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É momento de autorizar a compra de vacinas por instituições privadas? – Por Michael Di Giacomo

“Devido à gravidade da situação, o ideal é que essa discussão nem existisse”

De forma tardia, em relação a inúmeras outras nações, sob muitas inquietações e desorganização por parte do governo federal, o Brasil iniciou a vacinação dos grupos prioritários contra a Covid-19. O ritmo ainda é lento, e tudo indica que será um longo caminho até que tenhamos um número satisfatório de pessoas devidamente imunizadas.

Nesses poucos dias de labor, em um país que é (era) modelo em termos de campanhas de vacinação, sobrou incapacidade de gestão na distribuição da vacina e gestores municipais a fazer vistas grossas aos “furas filas”. E, pasme, até prefeitos imunizando os próprios parentes, esposa ou filhos. É um escárnio.

Nada mais característico de um país de formação patrimonialista, onde muitos gestores ainda não respeitam os limites entre o público e o privado.

O cenário inicial fez com que tomasse força o debate em relação à autorização ou não, por parte do governo federal, para que entidades ou empresas privadas possam também comprar a vacina e, desse modo, contribuir com a imunização das pessoas que compõe o seu segmento.

Um dos resultados logo percebidos foi a autorização para que um grupo de empresas privadas brasileiras possam comprar um lote de 33 milhões de doses da Covishield, a “vacina de Oxford”. Uma das condições impostas foi de que a metade do lote deverá ser doado ao SUS.

Outras iniciativas estão a ocorrer, como no caso da Associação dos Juízes Federais do Rio Grande do Sul.  A entidade está a oferecer a vacina Covaxin, da Índia, para seus 185 juízes e familiares, ao custo de R$ 800,00, referente a duas doses.

Na OAB/Nacional, a Coordenação das Caixas de Assistência – Concad, por meio de seu presidente, anunciou que irá conversar com fornecedores de vacinas que não estejam concorrendo com o Poder Público. A ideia do dirigente é tratar da possibilidade de garantir a imunização à classe de advogados e advogadas.

Esse tipo de ação não é nenhuma novidade no cenário brasileiro.

Há muitos anos é possível, por exemplo, qualquer cidadão ir a uma clínica privada e se vacinar para prevenir o contágio por H1N1, e muitos outros vírus. As entidades ou empresas também dispõem a oportunidade aos seus colaboradores ou associados, algumas de forma gratuita, outras a um valor bem menor do que nas clínicas, como é o caso da OAB/RS.

No caso da vacina da Covid-19, o debate sobre a autorização ou não, ganha um fôlego bem mais intenso, pois o vírus é a causa de uma crise sanitária de proporções globais.

Não tenho dúvida que a vacina deve ser tratada como um bem de interesse público e que todos devem ter acesso ao processo de vacinação de forma ampla. Esse fato robustece a ideia de que, a vacinação em massa das pessoas, deve ter como principais responsáveis os governos das nações.

Nessa discussão há quem se coloque contra a compra das vacinas pela iniciativa privada, pois entendem que será criado uma espécie “apartheid”, onde a parcela hipossuficiente da população restará segregada, com imensa dificuldade de receber a imunização no tempo adequado.

Outros julgam que com a autorização a segmentos privados, o governo federal, e até mesmos os demais entes, não irão dispender os esforços necessários para atender a todos.

E seja qual for o caminho a ser perseguido, o resultado poderá nos levar a um imenso paradoxo.  Isso, pois, se realmente o governo liberar a compra por entidades privadas, nós corremos o sério risco de vermos uma parcela significativa da sociedade ficar cada dia mais distante do imunizante.

Por outro lado, oportunizar quem tem condições financeiras de pagar pela imunização também é uma forma de acelerar o processo e, com isso, talvez, seja possível termos um arrefecimento da pandemia. Será?

Devido à gravidade da situação, o estágio de forte contaminação que vivenciamos, o ideal é que essa discussão nem tivesse espaço e que o Estado realmente cumprisse sua obrigação com cada cidadão.

O fato é que vivemos no Brasil real.

Um país onde nosso governante máximo está mais preocupado em pescar, nadar, andar de motocicleta, xingar a imprensa, aliar-se ao bloco do centrão no Congresso Nacional, fazer pouco caso da tragédia que está a ocorrer na saúde pública de Manaus, do que realmente trabalhar pelo bem-estar da população.

(*) Michael Almeida Di Giacomo é advogado, especialista em Direito Constitucional e Mestre em Direito na Fundação Escola Superior do Ministério Público. O autor também está no twitter: @giacomo15.

Observação do editor: a foto que ilustra este artigo é uma reprodução da internet.

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3 Comentários

  1. Resumo da ópera: para uns o problema tem que ficar sem solução até que o Estado solucione. Este, no Brasil, apesar dos elogios irreais, tem histórico de morosidade e ineficiência. Bastante racional. Não foi mencionado mercado negro, desvios e vacinas falsas ainda.
    Vacinação ocorrerá, seja por qual meio, até que o problema da Covid deixe de ser público e torne-se um problema privado. Vide toxoplasmose na aldeia. Vide vacinação contra influenza na era pré-pandemia.

  2. Vacina num quadro pandêmico, na minha perra opinião, teria que ser para o maior numero de pessoas no menor período possível (obviamente existem limitações). Esta história de ‘apartheid’ com hipossuficientes segregados é coisa do pessoal que defende a luta de classes ( e Estado Máximo) e critica o capitalismo sem condições de entender como funciona, só sabe que tem que ser contra. Choca diretamente (não existe espaço destinado ao desenho nos comentários) com o conceito de ‘imunidade de rebanho’. Sem o desafogo do sistema de saúde as autoridades tendem a manter algum tipo de restrição, o que prejudica a economia. Sem falar no afastamento por doença (se inferior a 15 dias cai no bolso do empresário, atestado, falta de mão de obra, etc;), licença por falecimento, diminuição da produtividade e por aí vai.

  3. Tradicional encheção de linguiça para no final ‘sentar a pua’ no Cavalão. Como é inócuo pode continuar na toada.
    Um dos grandes problemas do Brasil (embora não seja só aqui) e que os ‘idealistas’ são burros. Pior, no dia em que estavam distribuindo neurônios (como diria o velho Aranha) dormiram até seis horas da tarde.
    Senão vejamos, muitas pessoas (geralmente as que só falam e produzem textos num confortável ambiente) acreditam que o Universo tem que se conformar a sua ideologia e/ou valores. O que acarreta diversas expectativas que, no devido tempo, são devidamente frustradas. Resumindo: os imbecis do ‘novo normal’ dão de cara com o ‘vacinei a mulher da minha vida’. Não seria problema se não fossem BMW (bitching, moaning and whining), ou seja, passam chorando as pitangas porque as coisas não são como querem. Querem que os outros dêem um jeito. Conclusão: idade mental de oito anos. Q;E;D.

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