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É CINEMA. Bianca Zasso e “Rocketman”, o filme do “Elton John”. Na verdade, na verdade, é beeem mais

Uma vida fantástica

Por BIANCA ZASSO (*)

A crise criativa que se instala no cinema hollywoodiano faz com que, entra ano, sai ano, sempre surja uma cinebiografia disposta a causar alvoroço até com quem sequer sabe quem é o personagem central. Bohemian Rhapsody, que algumas pessoas cometem o crime de chamar de “o filme do Queen”, trata-se do exemplo mais recente de uma vida levada para as telas com uma faxina caprichada nos capítulos que envolvem sexo e drogas, além de invisibilizar a mais que assumida bissexualidade de seu protagonista, o músico Freddy Mercury.

Ter a esperança nas cinebiografias intacta após essa e outras produções decepcionantes é uma tarefa árdua. Mas o inglês Dexter Fletcher resolveu presentear o público fazendo o que todos nós devíamos fazer com nossas próprias existências quando tudo parece perdido: deixar-se levar pela fantasia.

Rocketman, que alguns infelizmente irão chamar de “filme do Elton John”, é tão inteligente quanto seu retratado. As plumas, os paetês, as cores vibrantes e os inseparáveis óculos nem um pouco discretos do cantor inglês foram o ponto de partida para a criação de um musical que brinca de contar a primeira etapa artística de Elton John, interrompida pelo vício em remédios controlados, cocaína e álcool.

Sem apelar para a historinha incentivadora de menino prodígio do piano ignorado pelos pais que alcança a fama, o roteiro de Rocketman tem como fio condutor o próprio Elton, já famoso e com dezenas de sucessos nas costas, abrindo o coração em uma reunião de dependentes químicos. O filme é o divã, mas não espere cenas milimetricamente pensadas para causar lágrimas.

A não cronologia das músicas dentro da trama, outro tiro certeiro da produção, podem fazer muitos desavisados saírem da sala de exibição com um punhado de informações erradas sobre os álbuns de Elton, mas isso o Spotify resolve.

Por ter como base o gênero musical, Rocketman usa as canções para contar uma história, não se preocupando muito se ela auxilia uma cena que aconteceu décadas antes dela ser lançada. E quem se importa se Crocadile Rock foi lançada em 1970 ou 1972, se ela embala uma das cenas mais empolgantes do longa? Quem não se segurar na cadeira tem o perdão até do mais chato dos cinéfilos.

Outra ponto que não merece reclamação é o elenco. Taron Egerton enfim pode mostrar que pode ser um dos grandes de sua geração. Sua interpretação de Elton John não tem nada de caricata e os arranjos das músicas, feitos para seu timbre, são incríveis. O jovem ator convence na coreografia à lá West Side Story ao tom intimista e emocionante da apresentação de Your Song para o produtor do primeiro single.

E o que dizer de Jamie Bell? Seu Ben Turpin equilibra o jeito de menino interiorano com a potência de um compositor que encontrou o parceiro perfeito para dar melodia às suas palavras. A magia de suas músicas cresce quando as ótimas elipses de tempo unem versos de vários tempos para deixar claro a amizade entre ele e Elton.

Tantos elogios, parece que estamos diante de um filme perfeito. Não é o caso, pois a produção peca nos quesitos maquiagem, em especial para envelhecer os atores, e no uso de computação gráfica para criar a multidão dos shows. Não chega a quebrar o clima, mas poderia ter sido resolvido de outra forma.

Quem sabe uma forma fantástica, que comanda quase todo o tempo de duração de Rocketman e que, na opinião desta colunista, poderia ter sido usada com mais intensidade. Se há algo que Elton John permite, seja de corpo ou de alma, é deixar a fantasia falar mais alto. Seja no fundo da piscina, triste e solitário, ou voando num foguete.

Assista. Viaje. A volta para casa é certa, já que o mundo real nos chama. Mas podemos seguir em frente sem ser os mesmo de antes. É para isso que serve o cinema, entre outras coisas.

Rocketman

Ano: 2019

Direção: Dexter Fletcher

Em cartaz nos cinemas

(*)  BIANCA ZASSO, nascida em 1987, em Santa Maria, é jornalista e especialista em cinema pelo Centro Universitário Franciscano (UNIFRA). Cinéfila desde a infância, começou a atuar na pesquisa em 2009.  Suas opiniões e críticas exclusivas estão disponíveis às quintas-feiras.

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Um Comentário

  1. Crise criativa? Guilda dos escritores 50 mil roteiros em média por ano. Pessoal por lá calcula que uns 150 viram filme todo ano, ou seja, 0.3%. Todo dezembro ainda sai a Lista Negra, a relação dos roteiros melhor avaliados que ainda não viraram filme.
    Bohemian Rhapsody custou 52 milhões e faturou 900 e poucos. Rocketman custou 40 milhões e faturou quase 140 milhões até agora. Critica do filme do Fred Mercury foi meia boca, Elton John teve crítica muito melhor.

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