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Cinemas: a Cidade Cultura requer. Não é aceita recusa – por Luiz Alberto Cassol

Artigos são para emitir opinião. O resto é balão de ensaio.  Parece óbvio como sempre digo. Não é. Tem coisas que é preciso que sejam repetidas. O último artigo que escrevi, aqui neste espaço, surtiu muitas controvérsias e pessoas tentando pautá-lo. Pois é. Artigos são escritos exatamente para matutar sobre. E o contraditório é necessário e bem-vindo.

Vamos ao tema desse artigo.

Sou um defensor de cinemas de calçada. Acho um cinema de calçada poético, sensível e com tez própria. Cinemas de calçada ou de rua são aqueles que tu entras direto da calçada à sala. Então, uma cidade como Santa Maria merece ter um cinema de calçada. Assim como tem vários Cineclubes, faz jus ao seu romântico e fiel cinema de calçada.  E, da mesma forma, também sua população não pode ser privada de outras opções, como os cinemas de shopping, por exemplo.

O fechamento das salas da Movie Arte Cinemas no Santa Maria Shopping é uma perda irreparável para a cidade. Não interessa se um dia, um mês ou um ano. O raciocínio que faço aqui é bastante objetivo: como fica o espaço temporal onde uma comunidade fica sem a opção de ir ao cinema, sendo essa uma opção de um filme voltado ao entretenimento ou à reflexão?

Vou fazer um exercício prático e lógico. Vamos reduzir hipoteticamente a cidade a cinco quarteirões no entorno do Shopping citado. Essa população está privada de ir ao cinema. E quanto isso vale em termos psicológicos, históricos e culturais para esses cidadãos. Refiro-me ao “não poder optar”. No caso do fechamento das salas não há opção. Essas pessoas a que me ative estão sem alternativa. Não se trata da parte desse público que vai ou não; se trata que nenhuma parte desse público poderá ir. E isso não tem valor. São indivíduos ceifados da possibilidade de ir.

Por isso defendo que a administração do Santa Maria Shopping deveria ter feito todo o esforço para a manutenção desse espaço cultural. Tentar de todas as formas possíveis e imagináveis fazer com que os espaços ficassem lá.

O jogo dos grandes distribuidores é muito pesado. Vou resumir ao máximo como acontece o negócio. Os grandes distribuidores – usando um número hipotético – distribuem cem filmes de longa-metragem ao ano. Desses, dez, os chamados blockbusters, 99% americanos, vão sustentar a bilheteria dos outros noventa.  E esses grupos de distribuidores fortíssimos no mercado ofertam seus filmes a grandes grupos exibidores. E aí os menores, como no caso da Movie Arte, muitas vezes ficam a mercê desse escala devassadora. É bom lembrar sempre que a indústria do entretenimento (cinema e audiovisual juntos) é a segunda maior indústria americana, perdendo apenas para a do armamento.

Então, é nessa hora que o Santa Maria Shopping e a comunidade devem se unir exatamente para não deixar fechar mais essa opção. Pois com divulgação e trabalho conjuntos o cinema se torna viável.  Caso contrário temos um paradigma: o da perda da possibilidade de ir a um lugar que se deseja para ver um filme e refletir, sorrir, ambos, o que for. Perde-se. E, ao aniquilar isso, no espaço e no tempo fica como algo que não existe na rotina, no cotidiano, na opção.

A administração do Santa Maria Shopping tem que entender que a cultura é pulsante, é vibrante e é um bem intransferível, intransponível.  “Entendo” que uma empresa privada tenha como principal objetivo o lucro. Mas também sei de sua responsabilidade social para com a comunidade onde está inserida. E a cultura integra e é fundamental ao desenvolvimento dessa comunidade.

Espero que isso seja revertido. Que a Movie Arte Cinemas consiga novamente seu espaço em Santa Maria. A Cidade Cultura merece. Ou melhor: a Cidade Cultura requer!

