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Lula, o direito ao aborto e a agenda de costumes – por Michael Almeida Di Giacomo

Declaração do presidenciável petista levou a acalorados debates. No entanto…

O ex-presidente Lula, em campanha para retornar à presidência da república, declarou na última semana que o direito ao aborto “deve ser encarado como uma questão de saúde pública”. Ele não está errado. Os inúmeros casos, oficiais ou não, falam por si.

O aborto inseguro – realizado por mulheres sem acesso a um atendimento adequado, geralmente pessoas hipossuficientes – conforme matéria veiculada no site do Conselho Federal de Enfermagem, é responsável pela morte de uma gestante a cada dois dias em nosso país. E que, a par de dados fornecidos pelo Ministério da Saúde, a interrupção voluntária da gravidez leva à hospitalização de mais de 250 mil mulheres/ano, cerca de 15 mil complicações e 5 mil internações de muita gravidade.

Enquanto a discussão teórica – filosófica constitucional – sobrepõe a realidade vivida nas periferias do Brasil, a prática segue criminalizada e, o que é conhecido por todos, quem tem dinheiro consegue realizar o procedimento de forma célere e segura.

Agora, por que a declaração de Lula foi motivo de acalorados debates entre aqueles que são contrários à descriminalização e os que entendem ser necessário que se garanta o direito às mulheres?

De certo modo, há uma razão com mais força argumentativa que as demais. É o fato de que ainda somos uma sociedade conservadora – pelo menos da porta para fora de nossas casas. A mesma sociedade que não hesita em lançar mão de práticas abortivas quando a gravidez afeta o seu planejamento familiar.

A referida verve conservadora está muito bem representada na defesa, por parte de parlamentares federais, de uma “Agenda de Costumes”. A “Agenda” tem por mote aprovar legislações rígidas contra a prática do aborto, combater à ideologia de gênero e outros projetos de lei, tais como a “escola sem partido”.

Os parlamentares, que em sua grande maioria compõem a Frente Parlamentar Evangélica do Congresso Nacional, num total de 196 deputados e 8 senadores, se valem da sua força eleitoral nas duas Casas para pautar a inércia dos agentes políticos sobre a matéria.

É por esse motivo que a fala de Lula, a meu ver, serviu tão somente para acenar a um público específico – uma bolha –  de que o candidato ainda mantém vivo compromissos com determinada pauta, tão cara às mulheres.

Contudo, a prática política do partido nos demonstra uma outra realidade, pois ao obter êxito eleitoral, a questão do direito ao aborto passa ao largo das suas prioridades. Não é difícil de notar que o número de parlamentares contrários e o interesse maior em manter a governabilidade, comum a qualquer governante sob o nosso modelo presidencialista de coalizão, tem maior apelo.

Um dos exemplos de que o partido tem atenção especial ao voto dos evangélicos é o fato de que a agremiação criou núcleos evangélicos em 21 estados do país, com o objetivo de dirimir a resistência do segmento religioso à candidatura de Lula.

A coordenadora do Núcleo de Evangélicos do PT, deputada Benedita da Silva, afirmou que as ações dos governos de Lula e Dilma “melhoraram a vida dos evangélicos, que podiam até mesmo ajudar mais as suas igrejas e suas ações sociais”. É um belo aceno.

Como é possível constatar, a declaração de Lula, na gíria política, provoca o debate, mas passada a eleição, caso seja vitorioso, não irá além disso.

(*) Michael Almeida Di Giacomo é advogado, especialista em Direito Constitucional e Mestre em Direito na Fundação Escola Superior do Ministério Público. O autor também está no twitter: @giacomo15. Ele escreve no site às quartas-feiras.

Nota do Editor: a foto (sem autoria determinada) que ilustra este artigo é uma reprodução obtida na internet. Você a encontra AQUI.

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4 Comentários

  1. Dai vem a parte ideologica. ‘Feministas’ defendem os ‘direitos das mulheres’ que podem os usufruir sem nenhuma responsabilidade. Pessoal da periferia é 100% hipossuficiente, tem que ser tutelado pelo Estado controlado pelo partido de esquerda. Mais totalitario do que isto impossivel, mas é tudo 100% ‘do bem’. Benedita é evangelica, mas Manoela D’Avila e Andrade por votos até na missa vão. Pior, tem gente que até acha que é serio. Existe doutrinação politica de esquerda por aí (vide o caso da escola Avenues, foi o mais recente) e ensino de ideologia de genero. Assim como o feto é só um parasita descartavel para alguns (e um ser humano para outros), as crianças não são ‘das familias’ são do ‘coletivo’, ‘da sociedade’. Existe o Estado e o ‘coletivo’, nenhuma outra instituição. Projeto do novo Codigo Penal esta na gaveta. Um dos motivos foi a descriminilização do aborto. Se lembro bem, bastaria um atestado medico ou de um psicologo afirmando que ‘a gestante não reune condições de levar a gravide adiante’. Ou seja, parece que não escancara, mas escancara. É sempre o subterfugio, a tentativa de enganar, de ser ‘mais esperto’. Há muitos militantes por ai que também são pastores de uma igreja picareta. Pagam e cobram inclusive o dizimo. Só que, por motivos obvios, a ficha não cai.

  2. Numeros crus mesmo vindos do MS não tem validade nenhuma. Para começo de conversa, existe um pessoal na saude que é militante pró-aborto, não teriam a minima vergonha de adulterar as cifras. Segundo, são numeros crus. Ha poucos anos em POA faleceu uma mulher numa clinica clandestina. Separou do marido, voltaram e logo em seguida separaram de novo. Ela tinha engravidado e resolveu tirar a criança no oitavo mes. Se tivesse sobrevivido e fosse detectado o procedimento iria para a cadeia na maior parte dos paises do mundo. O limite na maior parte do planeta são 12 semanas excluindo motivos medicos. Duas semanas de tolerancia por conta do erro do ultrassom. Mais ainda, os numeros dos abortos só aumentam apesar de anticoncepcionais serem disponibilizados pelos SUS (basta consultar um ginecologista) e o Sistema disponibiliza pilulas do dia seguinte que podem ser utilizadas até cinco dias apos a relação. Alás, custa perto de 20 reais e pode ser comprada sem receita medica em qualquer farmacia.

  3. Bukowski disse algo como ‘algumas pessoas gostam do que vc faz, outras odeiam o que vc faz, mas a grande maioria não dá a minima’. Quanto ao que decidirem em relação ao aborto para mim qualquer coisa esta bem. Simples assim, Politicos ficam inventando estas cortinas de fumaça e o principal, o que atinge a todos indiscriminadamente, não é pauta.

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