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Obras privadas, mas com dinheiro público – por Anderson Santos e Dijair Brilhantes

Coluna Além das 4 linhas –  edição da semana de 8 de março de 2012 – por Anderson Santos (editor) e Dijair Brilhantes

A pauta desta semana da coluna surgiu após uma discussão através de uma rede social. Embora tenham sido feitos comentários um pouco demasiados sobre o assunto, chegou-se ao consenso que o governo está interferindo diretamente em algumas obras de estádios privados para a Copa do Mundo FIFA 2014.

A discussão posterior sobre o “chute no traseiro” proposto pelo secretário-geral da FIFA Jérôme Valcke, e o consequente pedido para que a entidade mudasse o intermediário com o Governo brasileiro, só aumenta a dúvida: quais os limites do privado – incluído o paraestatal – e o público quando o assunto é a Copa?

No início, o Governo federal veio com o discurso de que a iniciativa privada seria muito importante para o Brasil durante o processo de reforma e construção de novas arenas esportivas. Ricardo Teixeira e Orlando Silva, então ministro do Esporte, afirmavam que não seria gasto um centavo do dinheiro público.

Logo depois, quando os projetos começaram a sair do papel, o governo passou a prometer o pagamento de apenas 25% das obras, que deveriam ter os gastos focados para a infraestrutura do país, o que “fica” após o mundial. Quanto às arenas particulares, caso de clubes como São Paulo (ou Corinthians), Internacional e Atlético-PR, nenhum investimento adviria dos cofres públicos.

TUDO MUDOU

A justificativa do governo federal é de que a iniciativa privada demonstrou até agora pouco interesse nas obras. Mesmo com a liberação de empréstimos do BNDES para todos os doze estádios previstos – inclusive para os prováveis futuros elefantes brancos –, poucos conseguiram parcerias efetivas, onde os dois lados perdem e ganham.

Os orçamentos das obras, muitos baseados em projetos com várias falhas, aumentam dia após dia, mesmo que sejam oferecidas frágeis condições de trabalho, como indicam as periódicas greves de obreiros Brasil a dentro.

Em termos locais, opta-se por fórmulas alternativas, como aconteceu com a prefeitura de São Paulo, chefiada pelo “nem direita, nem esquerda, nem centro” Gilberto Kassab (PSD). A Câmara Municipal da capital paulista aprovou um projeto de lei dando mais de R$ 400 milhões de isenção de impostos para que fosse construído o “Itaquerão”.

As prefeituras e os Estados oferecem, portanto, vários “confortos”, como isenção de impostos e carta para descontá-los quando a nova arena estiver de pé. Ainda assim, muitos acabam correndo para que a União resolva os problemas.

Para abrir os cofres quando há forte interesse do capital – seja das multinacionais ou das patrocinadoras do evento – o governo sempre encontra uma maneira, e não foi diferente no que diz respeito aos estádios particulares.

Como o próprio ex-presidente do Corinthians afirma, o ex-presidente Lula (PT) foi fundamental para agir nos bastidores e garantir o “sonho” corintiano – do mesmo nível de uma conquista da Libertadores. Lula atuou muito bem nos bastidores para que o estádio finalmente saísse do papel. Graças à “amizade” com Ricardo Teixeira, e às brigas de Juvenal Juvêncio com quase todos, ainda ganhou a ampliação do local, com direito a sediar a abertura da Copa do Mundo FIFA 2014.

Com isso, aquele papo de que as empresas colocariam dinheiro e financiariam as reformas – como já ocorrera com os Jogos Pan-Americanos do Rio, em 2007 – vai correndo rio abaixo. Em alguns casos, os de estádios privados, ainda há a venda dos nomes dos estádios, que, porém, ficaria com a construtora e/ou clube responsável pela obra.

A NOVELA BEIRA-RIO E A POSSÍVEL CANETADA DA PRESIDENTA

Mas parece que não só o presidente Lula teria agido pela emoção. Em meio a uma briga de quase um ano entre Internacional, Andrade Gutierrez e Banrisul, com o BNDES à espera de garantias financeiras, a presidenta Dilma Rousseff teria entrado em campo para dar um ultimato à Andrade Gutierrez.

Depois de toda a novela, que foi brevemente relatada na coluna passada, parece que estamos perto de ter a decisão final – nem que seja com o prazo dado pela prefeitura de Porto Alegre, até o fim de março, para passar a adotar um Plano G (a Arena do Grêmio).

