Veja degradada. Inventa-se fato. Depois, procura-se quem respalde. Que tal?
Já está disponível o 16º artigo-reportagem da série escrita por Luis Nassif, em que ele mostra como Veja, a maior revista do país se transformou em qualquer coisa parecida com lixo editorial. Com manipulação das informações (quando não a própria invenção), para atender a interesses que não o do leitor. Quem sabe dos seus dirigentes, ou da própria empresa que a edita.
Neste último texto disponível, explica como o que já era criticável nos anos 80, quando tudo começou, virou uma compulsão da Veja: Definia-se previamente como seria a matéria. Cabia aos repórteres apenas buscar declarações que ajudassem a colocar aquele monte de suposições em pé. Leia mais, a seguir:
O método Veja de jornalismo
A degradação jornalística da revista Veja foi fruto de dois fenômenos simultâneos que sacudiram a mídia nos últimos anos: a mistura da cozinha com a copa (redação e comercial) e o afastamento dos princípios jornalísticos básicos.
Vamos analisar um processo de cada vez.
A copa e a cozinha
Os grupos de mídia sempre tiveram muitos interesses em jogo. Mas, para não contaminar as redações, se procurava tratar em âmbito das cúpulas das empresas. Sempre havia maneiras técnicas de vetar determinadas matérias que não interessavam, assim como conferir tratamento jornalístico a matérias de interesse da casa.
Como a avaliação é subjetiva e altamente hierarquizada, bastava o editor ou secretário de redação ou o diretor de redação alegar que a matéria não estava boa, para estabelecer-se um veto técnico – que faz parte dos usos e costumes de todas as redações.
Para administrar esse território delicado, as boas redações jamais prescindiram de comandantes fortes e competentes. Eram os avalistas do jornalismo perante a empresa e da empresa perante a redação. Eles não iam contra a lógica comercial, mas eram os radares, aqueles que informavam até onde se poderia avançar ou não no noticiário sem comprometer a credibilidade da publicação.
Apos a crise cambial de janeiro de 1999, o quadro começou a mudar. Apertos financeiros levaram gradativamente muitas publicações a abrirem mão de cuidados básicos, não só permitindo a promiscuidade entre a copa e a cozinha (redação e comercial), mas também em manobras de mercado. Quanto às manobras de mercado, deixo apenas registrado, porque não será tema dessa série.
Um episódio, no inícios de 1999, marcaria os novos tempos. Em 10 de março de 1999, em pleno escândalo das fitas do BNDES, a revista recebeu material demonstrando que a Previ tinha assinado acordo com o banco Opportunity, de Daniel Dantas, mesmo tendo sido desaprovado por sua diretoria. A matéria foi feita pelo repórter Felipe Patury (clique aqui).
“No início de fevereiro, um diretor do fundo, Arlindo de Oliveira, mandou uma carta ao presidente da Previ. São três páginas, e o tom é de indignação, expresso em frases que se encerram com três pontos de exclamação. Na carta, o diretor relata que a diretoria da Previ, reunida em julho do ano passado, decidiu que não faria parceria com o Opportunity no leilão das teles tendo de pagar ao banco 7 milhões de reais por ano de “taxa de administração”. A diretoria achou o valor descabido e decidiu só fazer o negócio se não tivesse de pagar a taxa. O estranho é que essa decisão foi ignorada. A Previ associou-se ao Opportunity na compra de três teles (Tele Centro Sul, Telemig Celular e Tele Norte Celular) e comprometeu-se a arcar com os 7 milhões de reais por ano, apesar da decisão contrária da diretoria.
Segundo a matéria, a Previ também havia entrado – sem autorização da diretoria – na operação de compra da Telemar que – na época – pensava-se que sairia para o Opportunity”.
Na semana seguinte, o repórter conseguiu mais material das suas fontes. Chegou a preparar a matéria. Na edição seguinte, de 17 de março de 1999, a matéria não saiu publicada. Mas, pela primeira vez, o banco Opportunity denunciado na edição anterior – bancou duas páginas de publicidade na revista…
EM TEMPO: o caso Veja, tratado com grande talento, e muita informação, por Nassif já está provocando uma reação da Editora Abril, que resolveu processar o jornalista. E também o chamado núcleo de comando da redação, Eurípedes Alcântara, Mário Sabino e Lauro Jardim. Em contrapartida, se expande na internet uma grande rede em torno do jornalista. São pelo menos 800 sítios (inclusive este, nem tão modesto) reproduzindo o trabalho. E mais: se você clicar veja no Google, por exemplo, encontrará com destaque, logo no comecinho, a série de artigos-reportagens de Nassif. Portanto, há uma clara adesão à leitura por parte dos internautas. Assim, de um lado, solidariedade ao excelente trabalho de Nassif. De outro, novos fatos. E, sobretudo, a disseminação do trabalho, algo que, modestamente, também estou fazendo por aqui.
EM TEMPO (2): é incrível que, embora fato da maior relevância, a mídia grandona (e a que se acha) está simplesmente ignorando o assunto, por mais rumoroso que é. Faz sentido, não?
SUGESTÃO DE LEITURA – Não deixe de ler aqui a íntegra do texto O método Veja de Jornalismo. No mesmo endereço você encontra todos os outros 15 capítulos já escritos por Luis Nassif, e que correspondem (com os que ainda virão) num verdadeiro inventário de uma revista que já foi a de maior credibilidade do país e hoje é um simulacro, para dizer o mínimo.
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