A falsa simetria política – por Leonardo da Rocha Botega
“A polarização não é entre duas faces de autoritarismos”, explica o articulista
Desde as eleições de 2018, após a implosão da disputa política entre o Partido dos Trabalhadores e o Partido da Social Democracia Brasileira, que marcou o cenário eleitoral brasileiro nas últimas duas décadas, setores da grande imprensa têm insistido na tese da “nova polarização simétrica”. Segundo essa tese, a disputa política pós-2018 seria caracterizada pela polarização entre o petismo e o bolsonarismo, dois extremos de uma mesma face marcada pelo populismo e o autoritarismo.
Em que pese a correspondência de tal tese com um recorte de realidade, qual seja o inegável potencial de mobilização dessas que são as duas principais forças políticas do Brasil atual, falar que há simetria entre elas é falso e, ouso afirmar, intelectualmente desonesto. É falso porque a natureza de ação e os objetivos políticos são distintos. É intelectualmente desonesto porque esconde a responsabilização pelo cenário atual de muitos daqueles que a construíram.
As diferenças da natureza de ação do petismo e do bolsonarismo remetem a suas próprias raízes históricas. O Partido dos Trabalhadores nasce na conjuntura da redemocratização a partir de três grupos políticos: o novo sindicalismo originário das greves do ABC paulista, as Comunidades Eclesiais de Base e as tendências socialistas alternativas às experiências do socialismo real.
Do novo sindicalismo, o PT herdou o pragmatismo das negociações entre patrões e operários; das CEBs, a preocupação com uma política comunitária e dialógica; das tendências socialistas, uma concepção moral e abstrata de um socialismo petista. Tal concepção se materializa em 1989 em um programa reformista forte que tinha como um dos pilares a adoção de mecanismos de democracia direta como o orçamento participativo, adotado em algumas administrações municipais petistas eleitas em 1988. Durante os governos Lula e Dilma, como bem escreve André Singer, esse reformismo forte foi substituído por um reformismo fraco que garantiu melhorias sociais para os excluídos sem que houve mudanças estruturais.
As raízes do bolsonarismo, por sua vez, podem ser buscadas na extrema-direita militar herdeira das concepções do general Sylvio Frota, ex-ministro do Exército do governo Ernesto Geisel. O general Sylvio Frota, ao longo do período da abertura política, liderou o grupo militar que se opunha à redemocratização, chegou inclusive a conspirar visando a derrubada do próprio presidente.
Foram seus correligionários que organizaram o fracassado atentado do Riocentro em 1981. Desde que emergiu no cenário político, Jair Bolsonaro sempre reivindicou a herança dessa extrema-direita militar crítica à redemocratização, tendo inúmeras vezes criticado Ernesto Geisel e elogiado Sylvio Frota.
Durante os governos Lula e Dilma não houve nenhuma tentativa por parte do petismo de forçar uma mudança na frágil democracia brasileira. Houve inclusive o fortalecimento de mecanismos de controle social das políticas públicas através dos Conselhos e das Conferências que as discutiam. Houve limites obviamente, entre esses o abandono da criativa ideia do orçamento participativo nacional e a aposta nas composições com a política tradicional.
O mesmo não pode ser dito do governo Bolsonaro. Desde de janeiro de 2019, o presidente tem constantemente feito declarações e criado situações que tencionam a democracia brasileira. São exemplos dessas situações os permanentes ataques a imprensa, as saudações oficiais ao período da Ditadura Civil-Militar, o enfrentamento constante aos governadores de oposição e aos ex-aliados que discordam de suas posições, o enfrentamento com outros poderes, sobretudo, com o poder judiciário, as tentativas de aparelhamento das instituições de Estado como o exército e a polícia federal, bem como, a suspeição das urnas eletrônicas, método eleitoral que o elegeu inúmeras vezes para deputado e, em 2018, para presidente.
O objetivo do bolsonarismo está cada vez mais evidente: produzir o caos para a partir deste gerir um golpe de Estado. Não há dúvidas sobre isso. As dúvidas são até onde esse objetivo tem adesão no Congresso, nas elites econômicas e nas Forças Armadas.
No cenário internacional, ao que parece, esse objetivo não tem respaldo. Tanto o Senado dos Estados Unidos, quanto as principais lideranças da União Europeia já manifestaram suas preocupações com as constantes tentativas de desestabilização da democracia brasileira por parte do presidente.
