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Bolsonaro age como um comandante militar que ocupou um país estrangeiro – por Carlos Wagner

“O presidente não sobreviveria politicamente em um ambiente sem confronto"

Para o Presidente Jair Bolsonaro, os mortos pelo novo coronavírus são um efeito colateral (Foto Reprodução)

Um atalho para entender o Brasil dos dias atuais do governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Ele dirige o país como se fosse o comandante de uma tropa estrangeira de ocupação. E os acordos políticos que faz com os nativos têm como meta garantir o controle sobre o território conquistado.

A devastação que a pandemia causada pela Covid-19 vem fazendo é efeito colateral da situação. E não o resultado do negacionismo do presidente em relação ao poder de contágio e de letalidade do vírus que somente hoje (24/03) causou 3.158 mortes, somando um total de 290 mil. E também levou ao colapso, em 25 dos 27 estados, o sistema de saúde público e privado.

Centenas de pessoas estão morrendo por falta de vagas nas UTIs. Insumos para a intubação de pacientes estão em falta. Jamais os brasileiros viveram uma situação semelhante. A ideia desse atalho para entender a realidade não é minha. Mas de um velho pesquisador e historiador que conheci na década de 80, durante os conflitos agrários, e com o qual mantenho contato e recorro para entender situações complicadas, como a atual. Vamos à nossa conversa, aos fatos.

Hoje (24/03), os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco, da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Luiz Fux, e outras autoridades tiveram uma reunião com Bolsonaro, na qual foi articulada a formação de um comitê para enfrentar os efeitos devastadores da Covid-19.

Podem apostar. Pelo conhecimento que nós jornalistas acumulamos sobre a maneira do presidente agir, esse comitê só tem chance de funcionar se de alguma maneira fortalecer o poder da família Bolsonaro, que além do presidente inclui os seus três filhos parlamentares: Carlos, vereador do Rio, Flávio, senador do Rio de Janeiro, e Eduardo, deputado federal por São Paulo.

Se o comitê for contra os interesses da família, o presidente vai boicotá-lo. É simples assim, como diz o ex-ministro da Saúde, o general da ativa do Exército Eduardo Pazuello. Além de Pazuello, o presidente tem espalhado pela máquina administrativa do governo outros 6 mil militares. Nunca, nem mesmo durante a ditadura militar (1964 a 1985), houve tal efetivo no governo.

A respeito desse efetivo militar, o historiador me chamou a atenção para o seguinte. Mesmo os que ocupavam cargos de comando na tropa, como os generais que fazem parte do governo, receberam um treinamento que nada tem a ver com o cotidiano de uma administração civil. Eles não tem jogo de cintura.

Por exemplo. A aquisição das vacinas. Durante as negociações, eles foram incapazes de levar em conta que elas seriam a mercadoria mais procurada no mundo assim que estivessem à disposição. Isso aconteceu em agosto de 2020, quando a Pfizer ofereceu 70 milhões de doses da vacina ao governo do Brasil, que virou as costas para a oferta.

O mesmo aconteceu em outras compras de insumos, como as seringas. Não é por outro motivo que hoje a vacinação no Brasil acontece a conta-gotas. Quantas vidas estão custando a lentidão da imunização da população? Podemos afirmar que são centenas de vidas perdidas, encaradas como “efeito colateral” pelo presidente.

Aqui gostaria de chamar a atenção dos meus colegas, principalmente dos jovens repórteres na correria das redações, para o seguinte. Eu entendo que os jornalistas precisam tratar Bolsonaro com o ritual exigido pelo seu cargo. É do jogo.

Mas não é preciso exagerar. Ao ponto de comentaristas políticos sugerirem ao presidente como ele deve se comportar para o bem dos brasileiros, como, por exemplo, parar de incentivar a aglomeração de pessoas e de defender o tratamento preventivo com cloroquina – uma droga sem efeito sobre a Covid-19. Como comparou o historiador com quem falei: “O Bolsonaro é um comandante militar chefiando uma tropa que ocupa um país estrangeiro”.

O presidente Bolsonaro não sobreviveria politicamente em um ambiente sem confronto. Ele mantém o seu poder através dos conflitos. Nesses mais de dois anos de governo a sua administração tem pulado de conflito em conflito.

Um exemplo. Recentemente publicamos a notícia de que o novo ministro da Saúde, o cardiologista Marcelo Queiroga, vai visitar os hospitais para conferir se estão mesmo sendo registradas filas de pacientes com Covid-19 à espera de respiradores. E o Ministério da Saúde passou a exigir dos doentes de Covid-19 o número do CPF, o cartão do SUS e a nacionalidade. O motivo é a desconfiança do governo federal de que os governadores estão inflando os números de mortes.

Para arrematar a nossa conversa. A confusão causada pela política genocida do governo referente ao vírus serve de camuflagem para o baixo desempenho em todos os setores governamentais. Se não fosse essa confusão, a maioria dos ministros já teria sido demitida devido a sua inoperância técnica, incluindo Paulo Guedes, da Economia.

Até quando essa situação vai, eu não sei e duvido que alguém arrisque um palpite. Uma coisa é certa. O país só construirá uma saída do atoleiro em que está metido na questão sanitária e econômica quando começar a reconhecer que é impossível fazer qualquer coisa com o presidente do país torcendo contra e boicotando sempre que possível. Hoje existe o tempo no Brasil que é contado pelo número de mortos diários de vítimas da Covid-19. É simples assim, como diz Pazuello.

PARA LER A ÍNTEGRA, NO ORIGINAL, CLIQUE AQUI.

 (*) O texto acima, reproduzido com autorização do autor, foi publicado originalmente no blog “Histórias Mal Contadas”, do jornalista Carlos Wagner.

SOBRE O AUTOR:  Carlos Wagner é repórter, graduado em Comunicação Social – habilitação em Jornalismo, pela UFRGS. Trabalhou como repórter investigativo no jornal Zero Hora de 1983 a 2014. Recebeu 38 prêmios de Jornalismo, entre eles, sete Prêmios Esso regionais. Tem 17 livros publicados, como “País Bandido”. Aos 67 anos, foi homenageado no 12º encontro da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (ABRAJI), em 2017, SP.

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Um Comentário

  1. Comite, como todo comitê, é para inglês ver. Simples assim. Basta lembrar a duplicação da Faixa Velha aqui na aldeia. Prazo era dois anos ‘mas dá para fazer em um’ e foi formado um comitê de notáveis para ‘fiscalizar’ a obra. Prazo furou e o comitê sumiu.
    Quanto aos militares no governo, o que mudou na vida da população? Nada. Quando voltarem os civis vai acontecer a mesma coisa. Porque na administração pública há muito cacique para pouco índio. O que se ganha? Milicos tem que trabalhar. Probabilidade de desvios diminuem. Vermelhinhos não podem sabotar o funcionamento da máquina publica. Mudanças internas basicamente.
    Resto é mais do mesmo. Podem continuar repetindo. Não tem importância nenhuma.

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