HistóriaMemóriaMundo

MEMÓRIA. Os cubanos e seu compromisso com a Revolução comandada por Fidel – direto de Havana

fidel-1Por GUSTAVO DHEIN (texto e fotos), de Havana, Cuba, Especial para o Site

Saí de casa pouco depois das 9h da manhã de ontem. Tardei um pouco porque quis ver a transmissão dos 21 disparos de canhão que marcaram oficialmente o início das honras a Fidel. A casa onde resido dista uns cinco quilômetros dali. Ainda assim, com o natural “delay”, foi possível ouvir o barulho de cada um dos disparos.

Cheguei à Plaza de la Revolución por volta das 10h. A fila iniciava perto do cruzamento da rua Rosa com a Avenida Independência, uma das principais de Havana. Em uma hora, andei pouco mais de 70 metros. Resolvi tentar a sorte mais tarde. Quando voltei, às 13h, a fila estava maior. Nova investida às 18h. Desta feita pelo “Paseo”, outra opção para acessar o Memorial José Martí. Ainda mais gente, mas fiquei.

Tardei 3h24, exatamente, para conseguir chegar ao espaço onde uma guarda de honra vigia itens dispostos em homenagem ao comandante. Na fila, com direito a bastante calor humano, todo o tipo de gente, de diversas gerações. Alguns estrangeiros também. Um grupo de estudantes cubanos trazia cartazes com fotos de Fidel, mas eles não foram permitidos ontem.

O momento mais significativo, no entanto, me parece não ser a passagem por dentro do Memorial. Mas a opção de assinar o livro de condolências, em uma sala que antecede a chegada a ele. Há um constante lembrete de que o registro não serve prioritariamente para contabilizar os viventes, já que a assinatura é totalmente opcional.

Firmá-lo significa estabelecer simbolicamente um compromisso com o conceito de Revolução defendido por Fidel Castro, tornado público por ele no 1° de maio de 2000, na mesma Plaza de la Revolución: “Revolución es sentido del momento histórico; es cambiar todo lo que debe ser cambiado; es igualdad y libertad plenas; es ser tratado y tratar a los demás como seres humanos; es emanciparnos por nosotros mismos y con nuestros propios esfuerzos; es desafiar poderosas fuerzas dominantes dentro y fuera del ámbito social y nacional; es defender valores en los que se cree al precio de cualquier sacrificio; es modestia, desinterés, altruismo, solidaridad y heroísmo; es luchar con audacia, inteligencia y realismo; es no mentir jamás ni violar principios éticos; es convicción profunda de que no existe fuerza en el mundo capaz de aplastar la fuerza de la verdad y las ideas. Revolución es unidad, es independencia, es luchar por nuestros sueños de justicia para Cuba y para el mundo, que es la base de nuestro patriotismo, nuestro socialismo y nuestro internacionalismo.”

Mais de três horas para chegar ao espaço onde uma guarda de honra vigia itens dispostos em homenagem ao comandante Fidel
Mais de três horas para chegar ao espaço onde uma guarda de honra vigia itens dispostos em homenagem ao comandante Fidel

Já que não são todos os cubanos que podem acessar Havana, há livros como esses espalhados por mais de mil pontos, em toda a Ilha. No meu bairro, por exemplo, um está disponível no Comitê de Defesa da Revolução (CDR), na esquina de casa. Foi lá que registrei o meu nome. Quando cheguei em casa, à noite, Ana e Enso, 70 e 79 anos, respectivamente, meus “pais cubanos”, queriam saber de minha jornada. Ela me perguntou também sobre a cobertura dos jornais brasileiros.

Confessei que não havia lido ontem, mas que no sábado e no domingo ela foi significativa, ainda que Fidel fosse constantemente chamado de ditador. Ela me disse que entendia. Que isso era comum em outros países. “Fidel não era um ditador. Como pode ter sido um ditador se nós sempre quisemos que estivesse onde estava?”, argumentou. E repetiu uma frase que ela adora, de Che Guevara: ““al imperialismo no se le puede creer ni un tantico así,”.

Enso, por sua parte, estava eufórico. Entre 1959 e 1962 integrou a guarda particular de Fidel. Sempre conta causos com (e sobre) o comandante, embora não queira dar um “depoimento oficial”. Alega emocionar-se demais. A alegria de ontem deveu-se ao fato de ele ter integrado a guarda de honra, por alguns minutos, no Memorial José Martí.

Ainda no domingo, depois de enviar o primeiro texto a Claudemir, Kari, uma de nossas vizinhas, estava em casa. Trouxe consigo o poema que escreveu em homenagem a Fidel (depois trato de enviá-lo). O título é “Dor profunda”. A meu ver – e apesar da aparente obviedade – descreve perfeitamente o sentimento da maioria dos cubanos no momento.

