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Defensores da liberdade na rede: os criptopunks – por Leonardo Foletto

Na década de 1990 e até meados dos anos 2000 era comum falar do cyberpunk, aquele subgênero da ficção científica que filmes como “Blade Runner”, “Minority Report” e “Matrix” ajudaram a popularizar. Ambientes futuristas, mundos apocalípticos, personagens “outsiders” do mundo convencional, música eletrônica, alta tecnologia e baixo nível de vida eram características marcantes do cyberpunk, que tem no livro “Neuromancer”, de William Gibson, a sua obra mais característica.

leonardoDe alguns anos pra cá, nesta segunda década dos anos 2000, tem se falado de outros “outsiders” do mundo digital, muito menos glamorosos que os cybers: os criptopunks (em inglês, “cypherpunks”). São defensores radicais da liberdade de informação na rede, hackers que usam e abusam da criptografia para se proteger da vigilância dos governos e das grandes corporações. Seu lema é “transparência para os fortes, privacidade para os fracos”; não por acaso a frase de ordem do Wikileaks e seu líder, Julian Assange, o mais conhecido dos criptopunks.

Uma de suas obras principais é “Cypherpunks: liberdade e o futuro da internet”, publicado em 2013 pela Boitempo. Trata-se de uma compilação de conversas de Assange com quatro de seus amigos criptopunks, todos hackers de primeira linha: Jacob Appelbaum, especialista em segurança em computadores e faz parte da equipe do TOR, o mais conhecido software que permite a navegação anônima na rede; Andy Müller-Maguhn, membro do Chaos Computer Club, a principal organização de hackers da Europa, criada em 1981 em Berlim e um dos mais combativos coletivos mundiais em defesa do anonimato da rede, promotores de diversos eventos sobre o tema; e Jerémie Zimmerman, porta-voz e um dos criadores do La Quadrature de Net, grupo de advogados franceses que são referência fundamental em direito digital e liberdade na rede, e que ano passado esteve, junto com Jacob, em uma temporada no Brasil participando de eventos sobre internet e “criptopartys” (festas com música eletrônica e oficinas de criptografia e privacidade na rede) Brasil afora, inclusive em Porto Alegre para o Fórum Internacional do Software Livre, o FISL.

O livro é fruto de entrevistas que fazem parte do programa “O Mundo Amanhã”, 12 episódios com entrevistas realizadas por Julian Assange com nomes como Noam Chomsky, Tariq Ali, o líder do Hezbollah, Sayyed Hassan Nasrallah, o presidente do Equador Rafael Correa, entre outros.

“Uma guerra invisível e frenética pelo futuro da sociedade está em andamento. De um lado, uma rede de governos e corporações vasculham tudo o que fazemos. Do outro lado, os Criptopunks, desenvolvedores que também moldam políticas públicas dedicadas a manter a privacidade de seus dados pessoais na web. É esse o movimento que gerou o WikiLeaks”, diz Julian Assange, na introdução da conversa.

“A arquitetura é a verdade. E isso vale para a internet em relação às comunicações. Os chamados ‘sistemas legais de interceptação’, que são só uma forma branda de dizer ‘espionar pessoas’. Certo?”, cutuca Jacob. “Você apenas coloca “legal” após qualquer coisa porque quem está fazendo é o Estado. Mas na verdade é a arquitetura do Estado que o permite fazer isso, no fim das contas. É a arquitetura das leis e a arquitetura da tecnologia assim como a arquitetura dos sistemas financeiros”.

O debate segue apoiado nas possíveis perspectivas para o futuro. Para os ativistas, as políticas devem se pautar na sociedade e nas mudanças que seguem com ela, não o contrário – o que concordo inteiramente.

“Temos a impressão, com a batalha dos direitos autorais, de que os legisladores tentam fazer com que toda a sociedade mude para se adaptar ao esquema que é definido por Hollywood. Esta não é a forma de se fazer boas políticas. Uma boa política observa o mundo e se adapta a ele, de modo a corrigir o que é errado e permitir o que é bom”, diz Jeremie.

Mas sabemos que a busca por novas políticas e uma nova arquitetura tem “o seu preço”, para usar um clichê jornalístico. Jacob, detido várias vezes em aeroportos americanos, conta: “eles disseram que eu sei por que isso ocorre. Depende de quando, eles sempre me dão respostas diferentes. Mas geralmente dão uma resposta, que é a mesma em todas instâncias: ‘porque nós podemos’”.

E provoca: “a censura e vigilância não são problemas de ‘outros lugares’. As pessoas no Ocidente adoram falar sobre como iranianos e chineses e norte-coreanos precisam de anonimato, de liberdade, de todas essas coisas, mas nós não as temos aqui”.

Jeremie também cutuca o poderoso Google: “É só olhar o Google. O Google sabe, se você é um usuário padrão do Google, o Google sabe com quem você se comunica, quem você conhece, do que você pesquisa, potencialmente sua orientação sexual, sua religião e pensamento filosófico mais que sua mãe e talvez mais que você mesmo”.

Em tom “ameaçador”, avisam: para se ter paz na internet, é preciso haver liberdade. Ou a guerra vai continuar. Não é?

Assista aqui abaixo os dois episódios do programa, que foram a base das entrevistas do livro publicado pela Boitempo. As legendas e adaptações para o português foram feitas pela Agencia Pública, parceira do Wikileaks no Brasil. Para assistir os outros episódios de “O Mundo Amanhã”, dá pra consultar a BaixaTV, do BaixaCultura.

Parte 1: https://www.youtube.com/watch?v=n2_ON1swsok

Parte 2: https://www.youtube.com/watch?v=BzRkAyG41y0

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