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Câmara de gás – por Orlando Fonseca

O assassinato de Genivaldo e a relação com a ação dos nazistas

Dentre os que negam ter havido, durante a Segunda Guerra, o genocídio conhecido como Holocausto, há os que, diante da constância ideológica típica dos negacionistas (por simpatias com os princípios nazistas e fascistas, por similaridade), consideram que o arianismo – e sua parente atual, a supremacia branca – permite tomar medidas que estão acima da razão e da moral dos mortais comuns.

Com isso, os inimigos (no caso, os não caucasianos, os judeus, os ciganos, os comunistas e os homossexuais) podiam ser eliminados para o bem da nação. Mas há, também, os que negam porque, simplesmente, mesmo diante das evidências históricas, não acreditam que a maldade humana pudesse atingir tal requinte de crueldade.

Pois então, semana passada, uma ação de policiais brasileiros perpetrou, diante dos olhos de todos, uma ação violenta contra um cidadão comum, a qual contém todos os predicados daqueles eventos macabros do holocausto nazista.  

Em uma abordagem, que deveria ser rotineira, a Polícia Rodoviária Federal submeteu um motociclista, rodando sem o capacete, com uma excessiva força e com métodos de tortura, captados pelas lentes de celulares de populares nas imediações. Genivaldo de Jesus, que não esboçou a intenção de escapar da ação policial, em vista de seus problemas de saúde reagiu aos atos violentos, como é natural.

Foi algemado, colocado na viatura e exposto, naquele recinto fechado, à ação de uma bomba de gás. Mesmo diante dos apelos do rapaz, que estava se asfixiando, mesmo diante dos apelos dos populares no entorno, os policiais mantiveram a ação, até que Genivaldo, por estar desfalecido, não opôs mais resistência.

Em nota oficial, a PRF de Sergipe anunciou que usou a força necessária para conter o indivíduo, e que ele teve uma morte súbita. A nota inclusive parece ironia, ao afirmar que “usou técnicas de menor potencial ofensivo em abordagem”.

O laudo do Instituto Médico Legal, entretanto, não deixa dúvidas, ao indicar a causa da morte, inegável, diante dos fatos registrados em imagens chocantes, que circularam pela imprensa mundial: asfixia mecânica e insuficiência respiratória aguda.  

Não foi uma circunstância normal, embora nosso país esteja marcado por este tipo de violência estatal, diante das entidades dos direitos humanos pelo mundo. Mas esboça um método. E foi o mesmo utilizado pelas forças nazistas, na ação que Hitler havia indicado como a “solução final”.

Para que a Alemanha recuperasse a sua glória, perdida na Primeira Guerra, era preciso eliminar inimigos. Só entre judeus foram 6 milhões, sendo que um grande número foi torturado nos campos de concentração, e assassinados em câmaras de gás.

Nos julgamentos que se seguiram ao final da guerra, com a derrota do nazismo, oficiais e participantes daquele genocídio foram condenados, mesmo que não se apresentasse a ordem direta de que efetivassem os atos de eliminação de civis. Uma vez que todos compartilhavam a ideologia da dominação ariana. É o que dá ser governado por um político com transtornos mentais.

Nas manchetes veiculadas por grandes redes internacionais, foi lembrada a morte por asfixia de um cidadão negro americano, há exatos dois anos. George Floyd também foi abordado por uma polícia racista, que o submeteu a um violência sem explicação, e mesmo diante de seus apelos, foi sufocado até desfalecer.

Por aqui, é notícia diária que pretos e pobres trabalhadores, estejam em risco constante, resquício de um Brasil escravocrata. Tal situação é sintomática de uma abolição mal resolvida, mesmo passados 134 anos. É uma obviedade dizer que a polícia é um aparelho do Estado para proteger o cidadão, que lhe paga os salários, através dos impostos.

Mas é preciso repetir esta platitude, diante de chacinas, como a que que vimos recentemente no Rio de Janeiro. Ação de uma polícia mal preparada, e inclusive com a formação das milícias, algumas com proximidade demasiada com familiares do alto escalão da República.

Enquanto isso, um maioral da república participa de mais uma motociata, galhardamente, sem capacete, acompanhado de uma horda de negacionistas.

(*) Orlando Fonseca é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela Da noite para o dia.

Nota do Editor. A imagem (de Reprodução), que ilustra esta crônica é da ação e abordagem dos policiais rodoviários federais e que resultaram na morte, por asfixia, de Genivaldo Genivaldo de Jesus Santos, de 38 anos, na úlitma quarta-feira, 25. Agentes admitiram que usaram spray de pimenta e gás lacrimogêneo dentro de viatura.

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5 Comentários

  1. E, finalmente, óbvio, não foi só a falta de capacete. Não altera o resultdo judicial. Não saberemos o que passou na cabeça dos policiais, os advogados irão tomar conta do caso. Fica a pergunta, em qual realidade alternativa o que aconteceu não iria dar m.?

  2. A insignificancia é evidente, com pessoas mais proximas o resultado seria outro, mas ‘milícias, algumas com proximidade demasiada com familiares do alto escalão da República’ lembra o artigo 144 do CP. ‘Se, de referências, alusões ou frases, se infere calúnia, difamação ou injúria, quem se julga ofendido pode pedir explicações em juízo. Aquele que se recusa a dá-las ou, a critério do juiz, não as dá satisfatórias, responde pela ofensa.’

  3. Rio de Janeiro é um caso perdido. Comando Vermelho veio do roubo a banco e depois foi para o trafico. Na hierarquia do crime, assaltante de banco ocupam o topo da cadeia alimentar. Orgulham-se de enfrentar a policia. Comando Vermelho no RJ já foi até considerado uma seita. Informação mais relevante do caso recente de cancelamento de CPF’s (quem não gostar pode ficar não gostando) é a presença de vagabundos do Nordeste e da região Norte. Indicio de uma organização existente ou em vias de se formar. Se o que acontece no RJ se espalhar (já existem areas semelhantes em muitas partes) ainda mais vai ficar dificil para a segurança publica.

  4. Obviamente a atividade policial, que materializa o ‘monopolio’ estatal da violencia é sujeita a excessos. Pegar casos isolados e generalizar é truquezinho velho. Anos atras (caso Tatiane Spitzner) um professor universitario jogou a esposa do quarto andar de um predio. Não é por isto que se poderia afirmar que ‘todos os professores universitarios são machistas, patriarcais e misoginos’. Mais do que óbvio. Existem perto de meio milhão de policiais no Brasil somando as diversas categorias.

  5. Cascata. Obvio que foi uma barbaridade, mas foi registrada e os policiais serão condenados por homicidio qualificado alguma hora, fim da historia. Holocausto foi movido por motivos outros. O resto é exagero risivel para fins eleitorais. Existe um problema de fundo que foi a distribuição de instrumentos de menor potencial ofensivo distribuidos para controle de pequenos disturbios sem treinamento condizente. A vitima mal pode ser considerada parda, basta ver a foto da criatura (não o poster utilizado na propaganda). George Floyd era negro, americano e num contexto diferente.

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