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A vida tem que continuar – por Daiani Ferrari

Qual o tempo do luto? Durante quanto tempo a dor da perda vai existir? Não passei a semana em Santa Maria, mas pelo que vi através da televisão, internet e relatos de amigos, não está nada fácil suportar a perda de tantos jovens provocada por algo perfeitamente evitável. Minha cidade do coração está vivendo em luto. Mesmo em Candelária, o assunto nas rodas de conversa é a tragédia de Santa Maria, pois daqui também são alguns jovens que podiam estar lá naquele fatídico dia.

Rememorando sobre as vezes em que a perda me assombrou, dei-me conta de que o luto é eterno. Vejo velhinhos na rua que me lembram meu avô, que perdemos em 98, eu acho, e isso me comove. A cada churrasco, lembro de um tio que vai ficar para sempre marcado como o melhor assador de todos os tempos. Ainda dói lembrar do dia em que minha prima ligou avisando da morte dele. Cada vez que vejo meu mural de fotos, lembro de um amigo, apenas cinco dias mais velho que eu, que morreu de uma maneira tão bruta e inesperada e penso em o quanto a vida é curta.

E nesta sexta, quando comecei novamente a trabalhar como jornalista, lembro de outro amigo tão importante, que apostou em mim e ajudou a formar uma Daiani jornalista talvez melhor do que eu teria sido sem ele, o que me corta o coração. E não tem um dia que eu chegue em Santa Maria durante a noite, que eu não lembre daquela segunda-feira em que cheguei na cidade para dizer adeus.

Durante a semana, trabalhei todos os dias. Fiquei ligada nas notícias na televisão, jornais, internet, buscando razões para o acontecido e compartilhando a dor de quem perdeu parentes e amigos e a dor de uma cidade inteira, que mesmo de longe, é minha dor também. Na quarta-feira, dia de jogo do Grêmio, vi amigos questionando o porquê de haver pessoas torcendo por um time de futebol quando há milhares sofrendo por uma dor maior que qualquer outra coisa.

Não simpatizei com o comentário, porque naquele  mesmo dia decidimos que era dia de celebrar. Fizemos um jantar especial para dois, tomamos uma cerveja e olhamos o jogo, porque decidimos que aquele seria um bom momento. Celebrarmos um dia melhor que o domingo, a segunda e a terça-feira, um dia pior que os próximos que estavam por vir e a vida, que desde domingo vemos como é passageira.

Estar de luto, para mim, não é abdicar de toda e qualquer atividade, ficar triste por um tempo x ou condenar aqueles que agem diferente de mim, afinal de contas, a vida tem que continuar. Estar de luto é sempre lembrar dos que se foram e o que eles representaram. É também aprender com eles a valorizar ainda mais o que temos. Eu não conhecia ninguém que perdeu a vida na tragédia, mas o meu companheiro de todas as horas conhecia e eu vi a dor dele quando teve que ir no velório abraçar o pai e a mãe do guri, amigo de infância.

Vi minha irmã peregrinar a semana todo até o hospital para ficar com as famílias das amigas internadas. Independente de ter visto o jogo, pensado em viajar no carnaval, trabalhado por cinco dias, dado risada em vários momentos durante essa triste semana, eu estou em luto e ficarei em luto pela minha cidade pelo resto da vida, assim como ainda estou em luto pelos meus que perdi há algum tempo.

A vida continuar e seguir seu rumo não significa que não nos importemos. A batida foi tão forte que causou uma dor tão grande que remédio algum vai tirá-la de nós. A madrugada de domingo nunca terminará. A vida tem que continuar, embora ela nunca mais seja a mesma.

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Um Comentário

  1. Dai, muito bom o teu texto! O verdadeiro luto, e quem já perdeu amigos e familiares próximos sabe disto, se dá no dia a dia, nas boas lembranças que a pessoa nos deixou. Na saudade que, mesmo guardada por anos, surge nas mais diferentes situações. No carinho ao falar da pessoa que partiu antes. E até na força, que precisamos ter, para seguir vivendo.

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