Claudemir Pereira

CRÔNICA. Orlando Fonseca, a WEB e o isolamento

Rede x isolamento

Por Orlando Fonseca*

Tempos estranhos estes: até recentemente, tinha importância crucial em nossa vida em sociedade, tanto na rotina, quanto na cultura e na política, o que se convencionou chamar Rede Social. De brinquedo entre amigos adolescentes, à bilionária estrutura comunicativa de Zuckerberg e seus algoritmos, a comunicação instantânea deste início de século não apenas mudou as relações sociais, mas passou a ter influência sobre a vida de todos no Planeta. Para o bem e para o mal. Agora, duas décadas do século XXI, o que assume importância crucial na vida de todo mundo, em vista da pandemia provocada pelo Covid-19, é justamente o oposto: o Isolamento Social. As campanhas com o lema/ordem “Fica em casa!”, as recomendações para que as pessoas evitem se tocarem umas às outras, ou mesmo, simplesmente se darem as mãos, passaram a ser a essência deste momento histórico. E mais do que pode demonstrar o paradoxo em termos, uma coisa tem a ver com a outra, ou estão implicadas no estranhamento que este momento atual induz.

As redes sociais foram responsáveis por elevar à categoria de fenômeno cultural o que a Oxford Dictionaries chamou de “pós-verdade”, em 2016. Para os especialistas em sociologia, trata-se de um substantivo “que se relaciona ou denota circunstâncias nas quais fatos objetivos têm menos influência em moldar a opinião pública do que apelos à emoção e a crenças pessoais”. Pela grandiosidade das redes, com a falsa impressão de abrangência planetária de qualquer opinião, meme ou pitaco sem fundamento, os fatos objetivos perderam a importância em subsidiar a opinião pública. Ganharam força os apelos emotivos e as crenças pessoais. Passou a valer a máxima: se eu acredito é verdade; não importam os argumentos contrários, sequer os fatos. Fruto do individualismo que ganhou força na virada do século, junto com o crescimento da internet, o que passou a existir foi a ilusão do convívio, em que as mensagens trocadas nos meios virtuais criaram grupos de interesse e ações efetivas sem base e sem preocupação com as consequências sociais. Vide as eleições americanas – para citar um país sério, como diriam alguns.

Mas as redes também foram importantes para deflagrar movimentos contra-hegemônicos, por exemplo, na Espanha, com os Indignados, e no Oriente Médio com a Primavera árabe. No entanto, sem uma articulação política – no caso espanhol com a formação do Partido Podemos – houve dispersão sem mudanças efetivas. Com a Covid-19, tanto poderemos perceber ações benéficas para a população, quanto a disseminação de fake news, capazes de desmobilizar ou até mesmo prejudicar atos oficiais – médicos ou governamentais. Ainda creio que a rede social pode ser uma potente ferramenta de união e solidariedade. Em vista do distanciamento social necessário, nesta fase em que começa ascender a curva de contágio, o WhatsApp, o Facebook, os aplicativos de teleconferências são importantes aliados para manter as pessoas em casa. Pelas redes também são impulsionadas ações de assistência aos que, diante do comércio fechado ou limitado, passam a ter necessidades maiores.

Através da WEB, é possível criar um vírus, ao qual daríamos o nome fantasia de Convivid-19. Especialistas afirmam, diante do caos gerado pela pandemia – como nunca visto antes – que haverá mudanças definitivas nas relações interpessoais e institucionais. Ou seja, há uma oportunidade para que a vida virtual enseje um novo modo de convivência, a vida humana em sua essência pode resultar outra depois deste annus horribilis. A crença na mídia de uma sociedade conectada poderá se dar em outros parâmetros, para fortalecer algo novo. No entanto, como costumamos ver nos grandes eventos humanos, também poderá se fortalecer o caos, e o apocalipse será inevitável.

*Orlando Fonseca é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela Da noite para o dia.

Observação do editor: a imagem que ilustra esta crônica é uma reprodução da internet.

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