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Mais que uma estimativa – um recado climático – por Marta Tocchetto

Estudo aponta: “o Brasil é 7º maior emissor mundial de gases de efeito estufa”

A estimativa recentemente divulgada é uma importante ferramenta para os governos buscarem soluções para reduzir os impactos das emissões dos gases de efeito estufa.

O fenômeno das mudanças climáticas está no rol dos principais problemas ambientais contemporâneos. A elevação da temperatura do planeta é decorrente do aumento de concentração dos gases de efeito estufa (GEEs). O efeito estufa é um fenômeno natural e é responsável por manter a temperatura ideal para vida na Terra. Como ele acontece? 

Os gases de efeito estufa presentes na atmosfera absorvem a radiação do sol e emitem parte dela para a superfície da Terra na forma de calor, outra parte volta para o espaço. Assim, se mantém o equilíbrio de energia. Os principais GEEs são o gás carbônico (CO2) e o metano (CH4).

Quando a concentração desses gases aumenta há uma maior absorção de radiação, intensificando o calor retido junto à superfície. A consequência é o aumento de temperatura. Esse fenômeno é responsável pelas mudanças climáticas, ou seja, quanto maior for a concentração dos gases de efeito estufa na atmosfera, maior é a elevação da temperatura da Terra. Situação que, em se mantendo, poderá tornar a vida humana inviável e o Planeta inabitável.

No dia 13 de junho, semana passada, o Observatório do Clima divulgou a estimativa de emissão de gases de efeito estufa de 5.500 municípios brasileiros. A nova edição se baseou em dados de 2019 obtidos junto a diversos relatórios governamentais, centros de pesquisa, entidades setoriais e organizações não governamentais. Os resultados retratam as diferentes situações considerando as principais fontes de emissão: agropecuária, energia, mudanças de uso da terra, processos industriais e resíduos.

O Brasil é 7º maior emissor mundial de gases de efeito estufa, demonstra a estimativa. A região Norte, mesmo sendo a menos populosa, contribui com 60% do carbono liberado. Esse dado guarda um grande antagonismo, pois é onde se encontra a maior floresta tropical do mundo e as árvores têm a capacidade de, por meio do processo de fotossíntese, absorver o gás carbônico e liberar o oxigênio. O oxigênio tanto quanto a liberdade é essencial para a existência humana.

O crescente desmatamento, a destruição da floresta, as queimadas e o avanço das atividades agropecuárias e de mineração decorrentes da invasão de terras indígenas, públicas, unidades de preservação e de conservação são as principais causas para que o importante serviço ambiental da floresta ocorra em direção oposta, resultando em um desserviço ambiental.

A presença de três municípios gaúchos entre os maiores emissores, também chama a atenção. São: Porto Alegre, Candiota e Alegrete. Apesar da contestação por parte das prefeituras e de outros setores envolvidos, a estimativa deveria ser interpretada como uma oportunidade para buscar alternativas de baixo carbono, considerando a situação catastrófica para qual nos direcionamos. 

O aparecimento de Porto Alegre no rol é atribuído à geração e à destinação dos resíduos urbanos, também dos efluentes líquidos domésticos e industriais. Compostos orgânicos ao se decomporem, independente da destinação, adequada ou inadequada, geram CO2 e CH4. O metano gerado em grande quantidade nesses processos provoca um impacto sobre o clima, 25 vezes superior ao causado pelo gás carbônico. 

A solução para a capital gaúcha é tornar mais eficiente o gerenciamento tratando os resíduos orgânicos, em vez de simplesmente, enviá-los para aterros, além da ampliação do sistema de tratamento de efluentes impedindo o lançamento direto nos corpos hídricos. Sistemas de captura de GEEs devem estar associados aos tratamentos e aos aterros para, além de possibilitar o aproveitamento energético, equilibrar o balanço ambiental dos processos em relação às alterações do clima. Reorganizar a coleta seletiva também faz parte do conjunto de medidas a serem implantadas.

Candiota é conhecida pela mineração de carvão e pelas termoelétricas que usam esse mineral como combustível para geração de energia elétrica. O carvão é uma fonte energética não renovável, altamente poluente. É um combustível sujo que durante a queima gera, além de gases de efeito estufa, emissões ácidas, poeiras e outros compostos tóxicos, muitos destes, responsáveis pela ocorrência de inúmeras doenças respiratórias e cânceres, sem contar os graves impactos ambientais.

Estudos científicos questionam a eficiência dos sistemas de abatimento e de retenção dos poluentes oriundos do carvão. A tendência mundial e a necessidade urgente para controlar as alterações do clima indicam abdicar do carvão e do petróleo, partindo-se para fontes energéticas mais limpas como, energia solar, eólica, hidrogênio verde, energia das marés e biomassa.

