Donzelas Guerreiras 2. Antónia Rodrigues – por Elen Biguelini
A história (real) do “Terror dos Mouros” e que virou a “Cavaleira Portuguesa”
A primeira personagem real que apresentaremos será Antónia Rodrigues (*).
Nascida na cidade portuária de Aveiro, no norte de Portugal, em 5 de janeiro de 1572, Antónia não era aceita por seus familiares. Sua família era pobre, e morava fora das muralhas da cidade. Ainda jovem foi enviada para Lisboa por seus pais, onde passou a viver com uma irmã casada.
Mas o marido de sua irmã a maltratava e a menina observava os marinheiros que viviam na capital de Portugal com desejo de os acompanhar. Certo dia, após um abuso exagerado, trocou suas vestes por roupas de marinheiro e entrou escondida em uma caravela que partia com trigo para Mazagão. Tinha então 12 anos.
O grumete António Rodrigues percebeu que o mestre do barco em que estava havia roubado uma parte do dinheiro do trigo, então, resolveu se alistar como militar português naquela praça, no atual Marrocos.
Começou na infantaria, mas sua honra e habilidade eram tantas que em dois anos já subiu de patente. Ficou conhecido no período por suas habilidades militares, o que levou a ser convidado para participar dos salões e outras ocasiões sociais de Mazagão. Seu porte e sua educação, bem como seus diversos sucessos em batalhas, faziam de António um belo partido para diversas jovens da região. O militar era cobiçado como esposo de muitas.
Mereceu a fama de “Terror dos mouros” nos diversos campos de batalha do qual participou, sem em momento algum ter seu sexo biológico descoberto por seus colegas, visto que o que a atualidade concebe como individualidade e privacidade eram muito diferentes no período. Dormia com os outros militares, mas nunca sem tirar os trajes masculinos. Agia e portava-se como outros homens de seu grupo.
Foi um acaso que fez com que a sociedade descobrisse seu sexo biológico.
Das muitas conquistas que o jovem despertou na sociedade de Mazagão, uma jovem torna-se relevante para sua história. Era ela Beatriz de Meneses, filha de Diogo de Mendonça, um membro da alta fidalguia da região. Beatriz viu-se perdidamente apaixonada pelo antigo grumete e ficou doente de amores. Seu pai, para apaziguar o coração de sua filha, falou com António esperando que este se casasse com a filha.
Revelou-se, assim, Antónia. De “Terror de Mouros” tornava-se “Cavaleira Portuguesa”. Teve seu nome cantado por diversas vezes na história de seu país. Foi exemplo de honra feminina e masculina.
Ainda assim, após ter sido descoberta, teve que retornar a uma vida como mulher e não mais participar da guerra. Casou-se ainda em Mazagão com um jovem militar. Com este voltou a Portugal e teve um filho.
El-Rei do período, Filipe II de Espanha, honrou suas conquistas e sua imagem, e apresentou a ela e seu filho com uma mercê real. Ela acompanhou o rei à sua corte em Madrid, mas com a morte deste teve que retornar a Portugal.
Infelizmente nada mais se conhece da vida desta ilustre figura da história portuguesa.
Fontes:
“Historiador ‘corrige’ data de nascimento da “heroína de Mazagão” (entrevista). Diário de Aveiro. 2020
Barradas, Ana. Dicionário de Mulheres Rebeldes. Ela por Ela. Lisboa. 2006
Natário, Anabela. Portuguesas com História. Séculos XVI e XVII. Temas e Debates. Rio de Mouro. 2008
(*) LEIA também Donzelas Guerreiras 1: o mito – por Elen Biguelini (AQUI)
(**) Elen Biguelini é Doutora em História (Universidade de Coimbra, 2017) e Mestre em Estudos Feministas (Universidade de Coimbra, 2012), tendo como foco a pesquisa na história das mulheres e da autoria feminina durante o século XIX. Ela escreve semanalmente aos domingos, no site.
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