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Qual o caminho do resíduo que você gera? – por Marta Tocchetto

O simples descarte não elimina a responsabilidade do gerador. Esta é solidária

O caminho trilhado pelos resíduos que descartamos revela nossas escolhas pessoais, além de refletir nossa responsabilidade individual e coletiva.

Engana-se quem pensa que o fim do caminho do resíduo gerado é o saco de plástico preto deixado na calçada. O resíduo acondicionado fica à espera da coleta para prosseguir o longo caminho da destinação e da degradação para, por fim, se incorporar novamente à natureza, completando o seu ciclo.

A destinação visa reduzir os impactos provocados pelo descarte dos materiais após o consumo que, em geral, ocorre antes da completação da vida útil. O processo de decomposição poderá ser complexo e demorado, a depender da constituição química. Esse caminho é longo e, muitas vezes, desconhecido pelo gerador que acredita tê-lo finalizado com o simples descarte.

A Política Nacional de Resíduos Sólidos estabelece que o gerador é responsável por todo o caminho que o resíduo executa até a sua degradação total ou transformação. A doação do resíduo ou mesmo a contratação de terceiros para destinação e tratamento não isenta ou elimina a responsabilidade.

A responsabilidade é solidária, ou seja, todos os elos da cadeia assumem a sua parcela em relação ao todo. Em caso de dano ao meio ambiente ou à saúde, todos serão responsabilizados administrativa e judicialmente, tendo que, inclusive, ressarcir prejuízos e custos de reparação.

A responsabilidade cessa quando ocorre a transformação do resíduo, no caso da reciclagem ou com a destruição, no caso de tratamento térmico, por exemplo. A idoneidade e a confiabilidade do responsável pela destinação são garantias importantes ao gerador, asseguradas, na maioria das vezes, pela licença ambiental. Infelizmente, na ânsia de se ver livre do resíduo, essa condição nem sempre é verificada e, não raramente, empresas são autuadas pela identificação de seus resíduos desovados em beiras de estradas, terrenos baldios e sangas. Infelizmente, como em todos os ramos, há aproveitadores cujo único objetivo é o ganho fácil. 

O resíduo urbano gerado nas residências nas cidades brasileiras é destinado preferencialmente aos aterros específicos, os quais apesar de, tecnicamente adequados, nem sempre oferecem o melhor destino, basta considerarmos os recicláveis e os resíduos orgânicos. O tempo de confinamento nestas unidades depende da composição dos materiais.

Os resíduos biodegradáveis se decompõem em um tempo menor do que os recicláveis, os quais podem levar dezenas, centenas e até milhares de anos para conclusão do processo. Passarão praticamente intactos por gerações, causando, além de sobrecarga ao planeta, comprometimento e prejuízos às futuras gerações. A propósito, lixão não é aterro e resíduo orgânico não é lixo!

Diante do crescente consumo e do incentivo a novas necessidades, reduzir torna-se imperioso ao lado de refletir sobre a real utilidade e precisão de um dado produto. Em caso de não ser possível não gerar e/ou reduzir, escolher materiais com maior reciclabilidade, além de encaminhá-los à reciclagem de fato, diminuem parte do impacto causado.

Esta prática retiraria do caminho dos aterros, os materiais que poderiam voltar ao ciclo produtivo, o que certamente ampliaria a vida útil dessas áreas de destinação, além de reduzir os custos financeiros aos municípios com coleta e disposição desnecessárias. Apenas os rejeitos, resíduos cujo reaproveitamento, técnica e/ou economicamente é inviável, devem ser encaminhados aos aterros de resíduos urbanos.

Resíduos recicláveis e orgânicos devem seguir outras rotas, as quais permitirão que os produtos da decomposição tenham melhor aproveitamento, inclusive contribuindo para a redução de custos econômicos.

É caso da substituição dos adubos sintéticos e químicos por biofertilizantes e humus. A possibilidade de retorno ao ciclo produtivo proporcionado pelos metais e minerais, ainda trazem como vantagem a conservação das reservas naturais, reduzindo a exploração e a extração.

O caminho trilhado pelos resíduos que descartamos revela também nossas escolhas pessoais, além de refletir nossa responsabilidade individual e coletiva. Dizer não às práticas consagradas e impensadas de distribuição “gratuita” de sacolas plásticas, canudos, mexedores de café, copos plásticos e outros descartáveis de uso único representa transformação de atitudes e comportamentos.

Educação ambiental também se faz com boas práticas e atitudes, aparentemente, simples e pequenas. A afirmação não significa colocar sobre os ombros do cidadão a responsabilidade pelo gerenciamento dos resíduos municipais.

O poder público deve prover as alternativas para a melhor e a correta destinação. Em notícia veiculada no final de semana, ainda não será nesse ano, 2022, que Santa Maria terá em pleno funcionamento a coleta seletiva.

Enquanto o lento processo de licitação é prometido pela Prefeitura Municipal, cabe a cada um de nós encontrar o melhor caminho para destinação dos resíduos que geramos. Os resíduos transparecem e denotam quem somos, nossa responsabilidade com o todo e com o futuro do planeta. Motivos suficientes para não cruzarmos os braços e esperar.

(*) Marta Tocchetto é Professora Titular aposentada do Departamento de Química da UFSM. É Doutora em Engenharia, na área de Ciência dos Materiais. Foi responsável pela implantação da Coleta Seletiva Solidária na UFSM e ganhadora do Prêmio Pioneiras da Ecologia 2017, concedido pela Assembleia Legislativa gaúcha. Marta Tocchetto, que também é palestrante em diversos eventos nacionais e internacionais, escreve neste espaço às terças-feiras.

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