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O motivo – por Pylla Kroth

Por que será que toda família tem o chamado “Ovelha Negra”? Isso é fato, a pessoa discriminada por ser diferente das outras, fora dos padrões de comportamento e dos valores impostos pela família. Na maioria das vezes, essa pessoa vem acompanhada de vários adjetivos, mas um é quase certeiro. Dependente de vícios. E em reuniões familiares costumam amenizar esses adjetivos. Um deles é o “Borracho”; que pra não ficar pesada a expressão “alcoólatra” costumam dizer que o cara “tem um probleminha com a bebida.”

E assim conheci um vivente desses. A mulher, já cansada, resolveu apelar e pediu ajuda para todos, pois teriam que resolver isso com ela. Já estavam casados havia mais de 35 anos e isso estava insuportável, segundo ela. Alguns acharam que isso era problema dela, pois quando solteiro ele não tinha esse vício, alegaram que isso acontecera depois do enlace matrimonial; eis o mistério.

Mas aquele apelo de sua mulher não poderia passar despercebido pelos membros da família, “afinal pra que serve a família?”, como justificara ela no encontro. Foi aí que começaram as tratativas de união, num esforço conjunto pra tentar a livrar, ou ele, deste probleminha, agora problemão. Pois ultimamente ele estaria meio que “variando” e batendo nas portas dos vizinhos ao voltar de suas boemias e saidinhas noturnas pra encontro com os colegas de copo!

Foi ai que os primos começaram opinar. Primeira sugestão foi levá-lo até um psicólogo pra tentar desvendar alguma coisa cientificamente não sabida. E assim foi; o tio topou. Depois de um mês freqüentando o psicólogo veio uma surpresa frustrante, muito bom de papo e de conversa o sobrinho surpreende o tio no bar já passado do horário habitual, e pasmem: com quem? Com o psicólogo! Este, naquela altura da noite, mais pra lá do balcão que o tio.

Que desilusão, mas nem tudo esta perdido. Partem pra uma internação numa Clínica de reabilitação para dependentes químicos, pois o caso era grave mesmo. E como convencê-lo? Tudo estrategicamente pensado em conjunto, combinaram com a clínica que iriam ter de ludibriá-lo, pois assim no mais ele se recusaria; dizia ele que bebia porque gostava mesmo e tinha lá suas razões. Resolveram, então, uma vez que atrás da clínica passava um rio, convidar o tio pra uma grande pescaria.

E isso deu um trabalhão… pescador nato, gostou da idéia e começaram os preparativos pra dita “Pescaria”. Rancho de alimentos pra três dias na beira do rio, linhas , redes tudo revisado com toda atenção, até o reboque com o barco ele não abriu mão. Tudo nos mínimos detalhes. Pensou até desistir em determinado momento, mas foi quando o primo falou pra ele que lá perto tinha um cabaré dos bons com lindas mulheres a disposição, baile de três dias seguidos, etc, e então voltou atrás e concordou.

É chegada a hora da partida. Tudo “nos trinks”. Chegando no local ele até estranhou que os parentes resolveram antes de desmontar os equipamentos, fazer o acampamento, dar uma passadinha no cabaré pra dar uma espiadinha no plantel do local. Mas aprovou de imediato. Ótimo, pois confessou que já estava de garganta e olhos secos. Isso seria uma bom começo. Equipe toda preparada pra receber o tio. Estranhou um pouco o local de chegada e comentou:“nossa que imenso cabaré, cheio de quartos, dois andares, só não tem a luzinha vermelha!” ao que o primo respondeu:  “A coisa é moderna mesmo tio, não se usam mais as luzes vermelhas pra não chamar atenção da comunidade!”, ao que ele concordou todo eufórico.

A dita clínica possuía uma UD ( Unidade de desintoxicação) que ficava no segundo piso no fundo do corredor, onde os internos ficavam oito dias isolados, com tratamento com vários coquetéis pra eliminação do mal, e também para evitar algum “delirium tremens” (quadro patológico que surge devido à bstinência após um longo tempo de consumo excessivo de álcool etílico; delírio alcoólico). Subiram as escadas e logo disseram que no fundo do corredor estaria o plantel da casa à disposição.

