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No táxi (Parte I) – por Alice Elaine Teixeira de Oliveira

aliceElla coloca suas mãos nas grades do portão ao mesmo tempo em que seu táxi encosta na calçada. Ultrapassa os limites de seu terreno, e lá, do lado de fora, olha para a fachada de sua casa com um sentimento que lhe aperta o peito. Já não lembrava mais deste lugar, ele mudou durante todos estes anos em que ficou no seu interior, em ostracismo quase que absoluto. As árvores estavam altas, a Hera havia tomado completamente os 3 metros de muro, o jardim é tão exuberante que não há mais como ver grande parte da entrada da casa. Nota que vive no que ela permitiu transformar-se num elegante e chique mausoléu.

A porta do táxi se abre e ela se acomoda em seu interior. Abrindo sua pequena e elegante bolsa retira um cartão e o entrega ao motorista. O pedaço de papel contém o endereço: Rua da Praça, nº 1976.

O motorista lê o cartão de papel fino, uma impressão cara e assente com a cabeça, num sinal de que sabe onde ir.  O homem, o motorista, era um pouco mais velho que a ocupante do banco traseiro, porém não era um funcionário antigo da Companhia de Táxi. Mas a Srta. Josephson sempre utilizou os serviços da empresa chamada e assim que seu número de telefone foi identificado, a secretária procurou um taxista disponível no momento e forneceu as devidas instruções:  1 – não puxar papo com a cliente; 2 – ir onde for solicitado sem questionar; e 3 – não agradecer demais pela gorjeta.

Porém, diante da pessoa surpreendente que tomou seu carro e do reflexo que insistia em ficar gravado no retrovisor, esqueceu-se de sua primeira instrução.

Pôs-se a falar e elogiou a Srta por sua elegância e incomum beleza. Nunca havia visto pessoa tão linda em todos os anos de trabalho como taxista. Confessou que não teria falado nada se pudesse ter se contido, mas seus sentimentos o estava corroendo em seu íntimo. Era impossível segurar-se e precisava fazer com que a moça soubesse a impressão que causou com sua tão bela figura.

Logo em seguida a tantas impertinências calou-se e aguardou o resultado de sua indiscrição, já prevendo o pior, afinal, contaram-lhe o que poderia acontecer caso não seguisse as regras, e até escolheram-no para tal corrida, entre outros no pátio, por já ser um homem maduro e sensato para sua idade.

Ella não respondeu, mas no fundo gostou do elogio. Haviam se passado muito anos nos quais não ouvia nenhum comentário sobre sua aparência, e isso fez muito bem para a alma feminina. Sentiu-se viva e renovou seu frescor, deixou, até mesmo, que um sorriso velado e discreto recompensasse o pobre homem apavorado.

Algumas ruas e quadras depois, já dentro do trânsito intenso da cidade, novamente o motorista comete outro delito, o segundo porém no intuito de ajudar, e comenta:

– Espero que a Srta saiba que o endereço no qual me entregou já não é mais um lugar tão seguro quanto há alguns anos. Existem, por lá, muitos batedores de bolsa e traficantes. A região do porto tornou-se um lugar abandonado, território de bandidos. Nem a polícia faz rondas por lá, evitaram trabalhar nesta zona após acontecer uma série de assassinatos e ameaça aos membros de seus departamentos.

Depois de ouvir esta informação, Ella começa a pensar em seu advogado. Era muito provável que o Sr. Parker também soubesse desta informação, então por que marcou seu encontro no antigo bar em frente ao depósito da sua família? Por que não sugeriu outro lugar mais seguro e por que não falou com ela pessoalmente? Algo estava errado. Algo muito estranho estava acontecendo. E diante desta novidade e destas questões, decide voltar para a segurança de seu lar, e comunica sua decisão ao chofer.

O homem ao volante, tentando encontrar um retorno para voltar ao ponto de origem, respira aliviado. Estava preocupado e com medo de levar tão linda mulher até o endereço do cartão. Em sua mente raciocinava: e se perdesse o carro para algum gatuno oportunista, o que faria? Seu salário mal cobria suas despesas necessárias, e o pior, como iria continuar trabalhando? O carro era próprio dele, a frota da companhia de táxi já estava completa quando ele ofereceu os seus serviços, trabalharia para eles com seu carro, em troca de uma carteira assinada e plano de saúde. Porém, este acordo era muito recente e não havia feito ou sobrado dinheiro, ainda, para contratar um bom seguro contra roubo; ele havia feito um que cobria apenas acidentes.

Continuando a pensar enquanto dirigia, questionou-se: mas, o que faria se lesse nas páginas policiais da manhã seguinte: ‘corpo despido de jovem mulher, aparentando ter cerca de 30 anos, foi encontrado por prostitutas, na zona portuária ao anoitecer. Não pôde ser identificada, pois não possuía bolsa ou documentos, junto ao corpo, tampouco a polícia encontrou alguma testemunhas do brutal crime.’? Imaginou a pobre numa gaveta do necrotério municipal, a espera de um reconhecimento, sem isso seria enterrada como indigente.

Enquanto o homem pensava nela, a mulher pensava em seu advogado: o estaria acontecendo? Quais eram os motivos deste dia estar sendo tão pitoresco? Que dia era hoje? Onde estará o número particular do Sr. Parker dentro desta bolsa? Achou! Pediu para o motorista parar em um lugar ali por perto, o Caffe Rouge. Ficava apenas a uns dois quarteirões de onde estavam. Ella conhecia o lugar, conhecia os seus donos e certamente lhe emprestariam um telefone, pois ela mesma não usava um aparelho móvel; sempre achou que, muito mais que um conforto, o celular era um inconveniente.

Quando o carro para, ela preenche um cheque para pagar a corrida do táxi. Alcança a folha para o homem que pega sem tirar os olhos dos olhos dela, ainda pensando na tragédia que poderia ter acontecido naquela manhã. A jovem fica um pouco constrangida com aquele olhar tão penetrante e significativo, mas não transparece, retoma a frieza que tem dispensado há muito com todas as pessoas, abre a porta do carro e sai. Porém, o seu perfume, que inundara o ambiente de flores e frescor, fica como uma presença que jamais vai desembarcar daquele Táxi, nunca deixará a mente daquele homem.

Quando passa pela porta do Caffe e desaparece da vista do motorista é que ele decide olhar o seu pagamento.

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