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“Quando o carnaval chegou” – Por Michael Almeida Di Giacomo

Em 2021, por conta da pandemia, não foi possível nenhuma noite oficial de folia. Nada de escolas de samba nas avenidas. Nada de blocos a invadir às ruas das cidades carnavalescas no país.

Aos que não estão a promover aglomerações, clandestinas ou não, além do merecido descanso no feriado, restam às memórias de carnavais passados. E, para muitas pessoas, não faltam boas recordações.

Eu, ainda adolescente, guardei em minha memória afetiva a voz de Luiz Melodia a cantar um sentimento de dor: “Carnaval, carnaval, carnaval, fico tão triste quando chega o carnaval. Eu me lembro duas noites de alegria. E recordo que perdi minha Maria”.

Mas, carnaval não é só alegria? O contexto melancólico cunhado na letra da canção fala de um amor de carnaval, de duas noites de alegria e do fato de, no terceiro dia, ele ter perdido sua Maria e, com isso, obviamente, a alegria. Não teve jeito.

E o carnaval não são quatro noites de festa pagã? Ao perder seu amor no terceiro dia, a quarta noite já não seria a mesma. Faz sentido.
Confesso que pelo distanciamento histórico da canção, e por não ser nenhum expert da música nacional, ainda não consegui entender se foi a Maria ou somente a alegria de seu amado que de fato morreu no terceiro dia de folia.

Na verdade, parece ter sido os dois.

Sem a intenção de avançar mais sobre letras de samba ou canções que nos remetem ao carnaval, chamo a atenção de que não é preciso ter sido contaminado pelo “micróbio do samba”, termo cunhado por Lupicínio Rodrigues, para gostar e participar de uma noite de folia. Às vezes, só por estar em um ambiente de festa entre amigos já é um ótimo motivo.

No Brasil carnavalesco, cada um de nós tem uma história, uma lembrança, boa ou nem tanto, de noites de folia, de amores, desamores e alegrias carnavalescas. Bem, pelo menos, grande parte das pessoas tenha alguma recordação.

Eu, por exemplo, além da canção entoada por Luiz Melodia, guardo em minhas lembranças as tardes, quando criança, e noites, já adolescente, no Clube Caixeral Santa-mariense.

Hoje, parece, que os carnavais de clube perderam força. Mas, isso pode ser só a impressão de foliões que deixaram na sua juventude o espírito carnavalesco, e, na voz de Martinho da Vila, fazem parte do “bloco da saudade”.

O fato é que realmente as noites carnavalescas de Santa Maria, além dos desfiles na avenida, eram festejadas em inúmeros clubes, como o Santa-mariense, o Atirador Esportivo, o Clube Comercial, o Clube 21 de Abril – Sociedade Ferroviária, onde em alguma noite de carnaval, ao lado de meu pai e meu irmão, ambos radialistas, participei da “Noite da Imprensa”.

E, claro, em tempos passados, certamente, haviam muitos outros. É que minha adolescência aconteceu na década de 1990. Não irei aventurar-me a falar sobre o que não vivi, sob pena de cometer algum equívoco.

Alguns dos clubes daquela década ainda protagonizam noites de folia para a atual geração, como o Avenida Tênis Clube e o Dores. Mas, o Caixeral foi o que mais frequentei.

Na minha primeira tarde/noite o que me causou estranheza foi o fato de que as pessoas não exatamente dançavam, ficavam girando em círculo no centro do Salão. Na verdade, era, ou é, uma das características dos carnavais de Salão.

Um encantamento eram os blocos dos clubes, que hoje, nas capitais e grandes cidades do país, saíram dos Salões e tomaram conta das ruas.

Dos blocos tenho a lembrança do “Etc. e tal”. Era o mais pujante do clube e um dos maiores da cidade. Seus integrantes ganhavam vários prêmios de destaque e, acredito, em algumas edições, até de melhor bloco da cidade.

O bom do Caixeral é que eu morava perto, uma quadra de distância. Próximo da meia-noite já ouvíamos o conjunto musical esquentar os instrumentos. Eu e minhas irmãs chegávamos cedo no clube e só saíamos com o sol a raiar.

Afinal, abusando um pouco do mestre Cartola, queríamos ver o sol nascer, queríamos viver. E carnaval, como canta Caetano Veloso: “Atrás do trio elétrico só não vai quem já morreu”.

É vida!

Vida que não existe mais no Clube Caixeral.

Interditado, com faixas de segurança no seu entorno, já não brilha como antes. Nem por isso deixa de guardar uma parte rica da história da nossa cidade.

E assim deve ser lembrado.

Não com melancolia, mas a celebrarmos os tantos momentos de alegria que proporcionou ao santa-marienses e às muitas pessoas da região que vinham passar as quatro noites de folia na cidade.

Que Santa Maria possa ter grandes carnavais no futuro.

*Michael Almeida Di Giacomo é advogado, especialista em Direito Constitucional e Mestre em Direito na Fundação Escola Superior do Ministério Público. O autor também está no twitter: @giacomo15.

Crédito da foto: Prefeitura de Santa Maria / Arquivo

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