A desestabilização da democracia brasileira nunca esteve entre os objetivos dos governos petistas. As liberdades democráticas em nenhum momento se viram ameaçadas pelos governos Lula e Dilma. Tal fato, por si só, já desmonta a falsa tese da sincronia política entre o bolsonarismo e o petismo. O que também desmonta essa falsa tese são os atos de violência política praticados pelo bolsonarismo contra seus adversários.
Em 2018, Mestre Moa do Katentê foi assassinado por um bolsonarista após ter declarado que havia votado em Fernando Haddad. Em dezembro de 2020, Padre Júlio Lancellotti, que atua junto aos moradores de rua de São Paulo, foi ameaçado. Na última semana, o juiz que prendeu o ex-ministro da Educação Milton Ribeiro foi atacado; uma bomba caseira foi arremessada contra o comício de Lula no Rio de Janeiro; a redação do jornal Folha de S. Paulo foi atingida por um tiro; e, no último domingo, o militante petista Marcelo Arruda foi assassinado por um bolsonarista que invadiu sua festa de aniversário cujo tema era o PT.
Não existe nenhum ato correspondente a esses praticado por algum petista ou simpatizante de Lula. Nem nos últimos anos, nem nas duas décadas de polarização tucano-petista. A única afirmação sobre isso se situa no universo paralelo das Redes Sociais bolsonaristas, mas ali a realidade é o que menos importa. Por isso seguir afirmando a falsa simetria entre o bolsonarismo e o petismo é de uma desonestidade intelectual sem tamanho. É inclusive uma falta de respeito com muitos jornalistas da própria grande mídia que propaga tal tese e que tem sentindo na pele o peso da intolerância bolsonarista.
Pode-se ter todas as divergências possíveis com o petismo. Pode-se não gostar da figura do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva. Pode-se inclusive considerar um absurdo as políticas sociais adotadas pelos governos Lula e Dilma. O que não se pode é forjar uma realidade para fugir de suas responsabilidades com a fragilização da democracia brasileira. A polarização atual não é entre duas faces de autoritarismos, mas sim, entre uma força que tem compromisso com o campo democrático e uma força que o despreza. Qualquer tese que foge a isso, não faz outra coisa senão ajudar a construir o golpismo.
(*) Leonardo da Rocha Botega, que escreve no site às quintas-feiras, é formado em História e mestre em Integração Latino-Americana pela UFSM, Doutor em História pela UFRGS e Professor do Colégio Politécnico da UFSM. É também autor do livro “Quando a independência faz a união: Brasil, Argentina e a Questão Cubana (1959-1964).
‘Durante os governos Lula e Dilma não houve nenhuma tentativa por parte do petismo de forçar uma mudança na frágil democracia brasileira’: Mensalão foi ‘mesada’ paga a parlamentares para votar conforme os desejos do governo petista; Petrolão idem, grana desviada de obras via empreiteiras e caixa 2. ‘ mecanismos de controle social das políticas públicas através dos Conselhos e das Conferências mecanismos de controle social das políticas públicas através dos Conselhos e das Conferências’: os soviets, totalmente aparelhados, davam respaldo as propostas petistas e engavetavam tudo o que não era interesse do governo, as propostas que ‘precisam de maior discussão’. Sem entrar na questão ‘quem fez mais m.’, ocorreu a agressão a empresário em 2018 com agradecimento, bombas (que podem ser ‘false flag’) e ameaças que podem ser reais ou não (quem acredita em vermelhinho? estou vendendo uma Universidade no bairro Camobi). Molusco com L., o honesto, em 2016 falando com o irmão ‘os peões estão lá e se os coxinhas aparecerem vão levar porrada’. Jacques Wagner sugerindo ‘sair na porrada’ para evitar prisão decretada pelo judiciário. Cereja do bolo? Molusco com L., o honesto, visitou o reitor Paulo Burmann (e outros pelo estado) e haviam onibus com ‘militantes’ do MST fazendo a ‘segurança’. Para quem não lembra um professor aposentado da odonto da UFSM ‘levou a pior’. Golpe de Estado é narrativa, obvio, periodo eleitoral. Resumo da opera é simples, vermelhinhos não enganam ninguém além deles proprios e a cascata ‘somos anjinhos caidos do céu, vitimas, mimimi’ é só para dar risada! Kuakuakuakuakua!