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Pra ninguém – por Daiani Ferrari

Seu João trabalhou o dia inteiro, numa onda do mais puro azar. Pela manhã, perdeu o ônibus, por isso chegou atrasado. Ganhou uma estagiária no trabalho e logo viu que teria que fazer o serviço por dois. A moça era sobrinha do chefe, ou seja, mero enfeite na firma. Tentando abstrair, foi almoçar. Como chegou tarde ao trabalho, foi almoçar tarde, numa hora em que sobram somente as saladas encharcadas de azeite, o costumeiro arroz branco e a carne dura e seca.

Aquele não era seu dia, constatou. E não era mesmo. Chegando à firma de tarde, a mesa estava cheia de afazeres recém encaminhados pelo chefe, justo naquele dia em que pensou sair no horário para pegar a “véia” e levar para jantar. Fazia dias que ela reclamava que não saiam mais como antigamente. Não sabia se era o dinheiro curto ou se o marido tinha outra. Para evitar mais aporrinhação, ia levá-la ao restaurante da dona Teresa, duas quadras distante de casa. Não podia ser nada muito longe porque o táxi na cidade custa caro e o carro estragou.

Nem sabia se ia mandar arrumar logo ou investir o dinheiro que tinha guardado há um bom tempo na compra de um opala. Era um belo opala, inteirinho, que fazia brilhar os olhos (Ele ia comprar o carrão, sim). Mas, na mesma tarde o vendedor do opala ligou, aos prantos, querendo desfazer o negócio, porque aquele era o amor da sua vida. Pediu que seu João entendesse aquele amor e não quisesse mais levar o carro que o acompanhara por tantos anos. Vendo a angústia no moço, seu João desistiu do negócio. No final das contas, ia mandar arrumar o carro da família.

Quando foi para casa, caminhando e pensando em como pobre só tem problema na vida, viu algo que o ajudou a levantar a cabeça. Um carrão de rico, parado no meio da rua, com um senhor engravatado tentando dar a partida no motor e uma moça de salto alto e roupa bem cortada que gritava aos quatro ventos que os bônus do telefone haviam acabado.  O homem respondia para ela que nem adiantava tentar acionar o seguro, as parcelas estavam atrasadas.

Seu João constatou que a vida não estava fácil mesmo. Pra ninguém.

“É, a vida não tá fácil pros de a pé, mas também não tá fácil pros de a cavalo”, comentou com a “véia”, durante o jantar, que pagou em dinheiro. Assim como o carro.

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