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Mortes Proibidas – por Marcelo Arigony

Riscos evitáveis e sinalização na BR 158. 24 horas após o desastre!

É sabido e consabido que vivemos na sociedade do risco. Fui buscar o significado de risco: possibilidade de um acontecimento futuro e incerto, que possa impedir o sucesso; perigo!

Ulrich Beck esmiúça a cultura do risco em sua obra de quatro volumes, principiada pelo livro Risikogesellschaft (1986), observando que uma cultura de risco impõe práticas de autoproteção.

Roxin e Zaffaroni, noutra senda, nos brindam com teorias do risco em Direito Penal, culminando com a imputação objetiva, pela qual só devem ser sancionados penalmente os riscos proibidos.

Há cerca de cinco meses tivemos três mortes estúpidas em um grave acidente de trânsito, envolvendo um veículo e um caminhão carregado de madeira, ao pé de um viaduto que está sendo construído na BR158.

Após o fato, foi reforçada a sinalização da via pela pintura e instalação de tachões para divisória de pista e canalização do fluxo de veículos. As obras nessa via já duram quase dez arriscados anos.

Há quase 11 anos tivemos 242 mortes em uma boate na nossa cidade, em decorrência de riscos desmedidos que foram criados por condutas comissivas e omissivas. A investigação criminal apontou as diversas responsabilidades dos criadores dos riscos.

Após o fato, houve o endurecimento da legislação que regula a concessão de alvarás e a respectiva fiscalização, para boates e diversos outros setores.

Hoje pela manhã (10/10/2023) tivemos um acidente grave com morte na BR158, onde havia obras na rodovia e um caminhão carregado de soja não conseguiu brecar a tempo, atingindo três veículos entre os que estavam parados aguardando a liberação da passagem.

Algo me diz que amanhã haverá mudanças na sinalização.

Os riscos referidos acima – que causaram as mortes – são exatamente os riscos proibidos de Zaffaroni.

Viver é arriscado; criar ou incrementar riscos proibidos não.

Culpa de quem?

(*) Marcelo Mendes Arigony é titular da Delegacia de Polícia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DPHPP) em Santa Maria, professor de Direito Penal na Ulbra/SM e Doutor em Administração pela UFSM. Ele escreve no site às quartas-feiras.

Observação do editor: a foto que ilustra esta crônica, do local do acidente na BR 158, e que teve uma morte, é uma reprodução obtida de fonte confiável na internet.

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11 Comentários

  1. Quais os riscos proibidos? Quem decide o que são? É a la carte, de acordo com o caso e a cara do sujeito, ou vai ter uma lista? Dolo eventual virou uma enjambração juridica. Reforma do CP, que está na gaveta, traz a ‘culpa gravissima’. Aparentemente já esta no CTB.

  2. Sinalização? O caminhão estava com carga no peso admitido? A vistoria mostraria que os freios estavam em bom estado? O motorista estava em boas condições de saude? Fez uso de substancias? Estava descansado?

  3. ‘A investigação criminal apontou as diversas responsabilidades dos criadores dos riscos.’ Não existe suspeição (ate onde eu sei) de autoridade policial. Ação criminal é do MP. Dois ou tres dias depois do fato em entrevista uma autoridade policial foi perguntada se poderia haver impeachment do prefeito. Obviamente poderia. Mas não era o melhor a ser dito. Motivo? Abriu espaço para politização do assunto. Uma autoridade policial perdeu uma parente na tragedia. Não era algo a ser alardeado. Abre espaço para o discurso ‘vingança’. Bastante obvio entretando, a opinião publica é quase completamente irrelevante no caso. Judiciario fixou-se na cadeia de eventos que evitaria diretamente o ocorrido. Até o sujeito que aparentemente só comprou os fogos se lascou. Justiça é uma palavra grande. Em todo caso é o que a casa tem para oferecer. Vida que segue.

  4. ‘[…] decorrência de riscos desmedidos que foram criados por condutas comissivas e omissivas.’ Não havia risco perceptivel. Se os bombeiros estiveram la e em algum momento existiu o alvara alguém diria que existia risco? Questão meramente burocratica, interpretação de normas. MP esteve envolvido e só se preocupou com o ruido. De novo burocracia. Alguem olhou a porta do banheiro ao lado da porta de saida? Banheiro que era um brete com entrada melhor sinalizada que a propria saida? As normas mencionavam algo a respeito? Alas, há quem dissesse que ‘Santa Maria tinha a melhor legislação de prevenção a incendios do Brasil’.

  5. Alem de esperar os problemas baterem na mesa (e só viram problemas de fato quando isto acontece, seja por reclamações diretas, seja pela midia) existe o problema da burocracia desmedida e dos burocratas. Estes não querem sair do ar condicionado. Informações ‘viajam’ mal nos diversos niveis burocraticos. É distorcida, some, estaciona. Resumindo, enquanto não morrer meia duzia está ‘tudo certo’.

  6. Leva a outra caracteristica cultural. Primeiro mandato de Indigesto Nãosoubom. Comentado aqui no site para não ficar atras da mesa esperando os problemas aparecerem. O general visita o front. A caminhada ‘gemba’ dos japoneses, da gestão lean. Até aconteceu, mas depois virou instrumento de marketing.

  7. Existe o fator economico. Catado no site da Federal do Ceará: ‘Um sistema crítico é um sistema onde a falha pode levar a perdas econômicas significativas, danos físicos ou ameaças à vida humana’. Onibus espacial tinha 5 computadores a bordo. ‘Votavam’ e o ‘discordante’ era descartado. Hardware produzido por duas ou tres empresas diferentes. Software escrito por duas ou tres empresas diferentes. Aviões de carreira tem dois ou tres computadores. Dois explodiram por motivos diferentes. Riscos assumidos. Aplicar a mesma filosofia em todo lugar seria proibitivamente caro.

  8. Tudo é previsivel e pode ser evitado. Não existe ‘risco’. A diferença entre responsavel e criminoso não existe. Criticam o tribunal das redes sociais, mas fazem o mesmo e há mais tempo.

  9. Ulrich Beck, não conhecia, tive que consultar o gugle, era alemão. Importante! Ele era alemão! Trabalho dele é sobre (morreu mas deixou escritos) incontrolabilidade, ignorancia e incerteza. Culturalmente no Brasil isto não existe. Principalmente para jornalistas e outros que passam a vida no ar condicionao esfregando a barriga na mesa.

  10. Segundo problema e para este basta consultar um(a) aluno(a) do primeiro semestre do curso juridico: direito é que nem bola de porco!

  11. É um problema grave nos debates da aldeia. Quem só tem um martelo na mão acha que todo problema é prego. Ocorre que os microfones e espaços textuais são ocupados majoritariamente pelo pessoal do juridico. Faltam medicos (não só psquiatras), enfermeiros(as) (não só socialistas de iPhone), veterinarios, agronomos, fisicos, matematicos, etc. Obvio que seria mais facil se existisse uma universidade na urb.

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