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A música do Chico – por Daiani Ferrari

Tem dias em que parece que era melhor ter ficado na cama. Quando os planos vão sendo derrubados, um a um. É o dia em que você tem médico e fica na sala de espera por mais de duas horas e vê o tempo passando, as pessoas entrando, sendo atendidas antes de você, vê o umbigo daquele senhor gordo que parece querer sair da camisa. Não tem mais revista que você não tenha visto.

Depois disso, você recebe parabéns da médica por ter perdido quatro quilos de gordura e seis centímetros de circunferência abdominal. Dos 97 centímetros, agora restam 91. Você recebe duas receitas de remédio para emagrecer que talvez nem precise, mas é o único jeito que faz com que você atinja seu propósito. Mas isso não te traz felicidade, pois só consegue pensar naquele xis filé bacon que está em sua cabeça há dias e dias.

Você sai do médico e vai a uma fruteira, compra frutas, verduras, legumes – coisas certas para enganar a fome. Pensa que vai ter um jantar dos mais saudáveis da história e quando está chegando em casa, percebe que esqueceu a chave numa loja. São 19h30min e você só vai recuperá-la depois das 21h. O que fazer? Culpar-se, chorar, gritar, chamar o chaveiro para arrebentar a porta e gastar R$ 300,00 para colocar uma fechadura nova. São opções, mas resolve esperar.

Quando consegue resolver o problema da chave, já não dá mais tempo para cozinhar, porque seu TOC não permite fazer janta tarde da noite. Você pede um xis e o come com prazer e culpa e pensa que o dia foi um desastre total. Para aliviar a cabeça, faz um bolo com recheio de brigadeiro e morango e cobertura de chocolate branco – o horário permite o preparo de sobremesas, vai entender! Feito o que era planejado para o dia e suportado o que não era, o que fica são os restos e a louça para lavar.

Pega o jornal para arejar a cabeça e descobre sobre o David Coimbra e seu câncer. Abre o facebook e vê mais um relato de um pai que perdeu o filho na Kiss. Vê a foto do menino que teve o braço decepado em um acidente na Avenida Paulista. Acompanha as pessoas pedindo que seja erguido um monumento em homenagem ao Paulinho bilheteiro. E pode até pensar que seus problemas não são nada se comparados a isso, mas são. São seus.

Cada um sabe o peso de sua vida.

E no final do dia, você só consegue pensar num trecho de uma música do Chico – “Tem dias que a gente se sente como quem partiu ou morreu”. E em fazer terapia.

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2 Comentários

  1. Dai, teu texto é uma prova de que os pequenos dramas do dia a dia, que nos incomodam, chateiam e nos fazem até perder o sono, rendem uma boa crônica. Vontade de comer uma fatia deste bolo, com recheio de morango, brigadeiro e esperança.

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