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Reinvindicações dos direitos da mulher – por Elen Biguelini

O tema que escolhemos para esta semana retoma uma autora já aqui apresentada, Mary Wollstonecraft. Esta filosofa é por vezes chamada de feminista e protofeminista, mas optamos ao invés disso de a chamar de precursora do movimento feminista, isto porque seu trabalho antecede e influencia os primeiros grupos a defenderem o voto feminino e, por consequência, a chamada primeira vaga feminista.

Em sua obra “Reinvindicações dos direitos da mulher”, Wollstonecraft faz um paralelo com as obras reclamando os direitos “universais” dos homens (as aspas se referem ao fato de esta universalidade ser exclusiva a figuras do sexo masculino, e brancas) e uma crítica direta a obra de Rousseau.

O grande filósofo Jean Jacques Rousseau influenciou toda a sociedade de finais de setecentos e todo oitocentos, mas sua obra tem como característica o olhar para as mulheres como criaturas inferiores a masculinidade, e incapazes de estarem a mesma altura intelectual que os homens. Mary Wollstonecraft se ofendeu fortemente com esta opinião, traçando então este tratado sobre as capacidades femininas.

Nota-se, que a autora não foi a primeira a reclamar o estudo e defender a capacidade intelectual feminina (Christine de Pizan e outras mulheres, assim como alguns homens já o haviam feito), mas é -junto à sua contemporânea francesa Olympe de Gouges- uma voz que alcançou a locais até então impenetráveis.
Seu texto é praticamente um guia de como educar mulheres para que estas possam atingir seu potencial e não ser observadas como seres débeis e incapazes.

Quando primeiramente lemos a obra, nosso contato foi através de uma tradução espanhola que apresenta um interessante termo: “juguete”. As mulheres são educadas para ser “joguetes”, jogos, entretenimento masculino. Era esta a opinião da autora sobre o que as jovens meninas inglesas aprendiam. Elas não existiam para si, mas sim para ´performar’ (lembramos aqui o conceito de Judith Butler da performance) como esposa e mão, como ser inanimado incapaz de compreender, falar ou pensar por si próprias.

Wollstonecraft era, claramente, fruto do tempo em que existiu, então a educação por ela definida como ideal não retira da mulher a obrigatoriedade de maternidade. A jovem menina deve ser educada a pensar por si própria (ou melhor, deve ser permitida a isso), mas também tem como imperativa a necessidade de fazer exercícios, para que seu corpo melhor receba a gravidez.

A autora critica diretamente todos os autores homens que afirmam categoricamente a incapacidade feminina. Ela própria, mulher, escritora, filosofa, sofrera o preconceito enraizado na sociedade que impedia a aceitação de uma mulher que pensasse. Fez duras respostas diretas àqueles que não percebiam aquilo que para ela era óbvio. A suposta incapacidade feminina de pensar era, na verdade, fruto de uma educação falha, voltada apenas para os “accomplishments” (os chamados dotes e prendas femininas) que serviriam apenas para melhor demonstrar a beleza, como se fossem uma peça de indumentária que pudesse ser colocada quando chegassem as visitas e retiradas em particular (quando então o adereço seria a própria mulher, objeto de desejo e descaso masculino).

O texto se tornou de grande importância para jovens mulheres que pretendiam ter uma opinião própria. Foi muito lido e muito debatido durante alguns anos, até que a biografia escrita pelo marido da autora veio a destruir a imagem de Mary Wollstonecraft, tornando-a pessoa non grata entre a “ton” e a boa sociedade inglesa do início do século XIX.

Embora muito lidas pelas sufragistas da segunda metade deste mesmo século, a imagem de “mulher perdida” e mãe de uma filha fora do casamento perseguiu sua obra e quase a apagou.

Felizmente foi recuperada. E atualmente seus textos existem em diversas línguas, ao alcance de todos os interessados em compreender a situação das mulheres em finais do setecentos.

Infelizmente, no entanto, muitos paralelos ainda podem ser feitos com a forma como alguns homens ainda consideram o sexo feminino com inferior.

Recomendamos a leitura da obra, para compreender a essência do pensamento da autora. Falamos brevemente aqui da importância deste texto, mas e apenas lendo as palavras desta filosofa que se pode compreender verdadeiramente a vida feminina no período.

“A Vindication of the Rights of Women”: https://www.gutenberg.org/ebooks/3420

(*) Elen Biguelini é doutora em História (Universidade de Coimbra, 2017) e Mestre em Estudos Feministas (Universidade de Coimbra, 2012), tendo como foco a pesquisa na história das mulheres e da autoria feminina durante o século XIX. Ela escreve semanalmente aos domingos, no Site.

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