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Sem campo forte, não há reconstrução – por Luís Henrique Kittel

E é preciso respeito, “que se mede em ação, apoio técnico e investimento”

Estamos atravessando um dos momentos mais difíceis da história recente do Rio Grande do Sul. As enchentes devastaram casas, estradas, empresas e, principalmente, as lavouras. Agora é hora de reconstruir. Mas a reconstrução do nosso Estado precisa ser feita com responsabilidade – e, acima de tudo, com justiça. E para ser justa, ela precisa priorizar quem sempre segurou este Rio Grande de pé: o agricultor.

Foi aprovado pela Assembleia Legislativa o Programa de Recuperação da Agricultura Familiar Gaúcha, com recursos do FUNRIGS – o fundo criado para financiar ações de reconstrução após a tragédia climática que atingiu nosso Estado. O programa prevê R$ 450 milhões em repasses diretos aos produtores, com até R$ 30 mil por unidade produtiva, além de outros R$ 450 milhões destinados à compra de máquinas e equipamentos. Também estão previstas ações de assistência técnica, como o suporte da Emater. É um passo importante, sim – mas é um passo ainda tímido diante da dimensão do desafio que enfrentamos.

O FUNRIGS dispõe de R$ 14 bilhões. Desse total, R$ 450 milhões estão sendo aplicados diretamente na agricultura familiar. Isso representa cerca de 3% de um fundo que deveria, justamente, priorizar os setores mais atingidos e estratégicos para a recuperação do Estado. É preciso dizer com todas as letras: isso é insuficiente e desproporcional com quem mais precisa.

A realidade do campo é dura e está se tornando insustentável. O solo gaúcho, exausto após anos de uso intensivo e sem a devida correção, não responde mais como deveria. Hoje, utilizamos cerca de 3,8 milhões de toneladas de calcário por ano – mas precisaríamos de mais do que o dobro para atingir a correção ideal. Sem isso, o fertilizante perde efeito, a lavoura não produz o esperado e o produtor entra em prejuízo. Segundo especialistas, são R$ 360 bilhões desperdiçados por ano em produtividade, simplesmente porque falta investimento básico em calcário e manejo de solo.

E os problemas não param aí. O produtor ainda enfrenta dívidas antigas, estruturas danificadas, escassez de silos e carência de sistemas de irrigação. Tudo isso se agravou com a enchente, tornando a recuperação ainda mais difícil. O campo precisa de muito mais do que R$ 30 mil por propriedade – precisa de um plano robusto, proporcional à sua importância.

Aqui em Agudo, vivemos da terra. A economia do nosso município gira em torno da agricultura familiar, das agroindústrias, das cooperativas e dos produtores que colocam alimento na mesa de milhões. Quando o campo vai mal, toda a cidade sente: o comércio desacelera, o transporte diminui, a arrecadação cai, o desemprego aumenta.

É por isso que não podemos aceitar que o campo receba apenas uma fração simbólica dos recursos. O que está em jogo não é apenas o valor destinado, mas sim a prioridade que se dá ao setor que move o nosso Estado. A reconstrução do Rio Grande do Sul só será verdadeira se o agricultor for tratado como protagonista desse processo.

O produtor rural precisa de estrutura, crédito, irrigação, solo fértil e políticas públicas firmes, com recursos à altura da responsabilidade que ele carrega. O FUNRIGS tem capacidade para isso – o que falta é decisão política. Destinar ao menos R$ 5 bilhões do fundo para a agricultura não é exagero, é coerência.

Como prefeito de Agudo, falo com conhecimento de causa. Convivo todos os dias com produtores que seguem trabalhando com coragem, mesmo diante das adversidades. Tenho o compromisso de seguir cobrando, defendendo cada agricultor que levanta cedo e carrega nos ombros o peso da recuperação econômica e social do nosso município  e do nosso Estado.

O Rio Grande do Sul só se levanta de verdade se o campo for respeitado. E respeito se mede em ação, em apoio técnico, e, sim, em investimento.

(*) Luís Henrique Kittel, 39 anos, é jornalista formado pela então Unifra, atual UFN). É prefeito reeleito do município de Agudo (o único do PL na região), foi vice-presidente do Consórcio de Desenvolvimento Sustentável da Quarta Colônia e atualmente é vice-presidente da Associação dos Municípios da Região Central (AM Centro). Ele escreve no site às quintas-feiras.

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