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Saudade da sala na nossa sala – por Bianca Zasso

“A abstinência de ir ao cinema pela qual ainda estamos passando é sofrida”

A saudade existe desde antes da pandemia. Só que se antes o que nos apertava o peito era o amigo que morava em outra cidade ou pais, agora é o do que mora até no mesmo bairro. Mudamos formatos. Em todas as áreas. Ler o jornal ou fazer uma chamada de vídeo pode piorar as coisas ou trazer alento.

No último domingo, a premiação mais badalada da indústria norte americana também mudou. O Oscar surpreendeu e, apesar de escolhas erradas na construção da cerimônia de premiação, mostrou que também sentiu a pandemia e seu impacto.

Entregar a estatueta de melhor filme antes da de melhor ator e atriz foi uma bola fora. Anticlímax total. Se fosse o roteiro de um filme, seria objeto de estudo sobre o que não se deve fazer. Problemas à parte, o Oscar da pandemia escolheu a sensibilidade e a crítica social ao premiar o ótimo Nomadland.

A cineasta Chloé Zhao entra para a história duplamente ao ser a segunda mulher a ganhar a estatueta de Melhor Direção e por ser a primeira oriental a vencer na categoria.

Um ano depois dos coreanos dominarem com Parasita, uma chinesa imprime seu nome na história do Oscar. E com uma trama que, apesar de universal, trata de um tema bastante caro aos norte-americanos.

As imponentes pradarias, cenário tão amado e impecavelmente filmado pelo mestre John Ford, ganharam aura de transgressão nas mãos de Zhao. Ao misturar atores e pessoas reais para falar de uma geração que trocou q casa hipotecada por um trailer e empregos temporários nada generosos, a diretora faz pensar sobre a crise financeira e também de identidade de pessoas que já passaram dos 50.

Mas também fala de família e de como ela não é mais uma instituição intocada ou lugar de redenção. Nunca foi, mas quase ninguém tocava no assunto. O mundo, os vizinhos, os desconhecidos podem ser um grande remédio para nossas “doenças”. Em crise estamos todos. E as imagens de Nomadland, mesmo que nos tirem o fôlego, também nos dão um tempo de respiro para cutucar nossas feridas. Dói, mas é preciso.

O discurso de Frances McDormand ao receber o seu terceiro Oscar deixa claro que não foram só os produtores que perderam na pandemia. Nomadland foi feito para ser desfrutado numa grande tela, na sala escura, com som de qualidade. A abstinência de ir ao cinema pela qual ainda estamos passando é sofrida.

Quem ama a arte e sabe que um filme merece uma sala de exibição está com aquela saudade que nos desloca do tempo. Parece que ir ao cinema é algo tão distante que limita as lembranças dos nossos momentos na sala escura. Está sensação, por um bom tempo, me assustou.

Agora, passado o Oscar e mantida a pandemia e seus problemas (Ainda mais sérios no nosso Brasil), consigo assimilar melhor. Quando voltarmos aos cinemas, será como na primeira vez. Mas com mais amor e cicatrizes.

(*) Bianca Zasso, nascida em 1987, em Santa Maria, é jornalista e especialista em cinema pelo Centro Universitário Franciscano (UNIFRA). Cinéfila desde a infância, começou a atuar na pesquisa em 2009. Suas opiniões e críticas exclusivas estão disponíveis às quintas-feiras – nesta semana excepcionalmente à sexta.

Observação do editora foto que ilustra este texto é uma reprodução da internet.

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Um Comentário

  1. Coluna ficou obviamente ‘nichada’.
    Oscar do ano passado teve recorde negativo na audiência. 24 milhões de espectadores. Este ano o recorde foi batido, 10 milhões assistiram a cerimonia. Comentarios dos próprios americanos, a maioria não assistiu as películas que estavam concorrendo.
    Critica social? Só vai na ‘missa’ quem quer. Vermelhice é um problema que se resolve sozinho.
    Estatueta para chinesa? Em letras garrafais, ‘precisamos acessar o mercado chines’. Mas com ‘critica social’ não rola. Há quem diga que não é um pais comunista por conta da liberdade de mercado em certas áreas (sem previdência social e sem muitos ‘direitos trabalhistas’). A falta de liberdade de expressão (vide empresários ‘tirando férias’), os campos de ‘reeducação’, a ‘grande muralha digital da China’), tudo isto não conta.

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