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Ainda o tapa – por Orlando Fonseca

‘Onde falta a razão, sobra a estupidez’: uma das frases sobre o ‘fato’ do Oscar

No final das contas, foi um tapa na audiência o que o ator Will Smith desferiu em seu colega de profissão, o comediante Chris Rock. A sociedade do espetáculo, entre surpresa e excitada, se manifestou ora a favor de um, ora a favor de outro, como se a entrega do famoso Oscar se resumisse a uma sessão de pugilato.

Não é tão simples assim, ao longo da semana a cena de violência dividiu espaço com as notícias que nos chegam da guerra no Leste Europeu, ou seja, violência em variados graus. Tanto nas colunas sobre cultura e variedades, quanto nos debates na mídia e redes sociais, virou uma fofoca pandêmica, na qual a pergunta era: quem errou, o piadista, ou o marido ofendido? Pode parecer pouco, mas isso tudo diz muito sobre o mundo atual em que levamos nossas vidinhas pacatas.

O Oscar se constituiu, ao longo de suas 94 edições, na celebração máxima da arte cinematográfica. Há outros importantes festivais ao redor do mundo, mas este em especial ocupa mentes e corações, movimentando o mercado cultural como nenhum outro.

Os padrões atuais da “sociedade do espetáculo” se impõem de tal forma que o assunto mais comentado nos últimos dias – sexta passada ainda houve desdobramentos – não foi a lista dos vencedores, e sim o momento improvisado que só não se transformou em uma cena de pastelão, porque a seriedade dos fatos e a grandeza midiática dos envolvidos não permitiu. Um deles, inclusive, simplesmente ganhou o Oscar de melhor ator minutos depois das vias de fato (como a crônica policial costuma chamar a ocorrência).

O universo de coisas espetaculosas tem convivido já algum tempo com o “politicamente correto”, uma vez que, apesar da típica anarquia reinante neste terreno, era preciso botar um pouco de ordem no besteirol.

Foi a civilização que nos legou a ética e a urbanidade, para não falar em fraternidade, a qual forma o tripé, na sociedade moderna, com a igualdade e a liberdade. Ou seja, não é liberdade de expressão fazer de tudo o que pode ser engraçado uma piada ou ridicularização pública.

Há os que consideram isso uma chatice. No entanto, é importante salientar que a palavra tem um potencial ofensivo maior do que um soco, um pontapé ou um tapa na cara. Aliás, é bom guardar a densidade simbólica deste último.

No caso em tela – diriam os jurisconsultos – a comédia, antes da pequena tragédia, inicia com um profissional contratado para fazer o que fez: palhaçada (sendo um tanto redutor, reconheço). Não se trata, portanto, de uma questão pessoal, os envolvidos não estavam em uma rodinha de amigos, na qual as ofensas pessoais, são isso mesmo, pessoais.

Chris Rock errou feio por razões humanitárias, pois as mulheres não merecem um tratamento desses, da mesma forma (o que se tornou um agravante no caso): nenhuma pessoa deve ser ridicularizada em razão das sequelas de uma doença como a alopecia.

Por outro lado, de cabeça quente, Smith errou ao dar um tapa no rosto do apresentador. Mesmo que tivesse alguma razão, perdeu-a com aquele revide violento e rasteiro. Ao pedir desculpa, falou que o “o amor leva você a fazer coisas loucas”, mas isso não é sobre amor, Smith, e sim sobre afirmação machista.

A piada foi realmente grosseira e infeliz, e reagir em defesa da pessoa amada está nos conformes, entretanto, poderia ser com palavras, com uma atitude de desagravo, como se levantar e sair. Quem tem amor no coração não bate em ninguém porque se coloca no lugar da companheira ofendida. Onde falta a razão, sobra a estupidez.

A figura em destaque em tudo isso foi um colega do ator, que tentou acalmar o amigo com palavras sábias. Ao pedir desculpas pelo ocorrido, Will Smith, emocionado, citou-as, após receber o Oscar pela atuação em “King Richard – Criando campeãs”:

“Em seu momento de maior grandeza, tome cuidado. É nessa hora que o Diabo irá te procurar’”. Foi tudo no improviso, mas eu daria o Oscar, ou uma réplica do Nobel da Paz, para Denzel Washington, que espantou com um tapa de luva a irracionalidade reinante.

(*) Orlando Fonseca é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela Da noite para o dia.

Nota do Editor. Na imagem do alto desta crônica, a reprodução em fotos das “vias de fato” comentadas pelo autor.

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6 Comentários

  1. Chris Rock pediu desculpas a uma das apresentadoras da cerimonia antes de sair. As ancoras eram tres mulheres, duas afrodescendentes e uma branca. Equipe de produção era toda (ou quase) de afrodescendentes. Comediante ficou incomodado porque tudo isto ficou lá pelo terceiro plano depois do tapa. Denzel Washington tem opiniões que para muitos militantes são consideradas conservadoras. Uma articulista americana do The Guardian, Tayo Bero, escreveu uma coluna de opinião afirmando que ‘a indignação branca a respeito do tapa de Will Smith tem raizes na anti-negritude; é desigualdade em plena vista’. Cita outros casos como se mais de um erro resultasse em acertos. Alás, ator (mexicano) que fez o papel do medico no flme ‘Ali’ disse que foi maltratado por Will e teve o papel reduzido por conta dele, ou seja, ha mais esqueletos no armario. Apesar disto, não deve perder o premio. Deve curtir um bom tempo na geladeira, mas, levando em conta outros casos, volta. Resumo da opera: o caso só se aproveita para observar a atitude dos tupiniquins. Muita gente ‘passando pano’ para o agressor. Tudo muito ‘humano’. Hipocrisia do primeiro ao quinto e invertido.

