Rumo à extinção – por Marta Tocchetto
Sequência de dias com calorão na região Sul “testemunha que a volta veio”?
Tanto o homem destruiu, que a natureza clama: Chega! Chega! Será o processo de extinção da espécie humana?
Grande parte dos cientistas reconhece que o evento de extinção em massa dos dinossauros foi um asteroide que atingiu a terra, entretanto alguns admitem que as erupções vulcânicas tiveram papel crucial no fim da espécie, a qual já estava sendo afetada pelas condições climáticas.
A atmosfera com alta concentração de dióxidos de enxofre e de carbono foi responsável pela acidificação do planeta e pela alteração do clima. Com a similaridade da situação, impossível não ter pensamentos de fim do mundo, catastróficos.
O calorão que afetou a região sul do Brasil descrito como uma bolha que impedia a entrada de frentes frias desencadeou temores de fim dos tempos. As últimas semanas foram implacáveis em dar provas de temperaturas escaldantes extremas decorrentes das mudanças climáticas.
Tanto o homem destruiu, que a natureza clama: Chega! Chega! A sequência de dias com temperaturas acima dos 40 oC testemunha que a volta veio. Será o processo de extinção da espécie humana? O assustador é que o recado chega aos ouvidos de poucos.
A maioria faz ouvidos de mercador e pensa que a refrigeração vai resolver a situação daqui para frente. O problema não se resume, exclusivamente, às temperaturas elevadas. Ela é uma das consequências que nos afeta e nos desestabiliza de forma bastante direta. O calor excessivo causa uma sensação de moleza, desânimo, irritação – stress térmico.
No meio ambiente tudo está conectado. No meio ambiente tudo está interligado. As elevadas temperaturas estão intimamente relacionadas com a falta de chuvas. A falta de chuvas neste caso, não é um fenômeno natural, mas consequência do desmatamento, destruição das nascentes e da mata ciliar, assoreamento e poluição dos corpos hídricos, desperdício e mau uso da água, crise climática e tantas outras ações impactantes sobre os diversos ecossistemas.
A falta de chuvas afeta as reservas hídricas alterando, inclusive, o próprio ciclo hidrológico. A menor oferta de água afeta diversas atividades e a captação para abastecimento, desencadeando, em muitos casos, racionamento e escassez.
A agricultura não se desenvolve sem água. As plantas minguam e morrem. A pecuária e as criações não prosperam sem água. A produção de leite é afetada pela falta de pasto para alimentar os animais. A água é essencial para os seres humanos e para todos os seres vivos.
Somos formados em grande parte por água. Sem água, a sensação de calor se torna mais intensa e insuportável. Sem água não há produção de energia pelas hidrelétricas. Sem água é necessário buscar outras formas de geração, como as termoelétricas – energia mais suja e mais cara. Mais suja porque é mais poluente – sujam o ar que respiramos. Envenenam a água que tanto necessitamos. Poluem o solo.
A fonte, na maioria das vezes, são combustíveis não renováveis: carvão, gás natural e óleo. Estes combustíveis quando queimados geram metano e gás carbônico que são gases de efeito estufa que contribuem para a crise climática. Esta forma de energia também é mais cara porque a produção é mais onerosa.
Quem paga a conta ambiental e financeira pela troca? O cidadão. Energia mais cara representa desigualdade social. Isso quer dizer que amenizar as altas temperaturas com condicionador de ar é para poucos, ou seja, para aqueles que podem pagar.
As altas temperaturas tiram da invisibilidade a desigualdade que a cada dia se torna mais gritante no Brasil. As consequências são muito mais sentidas pelos que se encontram em vulnerabilidade social, ambiental e econômica.
A crise climática afeta além dos mais pobres, a natureza por inteiro e de modo implacável. A crise climática não será resolvida com ações pontuais, reativas e imediatistas. Exemplos se apresentam todos os dias. São enchentes na Bahia, em Minas Gerais, em São Paulo.
São vendavais, tornados, tempestades de poeira, temporais, deslizamentos de terra, estiagem intensa – fenômenos nunca anteriormente observados com tanta intensidade. Eventos que se tornam mais frequentes e mais comuns, provocando ainda mais exclusão, dificuldades econômicas e destruição ambiental.
Sem atuação na causa, as medidas apenas amenizarão as consequências que, fatalmente, ocorrerão novamente, em um ciclo interminável de desgraças. Se não mudarmos nossas atitudes individuais, o modelo de desenvolvimento vigente e as políticas públicas atualmente adotadas para o enfrentamento da crise climática estaremos, a cada dia, selando a extinção da raça humana. A terra seguirá seu curso como seguiu após era dos dinossauros.
(*) Marta Tocchetto é Professora Titular aposentada do Departamento de Química da UFSM. É Doutora em Engenharia, na área de Ciência dos Materiais. Foi responsável pela implantação da Coleta Seletiva Solidária na UFSM e ganhadora do Prêmio Pioneiras da Ecologia 2017, concedido pela Assembleia Legislativa gaúcha. Marta Tocchetto, que também é palestrante em diversos eventos nacionais e internacionais, escreve neste espaço às terças-feiras.
Nota do Editor. A imagem que ilustra este artigo é uma reprodução obtida na internet – sem autoria determinada.
Lembrei de uma musica do Casseta e Planeta, ‘Tributo a Bob Marley’. Parodiando, ‘Se os doutores daqui são assim, imagine na Jamaica’.