A pandemia nos faz pensar em “novo essencial”
Por JOSÉ MAURO BATISTA (*)
Foi preciso que uma pandemia paralisasse o mundo para que começássemos a refletir sobre esse mesmo mundo. Nem todos, mas creio que boa parte da humanidade relativamente inserida na sociedade de consumo passou a reavaliar sua presença no Planeta a partir da constatação de que a vida é, definitivamente, mais frágil do que talvez imaginássemos há até bem pouco tempo. E essa reavaliação começa pelos hábitos de consumo.
Afinal, tudo o que consumimos é realmente essencial para satisfazer as nossas necessidades? Aquilo que achamos necessário é realmente necessário? É certo que a comida, o ar e água estão entre as coisas indispensáveis para a sobrevivência e sobre isso não há nenhuma novidade desde que as primeiras matrizes de hominídeos surgiram na Terra há alguns bilhões de anos. Na escalada da evolução humana, foram surgindo outras coisas essenciais, como o fogo e as vestimentas, por exemplo.
De lá para cá, nos conta a História, os suprimentos foram aumentando, conforme as nossas necessidades até chegarmos aos dias de hoje, em que uma coisa chamada mercado (outra invenção dos humanos) cria necessidades que não existem para que produtos e serviços sejam consumidos, alimentando o que conhecemos por economia.
Definir o que é essencial não é tão simples assim, pois o que para alguns é dispensável, para outros não é. Se pensarmos que ir a um salão de beleza é supérfluo, o que dizer quando o fato de melhorar o aspecto visual está diretamente relacionado à elevação da autoestima? Pode até ser uma “necessidade criada” pelo mercado da beleza, mas isso não faz o desejo de se enfeitar “menos essencial”. Até porque, entre nossas crenças mais primitivas, conforme estudos de neuropsicologia, está a de que todas as coisas têm uma essência embutida, o que nos aproxima ou nos afasta delas. E isso é o motor do consumo.
SAPATOS, GRAVATAS E LIVROS
O exagero – que tipifica o que denominamos consumismo -, no entanto, é fácil de ser medido. O que justifica ter uma coleção de milhares de sapatos ou gravatas, mesmo que isso ilusoriamente melhore a autoestima do proprietário? Diferentemente, o acúmulo de livros (desde que não sejam da mesma obra, evidentemente) jamais será tipificado como supérfluo.
O fato é que a pandemia reduziu o consumo de bens e serviços. Isso é muito ruim para o modelo de consumo vigente e está afetando empresas e causando desemprego. Por outro lado, a diminuição da circulação de pessoas e mercadorias já mostrou impactos positivos sobre o meio ambiente, como a diminuição dos índices de poluição (mesmo que temporários).
Diante disso tudo, há um debate inexorável – resultante da ameaça sanitária – do qual a humanidade não poderá fugir para garantir sua sobrevivência, e essa discussão envolve a dicotomia essencial x supérfluo (no sentido de dispensável).
A HUMANIDADE TERÁ DE SE REIVENTAR
O termo reinvenção é forte, mas acalmem-se aqueles que temem uma suposta ameaça comunista internacional: não se trata do fim da economia de mercado e da propriedade privada, mas sim de um redesenho do próprio modo capitalista de produção e de troca, que terá de se reinventar se quiser sobreviver. E é em nome da própria sobrevivência da sociedade de mercado que os próprios investidores buscam caminhos alternativos. Algumas dessas ideias não são novidade, outras serão revolucionárias. O grande desafio desse novo desenho, porém, será a inclusão de milhões de seres humanos à sociedade de consumo e a preservação radical do meio ambiente.
UM NOVO MUNDO A CAMINHO?
Nessa nova onda, a Accenture, maior empresa de consultoria do mundo, listou, no início da pandemia, algumas tendências que moldarão os negócios a partir de agora. Uma delas é o dinheiro digital, que conquistará cada vez mais espaço e praticamente extinguirá as transações por meio de cédulas e moedas, o que já era uma tendência bem antes da pandemia. Mas a confiança nas transações digitais exigirá um mercado cada vez mais competente de profissionais e produtos de segurança digital. Até mesmo empresas de seguro voltadas especificamente para essa área emergirão desse novo cenário.
No rol da Accenture também constam códigos de barras ambulantes, dublês digitais e sistemas de controle de transmissão de doenças em shoppings e supermercados, como a medição de temperatura, por exemplo. E há muito mais cenários desafiando os setores público e privado: bairros autossustentáveis, complexos sistemas de transporte limpos e alternativos, higienização de mercadorias e de áreas públicas, novas formas de experimentar roupas e calçados, cinemas com cabines de proteção, novos meios de diversão e de passar o tempo, e por aí adiante.
Como nunca, a robótica, a internet das coisas e as pesquisas de soluções preventivas para doenças e catástrofes estarão em alta. O que antes parecia miragem, coisa de ficção científica, está virando realidade.
Trata-se de um desafio que mobilizará o mundo inteiro e do qual empresários de qualquer estatura e políticos de diferentes ideologias não poderão escapar. Por isso, esse debate sobre o “novo essencial” deverá estar na agenda dos candidatos a prefeito e a vereador nas eleições municipais deste ano.
(*) José Mauro Batista é jornalista. Até recentemente, editor de Região do Diário de Santa Maria. Antes foi repórter e editor do jornal A Razão. Escreve no site semanalmente, aos domingos.
Observação do Editor: A imagem que ilustra esta coluna é uma reprodução obtida na internet.
Acredito que as pessoas inteligentes estão interessadas em se reeducar e agir de forma mais consciente.
Muito consumismo desnecessário irá sumir.
Parabéns mais uma vez pelo excelente artigo.
Muito boa a reflexão . O dito Mercado tem sido o destruidor de nações inteiras e escravizando povos com a sua ganância Parabéns.
Não, óbvio. Mudanças ocorrerão, mas o mais provável é uma tentativa de voltar ao ‘normal’ anterior o mais rápido possível. Não vai ocorrer nenhuma ‘revolução’.
Não é uma ameaça comunista, mas a ‘humanidade terá que se reinventar’ com o ‘redesenho do próprio modo capitalista de produção’.
Americanos já comemoram a eleição de Biden, o gágá, o ‘novo FDR’ do meio ambiente, o ‘líder’. Pichações ‘viva la revolucion’ e ‘liberal tua bala já está reservada’ nas vias ianques. Califórnia e NY devem quebrar diga-se de passagem, o êxodo é grande.
Discurso é o de sempre vindo dos de sempre: ‘temos que acabar com o capitalismo’.