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ARTIGO. Valdeci Oliveira e alguns efeitos dos cortes na UFSM, especialmente desemprego de terceirizados

A face perversa e desumana da precarização da educação pública

Por VALDECI OLIVEIRA (*)

Os cortes orçamentários impostos pelos ministérios da Economia e Educação às instituições de ensino públicas federais, que englobam as universidades, os institutos federais e a educação básica, e que superam 30% em muitos casos, além de agravar uma situação que nunca foi confortável – apesar de o investimento público por aluno ter quase triplicado entre os anos 2003 e 2016 – vem revelando uma outra face, pouco falada e pouco notada pelo conjunto da nossa sociedade. Ela veio à tona durante a audiência pública que buscou debater os impactos dos cortes orçamentários na educação para os municípios gaúchos, realizada na semana passada, dentro da programação da 26ª Feicoop, em Santa Maria.

Trata-se dos milhares de pais e mães de família que perderão seus empregos, pois são contratados de empresas prestadoras de serviço às instituições de ensino. São vigilantes e pessoas que trabalham na limpeza, na portaria e nos diversos setores de manutenção cujos empregadores estão tendo seus contratos revistos, readequados ou cancelados. E isso está acontecendo em todos os 27 estados brasileiros. Foi a forma encontrada pelos gestores dessas unidades de ensino para fazer frente à retirada de parte significativa de seus recursos e assim manter no limite do necessário o funcionamento das instituições.

Somente em Santa Maria, a readequação de um contrato de terceirização, se concretizado, terá como resultado uma redução de 64% nos serviços prestados à UFSM. Dos 900 contratados apenas 300 deverão permanecer trabalhando. Serão 600 as pessoas que a empresa prestadora provavelmente terá de demitir. São vidas que estão em jogo, são famílias que ficarão sem proventos no final do mês e irão compor este já imenso exército de reserva de mão-de-obra que é mantido para atender aos interesses do chamado andar de cima. São homens e mulheres que irão engrossar o atual contingente macabro 13 milhões de desempregados no país, número que dobra se levarmos em conta aqueles que desistiram de procurar uma ocupação.

Ficarão sem uma ocupação as mesmas pessoas que perderam com a reforma trabalhista que, sob o falso pretexto da modernização das relações de trabalho, alterou mais de uma centena de cláusulas da CLT, resultando na extinção de direitos e conquistas sociais civilizatórias. São as mesmas pessoas que agora perderão novamente com a reforma da previdência, que mantém os privilégios dos mais abastados e cujo projeto deixa claro – para quem o leu – que 80% de toda a economia buscada pelo governo virá de quem ganha até dois salários mínimos.

A lógica aplicada pelo governo federal é tão perversa e cínica que essas mesmas pessoas que perderão seus empregos são pais e mães de jovens que dependem única e exclusivamente do acesso ao ensino público superior para que tenham uma chance de progredir na vida. São jovens e adultos trabalhadores que terão seus sonhos ceifados pela absoluta insuficiência de recursos nas nossas instituições públicas de ensino. Fazem parte de um contingente de brasileiros e brasileiras que, por conta do desemprego de seus pais e pelo encolhimento drástico do acesso ao ensino, deixarão de sonhar com a transformação de suas vidas por meio da educação profissional pública de qualidade e voltarão a integrar aquele segmento “invisível” que historicamente esteve alijado dos processos educacionais.

Para contextualizar, 80% dos estudantes que frequentam a maioria dos institutos federais possuem renda familiar per capita inferior a um salário mínimo, ou seja, o perfil daqueles cujos pais, mães ou irmãos perderão seus empregos por conta dos cortes orçamentários. Talvez para tornar mais claro a opção do Ministério da Educação, na atual composição do MEC, no primeiro e segundo escalões, não há nenhum educador, todos são economistas. Enquanto isso, o portal da Transparência registra que a previsão para 2019 é que seja pago  R$ 1,3 trilhão de juros da dívida interna para o sistema financeiro, ou seja, 48% do orçamento total da União.

E é importante que façamos esse debate, pois não se trata apenas de cortes, mas de uma discussão que inclui receita, despesas, impactos, orçamento e a sobrevivência e o futuro de muitos. Ao observar essa realidade, não há como não questionar e se indignar com um fato que é cada vez mais concreto: em um país historicamente desigual e ainda dotado de elevados índices de pobreza e miséria, a maior parte do orçamento público não é voltada a desconstrução dessa realidade, mas sim para fomentar e favorecer segmentos e setores que já ocupam privilegiadamente o topo da pirâmide social brasileira. Enquanto esse contrassenso não acabar, o povo brasileiro, em sua maior porção, permanecerá apartado de condições dignas de vida.

(*) VALDECI OLIVEIRA, que escreve sempre à sextas-feiras, é deputado estadual pelo PT e foi vereador, deputado federal e prefeito de Santa Maria.

OBSERVAÇÃO DO EDITOR: a foto (com o vice-reitor da UFSM, Luciano Schuch, ao microfone) que ilustra este artigo é da Audiência Pública realizada durante a Feicoop, sobre impacto dos cortes nas Universidades e Institutos Federais.O autor é Tiago Machado.

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