá para se avistar, por exemplo, o avanço de casinhas e casarões construídos morro acima, na cordilheira que abraça a zona norte da cidade. Este fenômeno também é presente na subida da serra, às margens da BR 158. Nesses lugares o desmatamento é percebido em larga escala, porque se avista a barbárie panoramicamente. O genocídio, porém, não é só ali; ocorre a todo o momento, silenciosamente, em toda a parte da cidade.
A exploração imobiliária é outra das grandes responsáveis por isso e neste caso é protegida até por lei, ou seja, cometem o ¨crime¨ legalmente, pois basta justificar e plantar um número x de mudas para poder arrancar árvores centenárias, estejam onde estiverem. Pergunto: quem garante que os novos arbustos crescerão? Quem irá acompanhar o crescimento? Que penalidades terão se as novas plantas não vingarem? Não estão nem aí, porque para eles, muitas vezes, só o que interessa mesmo são as plantas do seu lucrativo empreendimento.
As atitudes individuais ou de pequenos grupos também chamam a atenção, pois as pessoas têm muito pouca consciência do que essas práticas significam. Raros são os que lutam contra este estado de coisas e frequentemente são até ridicularizados ou ignorados ao levantarem o tema. Estabeleceu-se no senso comum que árvores exóticas podem ser cortadas por qualquer motivo. Só as nativas possuem – uma frágil – proteção. A situação é, pois, uma decorrência legislativa.
Criou-se a mentalidade de que a vegetação estrangeira não tem valor emocional, simbólico, paisagístico, climático, em resumo, valor ambiental. Se não é nativa derruba-se por uma razão qualquer, tenha a idade que tiver. Isso inclui dezenas e dezenas de espécies, muitas delas adaptadas há mais de século ao nosso território. Isto seria o mesmo que dizer que só os indivíduos nativos merecem viver e que os imigrantes e seus descendentes podem ser eliminados normalmente, afinal não fazem parte da fauna original. Original de quando?
Seria de rir, não fosse trágico. Enquanto isso aquele necrotério arbóreo continua ali na calçada da Casa do Povo, como testemunho do descaso geral reinante. Acho que poucos se incomodam com isso…
Máucio! Sim! Há uma falta de consciência ecológica crônica. Lei até que existem. E muitas são muito boas. No entanto, grande parte da população entendem estas leis como “leis menores”, ou que elas impediriam o “Desenvolvimento” ou, para falar de um termo ULTRAPSSADÍSSIMO mas que ainda usam esses menos comprometidos e mais alienados, o “Progresso”. Na verdade há de se perguntar que desenvolvimento (ou progresso) queremos. E aí, se optarmos por um teremos que dar adeuas as árvores, aos morros e, no médio ou longo prazo, adeus a propria vida humana. Ou outro, que pode até gerar menos dinheiro para aqueles poucos de sempre, mas que poderá construir uma sociedade natural, com comprometimento e respeito à vida em todas as suas formas (animal, vegetal, humana, espiritual, etc.). Abraço e parabéns pelo texto.