Siga em frente – por Bianca Zasso
Ontem foi dia dos namorados e vários casais saíram para jantar, trocaram presentes, enfrentaram filas e quem sabe até brigaram só para terem o prazer de fazer as pazes. Na TV, no rádio, nas redes sociais em onde mais se possam imaginar, as pessoas falam de amor, romance e dicas de como agradar seu parceiro. O que poucos lembram (e que não vende bem produto nenhum) é que a noite passada foi de tristeza e solidão para muitos. Casais desfeitos costumam render boas histórias. Uma das melhores foi levada para a telona pelo diretor Brad Silberling.
Vida que segue, produção de 2002, é levemente inspirada na vida do próprio Silberling, que viu sua namorada, a atriz Rebecca Schaeffer, assassinada por um fã e sua vida perdeu o rumo. A trama se passa na década de 70 e narra a trajetória de Joe, um jovem apaixonado e prestes a se casar. Sua cabeça antes ocupada com preparativos e expectativas sofre um baque quando sua noiva é assassinada. Joe passa então a morar com os sogros, vividos magistralmente por Dustin Hoffman e Susan Sarandon e a sustentar um luto que parece que não terá fim.
Se o diretor/roteirista tivesse optado por tornar o luto de Joe o centro do filme, teríamos um bom filme. Mas Vida que segue tem o seu trunfo justamente por falar desse momento tão delicado que é a libertação da tristeza. Após algumas semanas de lembranças e com os sogros fazendo dele uma espécie de filho substituto, Joe conhece Bertie, uma funcionária dos correios da cidade e… se apaixona. Seria apenas mais uma história de amor começando, não fossem as cobranças que rondam o nosso amigo Joe. A pressão da família e os resquícios do sentimento que nutria pela noiva o atormentam, enquanto uma vontade de voltar a ser feliz bate a sua porta. A crise de Joe é o que guia o filme e acaba se propagando para todos os outros personagens.
Vida que segue consegue conquistar o espectador apesar de suas falhas no roteiro, em especial nos diálogos piegas e dispensáveis. Porém, o grande trunfo do filme está na encenação. A coreografia dos corpos e olhares dos atores produzem cenas ótimas, como a vivida entre Joe e Bertie no bar. E como toda boa coreografia depende de uma boa música, Vida que segue nos presenteia com uma trilha sonora ótima, a começar pela canção que dá o título original do filme, Moonlight mile, dos Rolling Stones. Jefferson Airplane, Bob Dylan e Van Morrison também têm lugar no luto e no amor de Joe.
Brad Silberling, alguns anos antes de fazer Vida que segue, dirigiu Cidade dos Anjos, inspirado de longe pela obra-prima de Wim Wenders Asas do desejo. Um filme que também tinha como protagonista um rapaz (no caso, um anjo) dividido. A diferença entre Joe e o anjo é que ele discute seu desejo por um novo relacionamento de uma forma racional e sem a idealização do amor mostrada em Cidade dos anjos. Ao contrário do que a produção apresenta, o amor nem sempre vale a pena e durar para sempre não é garantia de sucesso. O amor de Joe é mais pé no chão, mas nem por isso menos encantador.
Sei que Cidade dos anjos foi um sucesso e que foi a escolha de muitos casais para a sessão pipoca de ontem. Mas vale a pena dar uma chance para Vida que segue, especialmente se você, caro leitor, estiver acompanhado. Afinal, nunca sabemos quando a vida nos virá com uma surpresa. Assim como podemos prevenir incêndios, temos que estar preparados para outras coisas difíceis de apagar. Seguir em frente é a regra número um.
Vida que segue (Moonlight mile)
Ano: 2002
Direção: Brad Silberling
Disponível em DVD
Vergonha alheia pelo trocadalho ali no fim do texto. Credo.