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CRÔNICA. Há conflito entre fé e ciência? A pergunta para a qual se busca, indefinidamente, uma resposta

Perguntas

Por ORLANDO FONSECA (*)

Pergunte-se a respeito do conflito entre fé e ciência. Por que é perigoso perguntar? Existe um conflito entre fé e ciência? Por que é perigosa a gestão do ensino a partir de uma crença? Há riscos em um crente comandar um ministério responsável pela educação laica no país? Continuamos a perguntar, indefinidamente porque não temos respostas para todas as coisas.

Somente a fé pretende que haja uma resposta definitiva – e isso satisfaz ao sujeito que crê. A ciência alcança respostas em etapas, por isso o cientista continua a perguntar. Certamente não há problemas de um crente dirigir o MEC, desde que consiga fazer separação entre os fenômenos metafísicos de sua fé e o que é preciso fazer com a realidade, para a ciência avançar no país. Exemplos de barbárie fundamentalista existem aos montes mundo afora.

A Modernidade, como idade da civilização, tem sua marca inaugural quando a razão, o raciocínio, a mente humana foi usada para buscar respostas, suplantando o mito e as doutrinas religiosas. E as perguntas se referiam ao mundo material, tais como: a Terra é redonda e gira em torno do sol?

Havia outras, mas estas eram imensas para a grande maioria dos seres humanos, confiantes no senso comum, originado nos princípios da fé – no ocidente, com as bases do monoteísmo das religiões judaico-cristãs e  muçulmana. A ciência só teve o desenvolvimento que conhecemos hoje por ter superado o primado da religião, ao final da Idade Média.

No período conhecido como Humanismo, temos obras escritas, como o Elogio da loucura, estabelecendo o primado da razão e a obra Utopia, que ousa anunciar o paraíso na Terra – aqui e agora – e não no Céu, depois da morte. Tudo isso graças à formação de um público leitor, ávido por obter o conhecimento por si mesmo, porque, com a invenção da imprensa, o livro se tornou um objeto mais acessível.

Tanto a reforma da Igreja, com as teses de Lutero, quanto o período conhecido como Renascimento – resgate da estética e da filosofia greco-romanas -, colocaram na ordem do dia outros saberes, para que se realizassem, a partir do século XVI, as grandes descobertas, a invenção da pólvora e dos equipamentos náuticos, o avanço da medicina e da psicologia.

Com a passagem do feudalismo, arrefeceu do poder da Igreja, que impunha uma visão teocêntrica do mundo. Com isso, potencializa-se uma visão do indivíduo (do “eu penso, logo, existo”) antropocêntrica, com a novidade da experiência de vida burguesa.

A aventura pelo grande Mar Oceano era um desafio à visão do antigo regime do saber religioso, de um abismo nas bordas da Terra Plana e dos monstros marinhos que povoavam o imaginário forjado pelo mito.

Assim como o corpo humano, então inviolável por ser criação divina: ao passar pelas aulas de anatomia, permitiu-se o avanço de tratamentos médicos. A loucura passa a ter a sua definição patológica, e não por observação empírica de perguntas para além do senso comum.

Desse modo, as experiências científicas, baseadas na teoria evolucionista e o conhecimento do DNA, dá ao ser humano uma nova condição no Planeta compartilhado. A especulação, condenada pela religião, travou o conhecimento durante séculos, na Idade Média, mas a dúvida cartesiana, que conduz à experimentação e à constituição de teorias, trouxe-nos ao século XXI, com todos os avanços tecnológicos, com o estabelecimento de novas relações e perspectivas.

A modernidade só terá sua superação quando a razão humana for superada pela Inteligência Artificial. Se isso é o Apocalipse, se isso significa o fim da aventura humana na Terra, é uma questão para a ciência, tratada com a ética, com a filosofia, e não com a crença religiosa, que pode trazer respostas apaziguadoras para os fiéis, mas não explica a ordem (ou desordem) desse caminho.

As respostas da fé podem nos tranquilizar, mas nos deixam à mercê do que não sabemos. São as perguntas (provocadoras de inquietude) que movem o mundo.

(*) ORLANDO FONSECA é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e  Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela Da noite para o dia.

OBSERVAÇÃO DO EDITOR: a imagem que ilustra esta crônica é uma reprodução do YouTube.

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2 Comentários

  1. Maravilhoso texto do Orlando Fonseca. Vamos lembrar que Elogio a Loucura foi escrito por um monge no século XVI. Texto lindo que escamoteia a sensura. O Obscurantismo jamais será alimento espiritual para a humanidade. Galileu obrigou-se a retirar sua tese para não morrer na fogueira. Esse fundamentalismo neopentecostal que todos os hereges sejamos combatente.

  2. Vermelhinhos não desperdiçam qualquer bobagem para criticar o governo. Problema é que como a maioria considera bobagem, a crítica vira encheção de saco. De qualquer maneira todos são livres para gastar o tempo como acharem melhor.
    Não vale a pena perder muito tempo para debater afirmações de quem tenta passar a imagem de que entende muita coisa de muitos assuntos, o que obviamente não é o caso.
    O método cientifico e a ciência têm seus limites. Para os interessados é bom olhar o termo ‘cientificismo’ no buscador aquele.
    Relação entre ciência e religião é avaliada por generalizações, sugestão é verificar quem foi Georges Lemaître como exemplo.
    A religião não foi a única ‘inimiga’ da ciência, vide Trofim Lysenko na antiga União Soviética. Atrasou a agricultura e o estudo da genética no falido império. Com apoio de Stalin mandou muita gente para o Gulag para acabar com gente que pensava diferente dele.
    Inteligência Artificial consciente como falam por aí não passa de uma possibilidade, não existe garantia nenhuma que vá acontecer. Mesmo que aconteça ainda está muito longe.

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