Aglomerações – por Orlando Fonseca
“O vírus também adora uma. Aliás, ele não consegue se propagar sem uma”
É uma característica do ser humano aglomerar-se. Ainda quando promoviam encontros em cavernas, por necessidade ou por afinidades (genéticas ou afetivas), aglomeravam-se. O verbo que conhecemos em nosso uso diário (aliás, nunca se o mencionou como atualmente, embora para que se evite a ação indicada por ele), segundo a gramática, é transitivo direto e pronominal. Ou seja, tal regência verbal denota, justamente, a reciprocidade do ato: somos seres que se atraem uns aos outros.
Os romanos já se aglomeravam, tanto que o termo em português tem origem no Latim, usado por eles para falar de “juntar-se; reunir(-se), amontoar(-se), associar(-se). Ainda que os protocolos sanitários atuais o tenham colocado no âmbito semântico do restritivo, do evitável, não carrega em si algo pejorativo, desagradável, muito pelo contrário.
Aliás, a lei e os decretos existem justo porque é da natureza humana aglomerar-se, mesmo em caso de riscos para a vida. Agora, quando o STF decide que o direito à vida se sobrepõe à liberdade de culto, a reação dos crentes em geral foi de toda ordem. Inclusive por considerar como ofensa os ministros da Suprema Corte tratarem uma congregação como “aglomeração”. Ora, irmãos, menos, bem menos!
Acontece que o coronavírus também adora uma aglomeração. Aliás, ele não consegue se propagar sem uma. Isso devido ao fato de que o vírus não se espalha pelo ar, a não ser no caso de ser levado por gotículas da saliva, ou por aerossóis de um espirro de alguém contaminado. E, como a sua vocação avassaladora, está em se espraiar com velocidade, precisa de um ajuntamento humano.
É do caráter do vírus – se é que se pode dizer isso de um ser sem caráter, ou quando muito de mau caráter -, desde sempre, contagiar multidões. Quando o termo aglomerar-se se consolidou ainda na Idade Média, já se conheciam os efeitos de uma disseminação geral, de uma parceira deste, as bactérias.
A Peste Negra, e muitas outras pestes, foram uma festa para os microrganismos. Muito antes, lá pelos lados da Galileia e adjacências, um pregador já reunia multidões com seus sermões e milagres. Mas ele não condicionou a sua presença espiritual aos grandes grupos. Foi aquele Mestre quem disse, segundo o evangelista Mateus: “…Onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, aí estou Eu no meio deles.”
Por isso me surpreende a insistência de um grupo para fazer orações e celebrar a fé. O cristianismo, como se pode ver, não nasce dessa obrigação, e, para o seu fundador, a Vida tem um significado muito maior, no Livro Sagrado fala no corpo como “templo”, onde o Espírito Santo comparece sem que para isso o hospedeiro esteja em uma igreja. Tanto uma torcida de futebol, quanto crianças em sala de aula ou no pátio do recreio, ou ainda fiéis em uma paróquia são aglomerações.
E, o que todos precisam entender neste momento, é que o coronavírus não faz distinção. Não pensa – porque não pensa mesmo – que os gritos dos torcedores na hora do gol, ou os cantos sacros tenham frequências distintas capazes de espantá-los, ou de atuarem em sua consciência – porque não têm mesmo – para evitar a contaminação daqueles seres contritos por sua fé.
Por isso, não é possível distinguir uma festa clandestina de um culto, nos quais haja um ajuntamento de mais de três pessoas, pois se um apenas estiver contaminado, o Corona estará no meio deles. Um erro não deve ser usado para justificar um equívoco, e qualquer ajuntamento pode produzir um efeito deletério sem meios de interromper – é o que estão mostrando os números da pandemia.
Quando isso tudo passar, e a história humana mostra que tudo passa – ainda que seja para voltar pior – vamos nos aglomerar para celebrar a vida. No entanto, é bom ter em conta que só será possível para os sobreviventes.
(*) Orlando Fonseca é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela Da noite para o dia.
Observação do Editor: a foto que ilustra esta crônica é uma reprodução obtida na internet.
‘não é possível distinguir uma festa clandestina de um culto’, óbvio, culto de Dionisio, o Baco romano, tinha muita pegação e farto consumo de bebida alcoólica.
Uma neta vai para a festa e acaba matando o avô (e exilada da família). Sujeito atravessa o pais para visitar a família e acaba mandando dois irmãos para o cemitério. Filho resolve dar um abraço na mãe e depois de duas semanas na UTI ela parte para o além.
Com três casos concretos não é difícil imaginar que existem muitos mais. Inclusive no meio de pessoas que defendem lockdown nacional (e como as autoridades não tem como fiscalizar uns fiscalizam os outros, a la Alemanha Oriental).
Alguns podem se aglomerar para celebrar a vida no futuro. Só que não existe direito ao esquecimento. Acerto de contas não é algo a ser descartado.
Questão dos cultos no STF interessa uma minoria. Tem um fundo politico, esquerda ataca certos grupos religiosos com ramificações políticos (ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa) e, hipocrisia é o KY Gel das relações sociais, Crivella quando era ministro da pesca (???) do desgoverno Dilma, a humilde e capaz, era ‘bão’.
Igreja vem do grego, ekklesia, ‘assembleia de fieis’. Imbecis (do latim ‘in baculum’, sem suporte) da esquerda ‘control freak’, onde pululam ateus (que por voto até frequentam missa), viraram teólogos da religião alheia. ‘Deus está em todo lugar, é uma relação pessoal’, etc. Só para dar risada! Kuakuakuakua!