Neste local, logo que a pessoa entra é trancada a porta e lá dentro já lhe espera uma equipe preparada, o chamado “grupo SOS”, ou grupo dos oito:  isso mesmo, são oito homens fortes que, se precisar, seguram a força e sedam o sujeito com roupas e tudo, apaga em segundos e quando acordar já estará preso à cama com cintas, até começar raciocinar e concordar que a única saída era esta. São oito dias que sofrem todos os membros da família, pois na verdade este agora passa ser um problema de todos.

Os que armaram a cilada ficam todos emocionados e com um duplo sentimento. Mas nada que com o tempo não serão perdoados pelo dependente, que em muitos casos agradece a todos que contribuíram pra ele sair daquela situação. Entra, olha pra quem ali esta, larga uma gaitada e pergunta: “E aí indiada veia! Cadê as muié?” E logo é cercado e sedado sem tempo de resposta. Contam que naqueles oito dias, no segundo, já tinha se dado conta do que lhe acontecera e pediu ao psicólogo de plantão para soltarem-no,  pois já sabia da trapaça, não deixando, é claro, de desgraçar todos os que armaram pra ele.

E assim foi, soltaram o vivente. Na primeira ida ao banheiro do local, levou sua escova de dentes, entrou e foi flagrado tentando fazer a barba com a escova , tamanho era o grau de intoxicação e medicação. Contam também que ali viu bichos e baratas gigantes nas paredes e até macacos na janela.

Depois dos oito dias, ele vai pro pátio, onde pode reaprender a viver longe da dependência, num tripé fundamentado em Oração, Trabalho e Resiliência. Ali também são praticados os 12 passos do A.A., método eficiente para recuperação do individuo. O primeiro é “admitir que era impotente perante o álcool – e que havia perdido o domínio sobre sua vida”.

Horas vagas somente pra chimarrão e alimentação, no mais o dia é completo de palestras e afazeres dignos de uma vida saudável. Somente depois de uma quinzena é permitida a visita dos seus familiares. E lá estavam todos na primeira visita: mulher, filhos, cachorro de estimação e os “ricos” primos que armaram a façanha para o bem do cara.

Passados dois meses de internação é chegada hora de voltar a viver sua vida em sociedade se assim entenderem os especialistas. Que maravilha . Tio de volta e agora de “cara limpa”, como costumam dizer. É marcada uma grande festa, desta vez sem álcool. Todos concordam e o reencontro foi um sucesso. Uma alegria só.

Mas qual seria o motivo dele ter entrado nesse vício? Cochichavam todos, sem saberem que eles mesmos são todos alcoólatras. Existem na verdade vários graus, de Alfa a epsílones, ou seja, os que bebem “somente final de semana”, os que bebem “somente quando vão em festas”, os que bebem “somente quando assam uma carninha”. Verdade seja dita, todos alcoólatras. O perigo de voltar a beber para um “ex-dependente” é eterno, a chamada recaída é pior que o estágio em que se encontrava quando foi internado. Mas, graças, já fazia seis meses que o tio segurava as pontas bravamente, até que numa bela noite veio a velha vontade e ele não se segurou e vazou pro bar. Desta vez escolheu um novo bar, novos amigos bebendo e lá entrou noite adentro confessando ao seu mais novo parceiro de copo tudo que lhe acontecera. Inclusive dizendo que quando casara a 35 anos atrás casou com uma linda mulher, de causar inveja!

O bar fechando e os parceiros já gaguejavam na conversa, quando o proprietário avisa que irá fechar as portas. Ao levantar, o Tio “tastaviou”, afinal, fazia tempos que não bebia, desacostumado, seu amigo então resolveu lhe levar em casa. Aceitou e saíram em direção de suas casas. Seu amigo porém ressaltou: “antes me diga onde moras e te deixarei na porta”. Ele aceitou.

No caminho, o amigo pensou: ”eu bebo, mas não fico neste estado! Qual seria o motivo?” Chegando, parou o carro e teve que auxiliar o parceiro no ombro. Bateu na porta, a porta se abre e a mulher dele olha com uma cara de pavor, ou melhor, pavorosa era ela. O amigo cai duro. Qual seria o motivo? Pois este soube!

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