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Pós-mentira – por Orlando Fonseca

Vivemos uma era de indefinições e de transições, especialmente, para não nos sentirmos incômodos como seres humanos e civilizados, na busca de afirmações. Não dispomos mais de estabilidades como as geradas pelo teocentrismo medieval, pelos regimes aristocráticos, mesmo os esclarecidos. Os estados-nações e os regimes republicanos não nos aquietaram. Sequer os avanços trazidos com a modernidade nos fazem olhar o passado próximo, viver o presente, e vislumbrar o futuro com segurança. Antes pelo contrário: a crença na racionalidade  – que presidiu todas as conquistas científicas – não embala em conforto por muito tempo. Em meio às comodidades que nos trouxe, com as revoluções industriais e tecnológicas, de tempos em tempos revisamos tudo em que investíamos nossa fé. Por isso, de algumas décadas para cá, desde o final do século XX, passamos a pespegar um prefixo para identificar, provisoriamente, o que vamos descobrindo em nossa marcha. A começar pela tal da pós-modernidade, até chegar à pós-verdade, desde o ano passado.

Situando melhor, com o Iluminismo, superadas as convicções geradas pelo domínio do misticismo religioso, a verdade passou a ser um produto do raciocínio lógico, que pudesse ser comprovado pela criteriosa observação dos fatos, das provas geradas pela análise e pela reflexão, filosófica ou matemática. E isso teve vigência ao longo dos séculos, chegando até a esta era de incertezas, ou pelo menos, de convicções não absolutas. Entendemos que o caos é parte do processo, desde a origem do universo até os índices das bolsas de valores ao redor do planeta. Por isso gostamos tanto do jogo, das competições esportivas. Vai daí que as relações interpessoais, institucionais e políticas também embarcaram na instabilidade de um mundo em que tudo vira mercadoria e depende da exposição. As redes sociais só vieram dar um impulso ao negócio. Para conquistar alguém não importa ser sincero, mas parecer bem quisto; para demonstrar que está funcionando, o administrador só precisa mostrar dados positivos e para ser eleito, o candidato tem de ser simpático, não honesto ou capaz. E no ambiente jurídico, os operadores do direito não precisam mais levantar provas, é preciso apenas que tenham convicções.

Ou seja, a tal da pós-verdade pode mesmo é ser uma tremenda falácia e, para não ficar na definição clássica, vamos chamar de pós-mentira a sua contrapartida. São as “fake news”, o compartilhamento de informações nas redes sociais sem o mínimo fundamento, a convicção de políticos e jurisconsultos em seus discursos. O ex-presidente foi criticado exaustivamente por afirmar que “não sabia de nada”. Agora, em que vive uma enxurrada de “convicções sem provas”, a crítica mantém um silêncio cínico. Agora, prestam mais atenção no que os ocupantes dos cargos mais importantes da república vêm afirmando. Pegos em flagrante, ou em atitudes muito suspeitas, dizem “não usamos”, “não fomos nós”. A situação no país ficou de tal forma esquisita que, se não fosse trágica seria apenas cômica. Certas afirmações do Temer aparecem na mídia como se fossem uma verdade. E se parecem mesmo com aquela frase do Homer – do seriado Os Simpsons: “Já estava assim quando cheguei”.

Não sei de onde viemos, e tenho dúvidas para onde caminha a humanidade. Como brasileiros, a coisa é mais aguda ainda. A esta dúvida não-cartesiana vou chamar, por enquanto, de pós-destino.

DE FATOS E DIVERSÕES

– Depois de fazer merda, carregando uma mala com propina da JBS, supostamente, para ser entregue ao seu chefe Temer, o ex-deputado federal Rodrigo da Rocha Loures (PMDB-PR), pede para ser transferido ao presídio da Papuda. Reclama que a carceragem da PF em Brasília não tem banheiro adequado – por suposto, para quem faz grandes cagadas.

– Quando repetidas vezes o Presidente se defende dizendo que “está arrumando a casa”, comete um ato falho. A Polícia Federal já encontrou provas com o coronel aposentado, João Baptista Lima Filho – apontado como intermediário da propina da JBS ao amigo, hoje no Planalto – de que a reforma da casa da filha de Temer foi custeada com este dinheiro. E não se trata de pedalinhos.

– Para Aécio, família em primeiro lugar (veja-se o caso do aeroporto de Claudio): “Mexeu com a minha irmã, mexeu comigo”. Para ser verdade, só se considerarmos o seguinte: se o STF não deu liberdade a ela, têm que prendê-lo também. Aí seria lindo!

– Entenda-se este país e o seu modelo de democracia! Grupos dos chamados “formadores da opinião pública”, encastelados em grandes veículos da mídia, defendiam que o impeachment da Dilma – que não cometeu crime algum, basta reler os diversos processos, tanto no Congresso quanto no STF e mais recentemente no TSE – era constitucional, portanto exequível. Agora querem “eleições indiretas” porque é constitucional, ignorando o movimento crescente das ruas pelas Diretas Já.

OBSERVAÇÃO DO EDITOR: a imagem que ilustra estes textos é reprodução da internet.

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