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Condição de Mulher – por Liliana de Oliveira

Quando criança estudava em um colégio de irmãs. Ali tive aulas sobre educação sexual e educação religiosa. Ali aprendi que meninas deveriam se preservar, deveriam se cuidar, deveriam se comportar de um determinado modo. Ali aprendi a diferença entre ser menino e menina. Nessa mesma escola um dia um colega me passou a mão. Eu devia ter uns onze anos de idade e essa foi a primeira vez que fui desrespeitada na minha condição de mulher. Fui desrespeitada pelas irmãs que com seus discursos travestidos de amor constituíam sujeitos machistas. Fui desrespeitada pelo colega que sendo constituído nesse lugar, se permitiu tocar no intocável.

Em uma tarde no centro da cidade de Santa Maria quando me dirigia as aulas de inglês, um homem passou por mim e me passou a mão nos seios. Eu devia ter uns treze anos de idade. Segunda vez que fui desrespeitada na minha condição de mulher. Confesso que dessa vez foi mais violento por não se tratar de uma brincadeira de mau gosto entre colegas de escola. Mas se tratava de homem bem mais velho, um desconhecido que atrevia-se a passar a mão no meu corpo como se a sua condição de homem fosse garantia suficiente para tal ato.

Mais tarde na faculdade muitas vezes ouvia que minhas notas eram boas porque eu era mulher. Insinuavam que eu não tinha boas notas por ser inteligente ou dedicada, mas porque o professor sendo homem acabava privilegiando ou aprovando as mulheres. Terceira vez desrespeitada na minha condição de mulher.

Mais tarde no meu trabalho escuto comentários semelhantes. Os alunos e a chefia devem gostar de mim não porque sou uma profissional competente, mas porque sou mulher. Insinuação que desfaz minha competência e me agride. Quarta vez desrespeitada na minha condição de mulher.

Há mais de um ano não consigo sair para caminhar sem ser assediada por um homem bem mais velho que me segue até em casa. Já anotei a placa do carro. Já o avisei que vou denunciá-lo a polícia. Nada o detém. Talvez se sinta protegido dentro do seu carro e de sua condição de homem. Quinta vez desrespeitada na minha condição de mulher.

Ainda assim me sinto privilegiada, pois nunca sofri nenhum tipo de assédio sexual, abuso sexual ou violência doméstica. O simples fato de sermos mulheres faz com que cotidianamente tenhamos que conviver com as cantadas baratas, com os assobios, com comentários de mau gosto, com insinuações, com olhares, com o assédio constante. Convivemos com discursos que criminalizam as mulheres e que as responsabilizam por engravidar, por serem estupradas, por serem assediadas. Convivemos com discursos que pretendem dizer o que devemos fazer dos nossos corpos e da nossa sexualidade. Mais triste ainda quando esses discursos são proferidos por mulheres que reforçam o preconceito e o machismo presente em nossa cultura.

Me sinto agredida quase todo dia, pois tudo aquilo que agride uma mulher me agride. Me agride na minha condição de mulher.

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