Coluna

Curtis e Edgar – por Bianca Zasso

bianca aQuando um garoto de 15 anos resolve fazer um curta-metragem sobre um conto famoso, muitos pensam que é apenas uma aventura. Só que quando o garoto é Curtis Harrington, a coisa muda de figura. O americano encarou o desafio de dirigir um filme quando ainda estava na escola e sua escolha para a base do roteiro não poderia ser mais desafiadora: o conto A queda da casa de Usher, do escritor Edgar Allan Poe, um dos maiores nomes da literatura fantástica.

Era década de 40 e o adolescente Curtis, mesmo descobrindo o mundo, já mostrava que tinha uma forma única de contar histórias, que foi evoluindo nos anos seguintes, quando ele seguiu produzindo curtas-metragens experimentais e com forte apelo ao universo do horror. O que se seguiu foi a chegada de um novo nome talentoso para o mundo do cinema, que produziu também para a TV durante as décadas de 60 e 70.

Já com 70 anos bem vividos nas costas, Curtis Harrington resolveu voltar onde tudo começou, como quando visitamos a casa da infância ao chegarmos próximos à velhice. Usher, seu último trabalho, lançado no ano 2000, retorna a trama sobre o jovem escritor Truman Jones que passa uma temporada na casa de um poeta excêntrico.

Usher é, ao mesmo tempo, um retorno às origens e um passo adiante de Harrington. Traz o conto de terror de Poe para a atualidade sem deixar de lado o visual kitsch, presente na mansão e também no figurino de seus habitantes, alguns deles interpretados por seguidores da seita de Satã. Sim, Harrington nunca escondeu sua atração pelo oculto que, mesclada a sua ousadia cênica, sempre resultou em boas produções, como Fábula Macabra, com a presença marcante de Shelley Winters.

bianca bFora os adoradores de Lúcifer, a grande maravilha do elenco é mesmo o diretor, num papel duplo, dando vida a Roderick e Madeleine Usher, o casal de irmãos de hábitos sinistros que vão colocar em jogo a sanidade de Truman. Roderick, em especial, é mais uma homenagem de Harrington a Poe, já que a caracterização do dono da casa é idêntica à imagem do autor.

Usher, tanto por sua curta duração quanto pela construção da trama, mostra que, mesmo tendo entrado para o hall de importantes diretores, Harrington nunca esqueceu o chão onde deu os primeiros passos, na experimentação, na liberdade de narrar um acontecimento sem deixar de lado a questão sensorial. Muito do medo de seus filmes mora na atmosfera, por mais que haja a presença de um ou outro monstro “de verdade”.

Usher foi lançado na coletânea The Curtis Harrington Short Film Collection, ao lado de outros trabalhos do diretor, proporcionando uma viagem pelo seu processo criativo e tornando as sessões de seus filmes do auge da carreira uma experiência ainda mais interessante. É uma delícia para o espectador perceber detalhes que, décadas depois, seriam a base de seus mais prestigiados trabalhos.

Usher marcou a despedida das telas de Curtis Harrington, que viria a falecer em 2007. Se ainda estivesse entre nós, estaria completando 90 anos e, quem sabe, ainda produzindo suas fantasias de horror. Seria um senhor digno de respeito, que não deixou que as rugas acalmassem sua intensidade surgida lá na juventude, quando ele só tinha 15 anos, uma câmera em uma mão e um livro de Poe na outra.

Usher

Ano: 2000

Direção: Curtis Harrington

Disponível em DVD e Blu-Ray na caixa The Curtis Harrington Short Film Collection (Importada)

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