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4 Comentários

  1. Tem outro lado,Beto, outro dia lendo um comentário de um cinéfilo em São Paulo.
    Comparando o "Estrupo" das Salas de cinema nacional. Quando a estréia de um "abacaxi destes", "jogos não sei-o-que", iria ocupar 99,5% das salas do Brasil.
    Com perdão aos que gostem, mas não assisto filme de bichinhos, bruxinhos e outros tais Harry poter…etc.
    Bons tempos do Independência, Glória e Glorinha.

  2. Com minha companheira, costumava frequentar semanalmente a referida sala. Eram as salas de exibição onde os filmes mais "alternativos" da indústria cinematográfica tinham algum espaço. Agora, estamos órfãos… Porém, infelizmente, há que se concordar com os responsáveis pelo Movie Arte, havia dia que só nós dois assistíamos o filme exibido. Isso não foi uma, nem duas, nem três vezes, foram várias… Acredito que o problema está no perfil da maioria dos habitantes de Santa Maria e suas origens provincianas, conservadoras, militarescas e tradicionalistas. A cultura é nivelada por baixo, reproduzida e raras vezes pensada e questionada. Ou será possível imaginar que a maioria do(a) jovem que frequenta CTG e "sertanejo universitário", que passa o dia falando aos berros, ouvindo música que trata bicho e mulher com desdém, isso quando não ocupam a maior parte do seu tempo falando em futebol, tem espaço em sua "agenda" para saborear um bom filme, interpretá-lo e desacomodar-se com isso?! Essa é a realidade e lamentavelmente Santa Maria não faz nenhum esforço em, ao menos, tentar ser um lugar um pouquinho mais progressista. No RS, tirando POA e Pelotas, não sei se alguma outra cidade tem um ambiente cultural, que cultive o gosto às artes de fato. Santa Maria está longe de ser chamada de "Cidade Cultura", hoje não passa de um "lugar-comum" às pequenas cidades do RS.

  3. Há controvérsias. Não dá para saber se as características que levaram SM a ser chamada de cidade cultura ainda persistem. Não sei se fora da cidade ainda a consideram assim.
    Outras cidades avançaram e não existe evento cultura na cidade capaz de alavancar o turismo, por exemplo. A comuna está deitada no berço explendido do salário dos funcionários públicos e o resto da economia aparentemente não consegue sustentar a cultura como deveria (ouvi falar que a lei de incentivo a cultura foi utilizada para subsidiar encontro de motoqueiros, não consegui confirmar).
    Passo Fundo tem a Jornada de Literatura. Santa Maria tem feira do livro e deve ser uma briga colocar na rua. Mas cidadãos da aldeia cosmopolita acham bom não trazer gente de fora e incentivar a produção local. POA também tem feira do livro, atrai gente de fora e parece que faz água, não é a mesma coisa.
    Festival de dança? Joinville. Música? Quarta colônia não é SM. E tem um numa cidade perto de Joinville que é muito maior.
    Pelotas teve festival de jazz outro dia, fazem também um trabalho em cima de João Simão Lopes Neto interessante.
    Eventos existem, mas não são nada diferentes de muitos outros em outras cidades, nada para garantir o epiteto "cidade cultura".
    Cinema. Séries de tv via streaming estão substituindo os filmes. Até canais de tv a cabo estão adotando este modelo. A forma que os blockbusters são feitos mudou. Para tirar as pessoas de casa, os filmes incluem efeitos especiais em profusão, são filmados em 3D e/ou Imax. Faz com que a experiência do cinema seja compensadora, na tela pequena que a maioria tem em casa não é a mesma coisa. Um nicho não sustenta a oferta, pequenos cinemas não duram. Locadoras estão condenadas também.

  4. Isso tudo é poético de se dizer, mas do que adianta? Conforme o pessoal do cinema disse, as sessões tinham, quanto muito, 20 pessoas. Agora choram a perda do cinema, mas antes não o valorizavam.

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