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O pêndulo – por José Maria Dias Pereira

O articulista e a inversão do cenário eleitoral agora, na relação com 2018

Uma das consequências da divisão da política atual entre petistas (lulistas) e bolsonaristas é a falta de interesse pelo debate político – um dos pilares da democracia. Provavelmente exauridos pelas brigas nos almoços familiares dos domingos, nenhum lado parece disposto a ouvir os argumentos do outro lado. Segundo a última pesquisa do Datafolha (final de julho/2022), 70% dos eleitores responderam que já estão decididos sobre em quem votar para presidente nas eleições de 2 de outubro.

Petistas e bolsonaristas estão igualmente decididos: 80% responderam que estão dispostos a ir com Lula ou Bolsonaro até o fim (só 20% admitem mudar de opinião). A indecisão é maior entre eleitores de Ciro Gomes e de Simone Tebet, onde cerca de 60% dos eleitores de cada um admite que ainda pode mudar de ideia.

A disputa agora se dá mais no campo da rejeição, com cada um dos eleitores de Lula e Bolsonaro querendo provar, não que seu candidato é o melhor, mas que o outro é pior. No caso de Bolsonaro, 53% de eleitores não votariam nele de jeito nenhum, enquanto a rejeição de Lula é de 36%. É consenso entre os analistas de que ninguém com uma rejeição acima de 50% se elege. Ciente disso, Lula negocia apoios, à direita e à esquerda, “nunca antes” imaginados na história do PT.

Um expectador distante das idas e vindas da nossa política, jamais imaginaria que uma das maiores referências do PSDB (Alkmin) seria aprovado, por unanimidade pela executiva do Partido, como vice de Lula. Não custa lembrar que o PSDB teve um papel importante no impeachment de Dilma Rousseff.

Para liquidar a fatura (vencer) no primeiro turno, Lula e o PT – o que, na maioria das vezes, significa a mesma coisa – Lula terá de provar a fama de conciliador.

Até agora, saiu-se muito bem. Figuras como Luciano Bivar (União Brasil) e André Janones (Avante), desistiram de suas candidaturas à presidência da República para apoiar Lula no primeiro turno. Mas ganhar sem precisar ir para o 2 º turno, é difícil porque, neste caso, precisa ter um voto a mais do que a soma dos votos válidos de todos os outros candidatos, isto é, excluindo-se os votos brancos e nulos. Façanha obtida apenas por FHC, colhendo os louros do Plano Real.

Quando Lula deixou o poder (em 2010), com uma taxa de aprovação de 80% do seu governo, o PIB apresentava crescimento de 7,5%, a inflação anual era a metade do que é hoje, com aumento de 60% do salário-mínimo real e redução da desigualdade social da ordem de 25%. Pelo que se observa, o PT irá bater nessas teclas, quando começar o horário de propaganda eleitoral, porque sabe que a memória do povo é curta e muitos eleitores eram crianças nessa época.

A ideia é explorar os contrastes com o fim do governo Bolsonaro, com PIB projetado de 2% no máximo, queda do salário-mínimo real e volta do Brasil ao “mapa da fome” da ONU. Lembrar o passado, pode ser pouco para Lula ganhar no primeiro turno, daí a necessidade de buscar apoios de adversários históricos, o que gera insatisfação das alas mais à esquerda dentro do PT.

Bolsonaro, que não tem o que mostrar para o eleitor para provar que merece ser reeleito, recebeu do “Centrão” uma boia para se salvar de perder no primeiro turno: o pacote “kamikaze” que, a pretexto de compensar a inflação dos mais pobres (armadilha que caiu a oposição para votar a favor), cria um artificial “estado de emergência” e passa por cima do princípio constitucional que proíbe benefícios sociais em ano eleitoral.