A causa para a presença de Alegrete na estimativa está na produção agropecuária e no plantio de arroz. A fermentação entérica que ocorre durante a digestão da matéria orgânica pelos animais gera altas concentrações de metano. Modificar e melhorar a alimentação para reduzir a emissão, ou seja, os “puns” decorrentes do processo de digestão é uma alternativa. Ao encontro da redução de emissão está também, diminuir o tamanho do rebanho e o consumo de carne. O movimento mundial “Segunda sem carne” tem como objetivo chamar atenção para o problema e incentivar menor ingestão de carnes, em especial as vermelhas.

O reaproveitamento da biomassa da casca de arroz para geração de energia e a incorporação das cinzas dessa queima na fabricação de vidro – projeto da Universidade do Pampa (UNIPAMPA Alegrete), universidade pública – são alternativas que se direcionam ao mesmo propósito, redução das emissões de gases de efeito estufa.

Avaliar as atividades e as técnicas adotadas é decisivo em direção à redução do avanço das mudanças climáticas que fragilizam a economia, aumentam as desigualdades sociais e destroem o meio ambiente. Cabe aos diferentes setores, à sociedade em geral e aos governantes buscarem e incentivarem políticas públicas resilientes às mudanças climáticas.  

(*) Marta Tocchetto é Professora Titular aposentada do Departamento de Química da UFSM. É Doutora em Engenharia, na área de Ciência dos Materiais. Foi responsável pela implantação da Coleta Seletiva Solidária na UFSM e ganhadora do Prêmio Pioneiras da Ecologia 2017, concedido pela Assembleia Legislativa gaúcha. Marta Tocchetto, que também é palestrante em diversos eventos nacionais e internacionais, escreve neste espaço às terças-feiras.

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4 Comentários

  1. Sistema estadual de universidades paulista produz 80% da pesquisa no pais. IFES tentam pegar carona com o papinho ‘universidades publicas’. No inicio da decada de 90 o professor Geraldo Isaia terminou o doutorado na USP, tese era sobre incorporação da cinza da casca de arroz no cimento. Residuo até produz bastante calor, mas depende de safra, dos produtores não trocarem de cultura (irem para a soja por exemplo), processos de produção geralmente involvem refinamentos, etc. Resumo é que a academia está pisando barro para fazer tijolo. Mudanças na alimentação é sonho de uma noite de verão. Objetivo é tornar emissão zero no saldo. Problema não é nos ‘puns’ (alguns pensam em ‘peido’, gross, disgusting, tragam os meus sais!), ruminantes tem o estomago dividido (biologia de segundo grau, ao menos na epoca do segundo grau). As bacterias nos estagios iniciais ‘quebram’ o alimento para que possa ser digerido, é a maior fonte de metano. Resumo da opera é simples, o assunto não é, governantes devem ter cuidado para que as ‘politicas publicas’, o pó de pirlimpimpim, de hoje não vire a c@g@d@ de amanha.

  2. Energias ‘renovaveis’ tem problemas. No teto das casas, mesmo com a queda dos preços, é antieconomica, Fora de grandes usinas é problematico. Na Espanha algum governo deu incentivos e subsidios para agricultores instalarem pequenas usinas nas propriedades rurais (politica publica, a panaceia que tudo resolve). Muda governo, aperta o sapato, cortam os subsidios e os campesinos se ferraram. O que recebem pela energia não paga a manutenção ou cobre os proprios custos de energia. Usinas estão abandonadas majoritariamente. Sem falar na poluição. Paineis solares poluem muito quando são fabricados. Também são pouco reciclaveis. Como as pás dos grandes geradores eólicos. Baterias dos carros eletricos idem. Há que se debater a energia nuclear. O lobby das petroleiras já começa a atuar fortemente nos EUA, ‘o petroleo garante a locomoção do povo americano e é simbolo da nossa liberdade’. Poluir virou questão de patriotismo.

  3. Depois o truquezinho dos numeros. Emissões da China são mais de 30 vezes maiores do que as brasileiras. Americanas são mais de 3 vezes maiores. As da Comunidade Europeia (area semelhante) mais que o dobro. Numeros de 2018. Daí entra-se na velha discussão, paises desenvolvidos conseguiram um padrão de vida muito bom para suas populações poluindo. Terceiro mundo tem que ficar na m. para não destruir o planeta? Sem falar nas c@g@d@s de politicos. Alemanha queimava carvão (um vermelho, muito mais poluidor) começou a mudar a matriz energetica para renovaveis. Veio Fukushima e resolver acelerar a desativação de usinas nucleares. E comprar energia da França, produzida em….usinas nucleares. Para resolver resolveram comprar gás da Russia, deu no que deu. Ainda voltaram a queimar carvão. Provavelmente os numeros da emissão da Europa aumentaram.

  4. Site do Observatorio do Clima, primeira manchete, ‘Fracassa reunião para definir agenda da COP2027’. Outra que chama atenção ‘Lei Europeia na direção certa, necessita melhorias, dizem as ONG’s brasileiras’. Ou seja, organizações ‘não governamentais’ (depende do governo de plantão) defendem regras mais rigidas para o banimento de commodities produzidas com desflorestamento. Não importa que o atual Codigo Florestal, produzido durante o governo petista, preveja 80% de reserva legal na Amazonia com a parcela restante podendo ser utilizada.

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