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Nem – por Orlando Fonseca

O síndico, como era chamado o cantor da MPB, Tim Maia, além das manias que fizeram Ben Jor cunhar-lhe o apelido, lascou uma frase definitiva sobre o Brasil. “Este país não pode dar certo. Aqui prostituta se apaixona, cafetão tem ciúme, traficante se vicia e pobre é de direita”. Para se ter uma ideia sobre a decadência atual, a situação piorou de tal maneira, que o Tim teria de acrescentar: “traficante dá lição de moral”.

Em uma intrigante entrevista para o jornal El País, o Nem da Rocinha, preso na penitenciária federal de Porto Velho, em Rondônia, dá a receita para acabar com a violência. “Além de investir em educação, se você quer acabar com o tráfico você precisa legalizar as drogas. Quer tirar todo o poder do traficante? É só legalizar”. E ainda acrescenta, para ratificar seu argumento: “Não adianta só legalizar. É preciso falar sobre isso nas escolas. Ensinar desde cedo o que é a droga. Não adianta falar apenas ‘droga é ruim’, ‘não usa’. O jovem tem curiosidade com isso”.

Isso até pode soar como folclore, como delírio de geniais compositores da MPB, justo na semana em que a vereadora do PSOL, Marielle Franco, é assassinada no centro do Rio após evento com ativistas negras. Numa flagrante demonstração de que o Estado – em sua versão atual – quando age, age muito mal, ainda acentua que a Intervenção no Rio de Janeiro, como neste fato trágico, dá mostras de que não resolve o problema da violência. É a própria violência. E que se a ação militar é, no dizer do general Interventor, um laboratório para o restante do país, estamos à beira do abismo com a panaceia que pode resultar de suas pipetas, cadinhos e tubos de ensaio.

Contrária à intervenção federal, a vereadora havia criticado dias antes ação da PM em Acari. Marielle e seu motorista foram mortos no Estácio, na região central da capital fluminense, e as investigações apontaram coisas estarrecedoras: trata-se de uma execução – nenhum objeto foi levado; os indícios apontam que não se trata de um “modus operandi” dos traficantes; os projéteis são de um lote vendido à Polícia Federal. O que se seguiu nas redes sociais é mais um eloquente testemunho da barafunda em que nos metemos como povo, como nação, como seres humanos.

Em meio a um punhado de fake news, para o qual contribuiu até mesmo uma desembargadora do Rio de Janeiro, “gente de bem” comemorando a morte de uma política “defensora de direitos humanos” – leia-se, segundo a ótica estreita dos menos informados, “bandidos”; estranhando que não há lamento da morte de policiais e outras pessoas “inocentes”.  Valha-nos a verve ferina do Síndico.

No meio das balas perdidas – metafóricas ou não -, aprofunda-se a divisão entre defensores da intervenção militar e os que a criticam. Do meu lado, abrigado em minha casamata literal, penso que o Exército tem obrigações constitucionais de defesa do território, contra nossos inimigos externos. Toda vez que aponta as armas para um cidadão nacional, deflagra uma circunstância que pode virar crise. Por isso quando é chamado, em meio a crises que o Estado não dá conta, a probabilidade de que ponha mais lenha na fogueira é imensa.

A ordem civil deve ser garantida pela cidadania, com civilidade e não com armas; com diálogo, não com violência. Sem conflitos externos, a paz deve ser buscada pela fraternidade, com inteligência, com tolerância, mesmo as Forças Armadas estando envolvidas.

“Chama o síndico” é apenas o refrão de uma canção popular. Nem tanto ao céu, nem tanto à terra, mas a única forma, em uma democracia, de colocar ordem na casa republicana, é através do voto. Só a escolha de um dirigente que tenha legitimidade para apresentar projetos e administrar recursos conduz a uma sociedade justa e igualitária. O resto é Nem uma coisa, Nem outra.

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