  2. Oscar é muito mais uma ferramente de marketing hoje em dia. Os premios tem pouco a ver com talento, tem muito mais a ver com rede de contatos e politica. Will Smith teria feito lobby por muito tempo para ganhar (como Leonardo Dicaprio). Alás, a ideologia tomou conta da produção audiovisual americana. A ‘mensagem’ é batida na cabeça da audiencia como se fossem um amontoado de retardados. A ‘jornada do heroi’ virou coisa da Globo. Muita coisa mal feita com a ideologia certa muito elogiada pela critica. Muita propriedade intelectual sendo ‘atualizada’, com substituição de personagens (homens são trocadas por mulheres, caucasianos trocados por afrodescendentes, latinos e asiaticos). Não seria problema se as historias fossem boas, mas quase invariavelmente o roteiro não para em pé. Alguns culpam uma nova geração de roteiristas. Demitiram os antigos que eram caros e contrataram mais novos mais baratos. Formados há pouco tempo em faculdades onde a esquerda domina. Esta batendo no bolso, o pendulo deve voltar. Obviamente há exceções. Obra de Isaac Asimov, Fundação, virou serie. Um dos personagens era homem. Virou uma jovem negra. Alas, a serie é uns 10% parecida com o livro. Escalaram uma atriz britanica, muito bonita e que sabe atuar. O elenco é particularmente bom e apesar das mudanças a historia é boa. Até um ator meio brasileiro está na serie, Alfred Enoch (deu entrevista em podcast aqui no Brasil junto com Lazaro Ramos noutro dia). Resumo da ópera é simples, ninguém é obrigado a gostar de alguma coisa por conta da ideologia que alguns tentam impor.

  3. Will Smith tem um casamento aberto. O minimo que chamam ele hoje é ‘cuckhold’, equivalente ao ‘corno manso’ tupiniquim. Virou assunto nacional. Comediantes cerraram fileiras, um dos mais famosos afirmou que qualquer um da classe que não criticasse o ator podia dar adeus à carreira. Teatros colocaram placas na frente defendendo a primeira emenda. Uma comediante subiu no palco e disse que ‘Will Smith deveria ganhar o Oscar por fingir não ligar para os namorados da esposa’. Ricky Gervais disse que não faria piada com o cabelo, mas com os namorados. Chris Rock foi muito elogiado pelo profissionalismo. Poderia ter sido pior. A policia de LA foi até a cerimonia, falou com ele. Se ele prestasse queixa eles interromperiam a cerimonia para prender o ator. Não quis prestar queixa. Whoopi Goldberg afirmou, depois retratou-se (não importa, esta gravado), que a segurança não retirou o agressor porque teriam que interromper a cerimonia e depois ficar uns 20 minutos explicando porque um ator negro foi conduzido para fora minutos antes de ganhar um dos premios principais.

  4. Will é uns bons 10 cm mais alto e 20 Kg mais pesado do que o outro humorista. Deu o tapa e virou as costas, ou seja, sabia que batia em quem não tinha como revidar. No discurso falou que era ‘protetor’ (algo que algumas definiram como machista). No outro dia soltou uma nota nas redes sociais pedindo desculpas a Chris Rock (no discurso da premiação só se desculpou com a Academia). Nota obviamente escrita por um(a) RP e um(a) advogado(a). Não colou. Deu uma declaração afirmando que iria fazer terapia porque estava traumatizado porque aos 9 anos teria visto o pai bater na mãe. Não colou. Papel de vitima com a consulta ao medico já com diagnostico na mão. Pediu demissão da Academia, mas ainda pode ser punido. Varios filmes que estavam em estagios diferentes de produção foram para a gaveta, ou seja, muita gente perdeu grana.

  5. Oscar é uma cerimonia chata. Nos Golden Globes escolheram em algums anos Ricky Gervais, humorista britanico, que detonou Hollywood nas piadas. Piada de Chris Rock foi leve. Ele não sabia da condição da mulher de Will, improvisou. Viu o vestido verde e fez a conexão. Mulheres raspam a cabeça por motivos esteticos, foi moda na época do filme ‘Black Panther’ até. A guarda pessoal do personagem pessoal é toda de mulheres com cabelo raspado. Não é a primeira piada envolvendo as mesmas pessoas. Anos atrás aconteceu um boicote a cerimonia porque não havia afrodescendentes indicados. Chris Rock subiu no palco e falou que Jada boicotar o Oscar era o mesmo que ele boicotar as calcinhas da Ryanna, nenhum dos dois tinha sido convidado. Ou seja, a calvicie é só desculpa. Chris Rock sofreu bullying na escola, algo que beirou o estupro. Não fica utilizando como desculpa.

  6. Para variar existe uma assimetria de informação entre os tupiniquins e os ianques. Primeiro a cultura ‘woke’ por lá, um movimento messianico de esquerda que combate o racismo, apoia o pessoal do Alfabeto, apia a inclusão, combate a desigualdade social, etc. O que tem errado nisto? O ‘messianico’. Causa problemas inclusive para as causas que defendem. Não é monopolio ianque por aqui também existem, só não têm rótulo em portugues ainda.

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