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Santa Maria, um lugar bem longe de Nantes – por Atílio Alencar

Não foi ninguém que me contou; eu mesmo vi e ouvi. Segunda-feira passada, durante a cerimônia de lançamento do festival SESC Santa Maria Circo na SUCV, diante de um seleto grupo de autoridades, empresários e imprensa local (e também de alguns curiosos, como eu), o prefeito Cezar Schirmer afirmou com todas as letras que não só o seu governo, mas todas as futuras gestões na cidade precisam ser cobradas pela população para que destinem mais recursos para a cultura.

Não satisfeito em sublinhar o valor que atribui à cultura e à arte, nosso prefeito arrematou seu breve mas enfático discurso citando o exemplo da cidade francesa de Nantes, onde o investimento em cultura alcançaria a marca extraordinária dos 16% do orçamento municipal. Confesso que não me abalei a pesquisar a veracidade dos percentuais citados pelo nosso prefeito – que aliás, segundo consta, tem o hábito de cotejar obras e eventos realizados em Santa Maria com os de outros grandes centros mundiais, vide a inauguração de uma modesta pracinha que teria rendido comparativos com grandes parques públicos situados em Nova York.

Folclore à parte, não acho que o mais importante seja a precisão da referência. Neste caso, o que vale é a intenção manifesta de afirmar a cultura como prioridade na gestão atual. O que é louvável, aliás. O problema é que estamos longe, bem longe, de chegar perto de um panorama satisfatório de investimento na área. E não digo isso por achismo ou baseado em impressões pontuais: segundo estudo realizado pelo Observatório da Cultura de Porto Alegre,a partir de dados cedidos pelo Tesouro Nacional, Santa Maria ocupa o penúltimo lugar entre os municípios gaúchos com mais de 100 mil habitantes no que se refere aos gastos públicos com cultura. (*)

Somado a esta melancólica posição no tal ranking, temos o conjunto habitual de precariedades que já são de conhecimento geral: atrasos nas obras de recuperação de equipamentos culturais (Bombril, Casa de Cultura), descaso com espaços públicos destinados ao convívio criativo (Concha Acústica e Parque Itaimbé como um todo), medidas restritivas para a liberação do uso das praças (como a insólita tentativa de emplacar a cobrança de uma taxa para o serviço, ano passado) e a legendária saga que antecede a votação do Plano Municipal de Cultura – o que acaba implicando, também, na inexistência de um Fundo Municipal de Cultura, ferramenta que seria de vital importância para pequenas produções de caráter independente.

Assim, mesmo sem duvidar que Schirmer seja pessoalmente interessado em arte e cultura, fica bastante difícil visualizar onde e como este apreço se materializa em termos de políticas públicas para a cultura em Santa Maria. Importante frisar que a Secretaria de Cultura, mesmo operando com parcos recursos, consegue eventualmente despertar a simpatia de artistas e produtores, pelo esmero com que medeia a atenção do Executivo às pequenas iniciativas. Mas isso é pouco, convenhamos, para uma cidade que pretende estar inserida no rol dos polos culturais do estado e do país (sem levar em conta a longínqua França e sua Nantes tão generosa para com a cultura).

Dito isso, acho que cabe também o questionamento de um hábito que me intriga: será que a cerimônia de lançamento de um festival internacional de circo, que será aberto ao público (graças ao investimento financeiro do SESC, pelo que entendi), não faria mais sentido se realizada justamente com menos pompa e maior participação popular? Não sei se é rabugice minha, mas cada vez que vou a uma destas solenidades que anunciam eventos de arte, e o que menos vejo é gente interessada em arte, sinto que alguma coisa fundamental está sendo esquecida.

Mas justiça seja feita: a favor do cerimonial de segunda, preciso dizer que os quitutes estavam uma delícia.

(*) Dados referentes ao período entre 2002-2011, em que as gestões do PT e do PMDB governaram Santa Maria.

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3 Comentários

  1. Tá na hora dele acordar e olhar para o mundo em que vive. Santa Maria tá suja, esburacada, com trânsito caótico, calçadas as piores do mundo e ele não vê na disso.
    Só olha para o próprio umbigo.

  2. Mas será que existe alguém capaz de acreditar numa palavra, numa frase, num discurso, numa promessa do Cézar?Eu duvido que ele esteja muito preocupado com culturas. Talvez a dele …É de chorá!

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