Jerusalém – por Liliana de Oliveira
Jerusalém, 21 de janeiro de 2015. Enfim, chego à Terra Santa. Não fui a Jerusalém por crenças ou convicções religiosas, mas pela curiosidade de viajante que sou de conhecer uma das cidades mais antigas do mundo. Além disso, a cidade agrega muçulmanos, judeus e cristãos, o que permite que se experimente uma grande diversidade cultural. Confesso que tinha um receio de que chegando lá meu lado cristão pudesse aflorar. Digo isso porque hoje sou agnóstica e gosto de pensar que consegui me libertar da tradição familiar cristã da qual eu venho.
Chegando a Jerusalém passei pelos lugares por onde Jesus passou, sofreu e morreu. Fui até o Muro das Lamentações, que até mesmo na hora da prece separa homens e mulheres. Em todos os lugares muita prece, devoção, peregrinação e comércio. Sim, um grande comércio. Nada disso me sensibilizou. Muito pelo contrário. Fui tomada por uma sensação de estranhamento ao ver a exaltação das pessoas no Muro, no Santo Sepulcro, na Via Crucius e em lugares históricos importantes. Ao mesmo tempo uma alegria imensa por ver tantas culturas juntas. Alegria por ver que é possível pensar num mundo no qual possamos ter crenças diferentes e viver juntos.
Depois de visitar Jerusalém antiga, fui conhecer o Museu Yad Vashem, Museu do Holocausto situado no Monte Herzl na Nova Jerusalém. Herzl pode ser traduzido por recordação ou memória. Adorei o nome. Um monte que faz recordar aquilo que não podemos esquecer porque não podemos repetir. O museu provocou aquilo que nenhum templo religioso provocou. Confesso que a visita ao museu me arrebatou.
No museu encontramos vídeos, fotografias, objetos pessoais de todos aqueles judeus que não puderam contar suas histórias, pois suas vidas foram interrompidas. O museu faz com que possamos nos demorar sobre o extermínio dos judeus. O que me arrebatou não foi a história do extermínio, história conhecida entre nós. Mas reconhecer a humanidade daqueles que foram exterminados e a humanidade do exterminador. Sim, a humanidade daqueles que foram mortos e a humanidade de Adolf Hitler. Sim, Hitler era um homem e na condição de homem fez o que fez levando junto consigo outros tantos homens e exterminando seis milhões de judeus.
Pensar sobre estes sujeitos me fez refletir sobre a condição humana. Me fez pensar nas violências que podemos cometer em nome de algo maior. Me fez pensar na fragilidade com que podemos conduzir massas e fazer com que o extermínio se dê. Me fez pensar naquilo que somos capazes de fazer quando paramos de pensar. Me fez pensar especialmente naquilo que somos capazes de fazer contra outros seres humanos. E isso me provocou um arrebatamento. Sai do museu e chorei. Não chorei pelos judeus, chorei por todos nós. Chorei pela nossa miserável condição humana.
Dizem que a prostituição é a profissão mais antiga do mundo. Comércio do corpo. Há comércio de órgãos. Ainda hoje em dia, comércio de pessoas. Estranho seria não haver num lugar como este.
A perseguição aos judeus não começou no holocausto. Pogroms no antigo império russo. O anti-semitismo disseminado na Europa. O caso Dreyfus que dá origem à campanha para criação de um Estado.
Não foram os únicos a sofrer. Mais uns quatro milhões de pessoas morreram. Ciganos, homossexuais, maçons, eslavos.
Também não foi o primeiro caso. Genocídio armênio na primeira guerra. Ruanda, duas vezes, década de 60 e 90. Bosnia.
E o grande problema da condição humana, sem referência consciente nenhuma a Arendt, não são as elevadas expectativas frustadas de alguns em relação à humanidade. É a transitoriedade. Porque, como diz o Eclesiastes: "O que foi, isso é o que há de ser; e o que se fez, isso se fará; de modo que nada há de novo debaixo do sol."