Hoje, às 19h (22h no Brasil), a população deve reunir-se na Plaza da Revolución para um último ato antes da partida da caravana que levará as cinzas de Fidel até Santiago. O percurso será exatamente o inverso ao que o comandante percorreu em 1959, quando da vitória dos barbudos da Sierra Maestra. Os jornais impressos daqui obviamente – assim como continua a ser na TV – dedicam suas edições integramente a Fidel.

O brasileiro Emir Sader assinou um dos artigos principais. Compartilhei algumas imagens das capas de ontem com Claudemir (na montagem abaixo). As manifestações de Lula e Dilma tiveram destaque. Os meios de comunicação anunciam gradualmente quais as autoridades e chefes de Estado já confirmaram presença hoje, no adeus a Fidel. Fiquei sabendo que Serra e Freire virão para representar o Brasil, verdade? Estou surpreso. E envergonhado.

fidel-3

Artigos relacionados

ATENÇÃO


1) Sua opinião é importante. Opine! Mas, atenção: respeite as opiniões dos outros, quaisquer que sejam.

2) Fique no tema proposto pelo post, e argumente em torno dele.

3) Ofensas são terminantemente proibidas. Inclusive em relação aos autores do texto comentado, o que inclui o editor.

4) Não se utilize de letras maiúsculas (CAIXA ALTA). No mundo virtual, isso é grito. E grito não é argumento. Nunca.

5) Não esqueça: você tem responsabilidade legal pelo que escrever. Mesmo anônimo (o que o editor aceita), seu IP é identificado. E, portanto, uma ordem JUDICIAL pode obrigar o editor a divulgá-lo. Assim, comentários considerados inadequados serão vetados.


OBSERVAÇÃO FINAL:


A CP & S Comunicações Ltda é a proprietária do site. É uma empresa privada. Não é, portanto, concessão pública e, assim, tem direito legal e absoluto para aceitar ou rejeitar comentários.

5 Comentários

  1. Desculpe-me, o Brando, não tinha visto o vídeo sobre a barba que você postou em primeira mão.

    Para ver como são as coisas. A barba, que muitos acham que significa um movimento ideológico, na verdade representa o fracasso continuado dele.

    Será que os vermelhinhos barbudinhos que ainda usam a barba até hoje se dão conta disso? Vão permanecer usando a barba até que a ideologia funcione em algum lugar, nem que demore mais 200 anos? k k k k ..

  2. Coloquei o vídeo num post destes, “seu” Jorge, um dos poucos nos quais Fidel fala em inglês.
    Alguns acham que chamando um abacaxi de pêssego repetidas vezes. A “revolução socialista” de Cuba tem um “rei”, uma “nobreza” e os capitalistas são substituidos pela burocracia do partido.
    Sem falar nas jineteras, no mercado negro, etc.

  3. “Minha barba significa muitas coisas para o meu país. Quando tivermos cumprido nossa promessa de um bom governo, farei a barba”, disse em entrevista à emissora americana CBS, poucos dias após o triunfo da revolução.

    Quem disse? Fidel Castro.

    E morreu barbudo. Pelo menos foi sincero nesse ponto.

    Vendo o link, O Brando, parece que só os hotéis de Cuba são a pujante Cuba que Fidel queria.

    Mas por tão pouco não poderia cortar a barba, quem sabe uma aparadinha?

    Aliás, será que o barbudo ganhava alguma comissão desses hotéis? A corrupção crassa nas ditaduras. Saberemos depois desses detalhes quando implodir aquela monarquia dos vermelhinhos.

  4. Primeiro algo importante. O autor é aluno do doutorado em comunicação social da UFSM estudando o papel das telenovelas brasileiras em Cuba.
    O resto é espelho do que os militantes de esquerda pensam. Ego agigantado, zero humildade, zelotismo, dissociação da realidade, autodefinição pela negação dos outros, messianismo, discurso do povo escolhido.

    No mais, vamos ver se funciona,

    https://www.tripadvisor.com/Hotels-g147270-Cuba-Hotels.html

  5. A diferença do mundo de fantasia que está instalado num parque de diversões na Flórida, do que ainda persiste na cabeça de alguns cubanos, é só um pedaço de oceano.

    Aliás, um cubano que tomou coragem e escreveu apenas isto num muro: “Se foi”, foi preso.

    Precisamos trazer essa polícia para cá para prender os pichadores que enfeiam nossa cidade pelas madrugadas, que gente eficiente!!

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Botão Voltar ao topo