Os dias do camerlengo – por Luciano Ribas
No dia 28 de fevereiro, quando o alemão Ratzinger entregar o seu “Anel do Pescador” para ser destruído e, com este gesto simbólico, encerrar oficialmente o seu papado, o Vaticano passará pelo que se chama de “Sede Vacante”. Sem um papa no trono de São Pedro, quem comandará os negócios terrenos na matriz dos católicos será o camerlengo, um cardeal que deve assegurar a realização do conclave e a escolha do novo soberano, entre outras funções.
No emaranhado de palavras estranhas associadas aos ritos e costumes da Igreja Católica, camerlengo é apenas mais uma. Não está entre as que mais devem preocupar quem acredita no direito à igualdade e no respeito à diferença. Certamente “trono” e “soberano”, presentes no parágrafo inicial desse texto, possuem muito mais eloquência para revelar o anacronismo das cada vez mais herméticas tradições do catolicismo (e não apenas dele, é bom que se registre).
Mas “camerlengo” não é apenas um termo estranho ao mundo secular. Sua função não parece encontrar paralelo nas repúblicas e monarquias constitucionais atuais, pois ele não é vice ou sucessor de alguém, nem pode ser considerado um interventor (e se houver algo assim em alguma delas, confesso minha ignorância). Talvez pudesse ser comparado às “eminências pardas”, mas estas não possuem nomeação ou escolha formal – ao menos até o presente momento.
A única situação que me ocorreu onde poderia ser institucionalizada a figura do camerlengo seria a do “sumiço”, temporário ou permanente, do governante. Explicando melhor: se ficar caracterizado, por exemplo, que o “sumido” cometeu óbvia omissão frente a acontecimentos relevantes e/ou graves à comunidade que deveria liderar ou, ainda, se houver demonstração evidente de que ele (ou ela) demonstrou estar aquém das responsabilidades impostas por determinado cargo. Em situações assim, talvez um camerlengo pudesse “tomar conta da lojinha” (como o faz o do Vaticano) até que alguém mais apto assuma as funções, por sucessão formal ou por escolha democrática da população.
Mas, quase no final desse pequeno texto, me ocorre que talvez isso já esteja acontecendo em determinados lugares. E um (ou até mesmo mais de um) camerlengo (ou “camerlenga”) esteja suprindo a ausência de eleitos que demonstraram pouca coragem nas horas ruins e “muito ego” nos momentos bons. Naturalmente, não o fazem amparados na “lei divina escrita pelos homens”, como o de Roma, mas na impossibilidade de existir espaço vazio no mundo da política.
Infelizmente, nesses hipotéticos casos, provavelmente não haverá fumaça branca para corrigir as coisas. Ao menos não antes das próximas eleições.
Este é um artigo que deve ser guardado para a posteridade! Genial…
Virge. Na minha cidade tem um camerlengo
Tem camerlengo homem, camerlenga mulher…
Será que algum dos camerlengos quebrará na martelada o anel dos Papas (sim, plural)?
Se a vaidade nortear o afã de agradar a sede de anel do povo, é capaz de ser disputado o cabo do martelo.