Algumas dúvidas ainda pairam no ar: O que teria feito a presidenta para fazer a AG mudar da noite para o dia? Qual artificio foi usado pelo Governo federal para resolver um problema que se arrasta por mais de meio ano? E por que esperaram Porto Alegre perder a Copa das Confederações para agirem?

Parte do Rio Grande do Sul acredita que Dilma agiu com a emoção, para não deixar o estádio do seu clube de coração fora da Copa. Há divergências sobre o assunto até mesmo entre os autores desta coluna. Afinal, a presidenta não é tão fanática por futebol quanto o seu antecessor. Além do que, as relações entre empreiteiras e obras, públicas ou não, no Brasil mereceriam mais livros do nível do “Privataria tucana” (Amaury Ribeiro Júnior).

As dúvidas de sempre, agora no lado político, sempre surgem: Por que sempre o oligopólio de empreiteiras se revezam nas obras públicas desde muitos anos? Alguém explica o porquê de o Inter ter sido “convencido” a não tocar a obra por conta própria? Por que não formar o pool de construtoras gaúchas para uma simples reforma?

KICKING THE ASS

Enquanto isso, em Brasília, a Comissão de Esportes aprovou a Lei Geral da Copa com bebidas nos estádios e tudo o mais. O caminho ainda é longo para a sanção da presidenta.

O grande problema dela é que o acordo assinado com a FIFA em 2007 parece que não foi lido direito, afinal todos os prováveis problemas com meia-entrada, vendida de bebidas nos estádios e tudo o mais estavam no caderno de encargos quando da candidatura única para o evento.

A entrevista raivosa de Jerôme Valcke para a imprensa europeia falou o que é verdade e uma realidade brasileira de muito tempo: arrasto para construir ou reformar, demora para a aprovação de leis, etc. O problema foi como ele disse isso.

Primeiro ele falou que o Brasil deveria levar um chute no traseiro para começar a fazer as coisas – e como uma expressão em francês pode ter sido mal traduzida se a frase foi falada em inglês?

Depois, falou que o país parecia muito mais interessado em ganhar a Copa que em fazer uma – repetimos a piada de dezenas de outros, ele não vê o time que o Mano Menezes coloca em campo para acreditar em tamanha leviandade!

Aldo Rebelo (PCdoB/SP), o deputado que propôs um projeto de lei para acabar com os estrangeirismos na Língua Portuguesa aplicada no Brasil, respondeu ao gringo como, finalmente!, deveriam ter feito no Governo federal há algum tempo: “não dialogaremos mais com este sujeito”.

Falamos que isso deveria ter ocorrido há mais tempo, porque Valcke é o único homem que gerou uma dívida para a empresa em que trabalha, após uma negociata para que a Visa assumisse o lugar da Master Card como patrocinadora dos eventos-FIFA – com direito a quebra de contrato e perda judicial – e, logo em seguida, foi promovido! Tem-se como confiar em alguém assim?

Porém, após pedidos de desculpas públicos vindos de Zurique – e não de Lousanne, para onde a resposta do Ministério do Esporte foi inicialmente – talvez isso mude.

Há quem já deixe no ar a possibilidade de a Copa do Mundo não ser realizada no Brasil, mas repassada à Inglaterra, como uma forma de diminuir as críticas da imprensa local pelo fato de o país ter perdido para a Rússia e o Catar (!!!) a sede dos mundiais seguintes. Inocência à parte, como diria o britânico Andrew Jennings, a FIFA não teria essa coragem toda para realizar tal ato.

Basta lembrar o tamanho do Brasil, e da paixão dos seus torcedores – Neymar que nos salve! –, para entender o potencial para este evento ocorrer aqui e, principalmente, se conseguirem tirá-lo daqui. Bastaria um estímulo da Rede Globo, por mais parceira que seja da entidade internacional, para as pessoas irem às ruas “em defesa do futebol brasileiro!”.

Tudo bem. Ricardo Teixeira queimou todas as suas possibilidades para assumir o lugar de Blatter quando ajudou na campanha passada o rival do suíço, Bin Hamman, mas não cremos que se chegaria a tanto…

Como diz o ditado, até 2014 muita água ainda vai passar por debaixo da ponte. Espera-se que o futebol e o bolso dos brasileiros sobreviva até lá!

(Para quem quiser nos ajudar respondendo algumas das perguntas feitas aqui, ou criticar e/ou sugerir assuntos, entre em contato através dos e-mails [email protected] e [email protected]).

QUEM ESCREVE:

Anderson Santos é jornalista e mestrando em comunicação social na Unisinos ([email protected]), Dijair Brilhantes ([email protected]) é estudante de jornalismo

Twitter da coluna: @alem_das4linhas

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