O mundo vai lembrar o Oscar 2017 pela gafe da troca de envelopes na categoria de melhor filme. Mas vale ter na memória também o fato da categoria de melhor longa de animação ter sido, de longe, a melhor da premiação. Isto porque todos os concorrentes mereciam a estatueta e traziam qualidade tanto em seus roteiros como na parte técnica. Zootopia, o vencedor, foi produzido pela Disney e teve boa bilheteria. Porém, vamos voltar nossos olhares para uma produção francesa que não arrebatou multidões, mas quem viu jamais irá esquecer.
Minha vida de abobrinha, dirigido por Claude Barras, é simples. Pode parecer um adjetivo fraco para definir um filme. Não é. A simplicidade é difícil de ser alcançada, ainda mais num universo tão cheio de possibilidades como é o cinema. O diretor teve como aliado o roteiro preciso escrito por Céline Sciamma, que já havia levado para as telas uma história complexa em Tomboy. Agora, sua ternura para com os personagens se mostra ainda mais intensa ao apresentar Icare, o protagonista. Aliás, é o único momento em que ele é chamado assim. Ele só atende por Abobrinha.
A trama já deixa claro seu pé na realidade em uma sequência de abertura cheia de simbolismos. Com quase nenhum diálogo, o público é conquistado por um garoto de nove anos, cabelo azul e que prefere o apelido leguminoso ao nome que consta na certidão de nascimento. Como qualquer outro da sua idade, ele sonha. Mas isso não impede que ele fique sozinho no mundo e sua nova casa seja um orfanato.
Realizado em stop-motion, Minha vida de Abobrinha não se foca em recriar um cenário realista, mas em dar humanidade aos personagens. Se suas formas lembram brinquedos de massinha, não é motivo para não se acreditar num coadjuvante como Jujube, uma garota cuja mãe foi deportada e que, a cada carro que se aproxima do orfanato, corre na esperança de voltar para casa.
Em pouco mais de uma hora, essa e outras personagens são desenvolvidas sem um pingo de pieguice ou piedade. Afinal, não há porque fazer julgamentos e nisso o roteiro de Sciamma segue a regra primordial: o objetivo é contar a história de Abobrinha e não discorrer sobre os traumas de ter crescido ao lado de uma mãe alcoólatra. Há lembranças tristes, mas antes de tudo há a esperança que só a juventude parece ter, pura e sem sombras desmotivadoras.
Minha vida de abobrinha poderia ter sido realizado com atores, mas o risco de perder seu foco seria grande. Crianças em situação de risco já são, por si só, um convite à emoção e a simplicidade, grande trunfo do filme, iria se perder em nome de uma direção de arte muito elaborada ou então na preocupação de uma fotografia mais verossimilhante.
Abobrinha é feito de massa de modelar e nós, adultos, sabemos que há toda uma equipe para fazê-lo andar, piscar e falar. Mas ao nos depararmos com seus olhos enormes na tela grande, esquecemos todas as técnicas. São olhos de menino, descobrindo o mundo e já carregando uma bagagem pesada. Deve ter sido um truque, mas prefiro lembrar do olhar brilhante de Abobrinha como algo bem real, assim como os dos meninos de carne, osso, alma e sentimento.
Minha vida de Abobrinha (Ma vie de Courgette)
Ano: 2016
Direção: Claude Barras
Em cartaz nos cinemas
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