Além do aumento de R$ 200 no auxílio às famílias carentes, usuários de gás, diesel e gasolina serão beneficiados. O custo estimado das medidas é de R$ 41 bilhões e o valor fica fora do “teto de gastos”. Além da irresponsabilidade fiscal, fica claro o caráter eleitoreiro do pacote, pois é válido só até o fim do ano. Custa a crer que a política tenha chegado a um nível tão baixo.

Nas redes sociais, só uma minoria segue os perfis de Lula ou Bolsonaro. Mais ainda, segundo o Datafolha, 43% pararam de falar sobre política no WhatsApp e 19% saíram de algum grupo. Num movimento pendular, agora se inverte o que ocorreu em 2018. Naquela ocasião, Bolsonaro ganhou as eleições por causa do antipetismo e não porque era o melhor candidato. Agora, inverte-se a situação e Lula beneficia-se do antibolsonarismo vigente. Cristalizou-se entre a esmagadora maioria dos segmentos da população, a percepção de que, neste momento, importa mais evitar a reeleição de Bolsonaro do que escolher o melhor candidato. Isso fica para 2026.

(*) José Maria Pereira é Doutor em Economia, professor aposentado do departamento de Economia e Relações Internacionais da UFSM. O artigo acima foi publicado originalmente no site editado pelo autor (AQUI) e reproduzido com a autorização dele.

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6 Comentários

  1. Na toada ‘eleição é o comparecimento de um bando de otários(as) as urnas que se lascam depois’ tem prazo de validade. Bom lembrar as Jornadas de 2013. Bom lembrar alguns projetos nas gavetas do Congresso, execução obrigatoria das emendas do relator e semi-presidencialismo. Resumo da opera: até 2026 tem muita agua para passar debaixo da ponte, muita coisa pode acontecer. Inclusive nada.

  2. Debate politico é um dos pilares da democracia quando visa a solução de problemas. Alás, democracia não se resume a eleições periodicas. Cada um sabe onde lhe aperta o sapato, como defende o leitinho dos filhos e o que acha melhor defender. Porém no inicio do seculo passado o Departamento de Imprensa e Propaganda do Estado Novo inventou o epiteto ‘pai dos pobres’ para o ditador Getulio Vargas. Evita Peron defendia os ‘descamisados’. Deu no que deu, Argentina está completamente quebrada. Estão testando para ver se ainda funciona.

  3. Discussão se o pleito se resolveria no primeiro turno chega a lugar nenhum. Nunca aconteceu para Molusco com L., o honesto, o que levaria a discussão das pesquisas e até o motivo pelo qual Dilma, a humilde e capaz, que também é responsabilidade do Sapo Barbudo, o honesto, não é senadora por MG. Pacote ‘kamikaze’, pois bem, e qual a alternativa? Deixar as criaturas na m.? Arriscar uma paralização dos caminhoneiros? Seria bom eleitoralmente para Molusco com L., o honesto, a população que se lasque?

  4. Questão de honestidade intelectual, conceito alienigena para alguns principalmente porque probidade e capacidade cognitiva também são estranhos isoladamente, Molusco com L, o honesto, pegou o boom das commodities e Cavalão pegou uma pandemia e a guerra da Ucrania. Azar dele e nosso. Conjuntura internacional quando não serve fica de fora.

  5. Na Argentina noticia-se que se o Molusco com L., o honesto, se eleger e se o novo ministro da economia melhorar minimamente o setor da pasta, Cristina Kirchner se elege presidente da Argentina ano que vem. Detalhe: ela responde a processo por corrupção. Fruto não cai longe do pé mesmo.

  6. Pesquisas acredita quem quiser. Molusco com L., o honesto, provavelmente será eleito. Motivo principal é ‘não ser o Cavalão’. Conciliação só é possivel com quem está disposto ou tem bolso fundo. Para boa parte da população é a mais pura jaguarice, para outros algo ‘muito cvilizado’. Afinal, comprar apoio no Congresso é muito ‘democratico’, algo que já aconteceu muitas vezes, inclusive para avançar a agenda de minorias politicas vermelhas.

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