Ana Eurídice Eufrosina de Barandas – por Elen Biguelini
A autora de “O Ramalhete de Flores escolhidas no jardim da imaginação”, de 1845, de nome verdadeiro Ana Belmira da Fonseca Barandas, era filha do cirurgião português Joaquim da Fonseca Barandas (1759-1849) e de sua segunda esposa Ana Felícia do Nascimento (cerca de 1776-1826). Ela nasceu em Porto Alegre em 8 de setembro de 1806.
Sua família era letrada e possivelmente tenha tido uma educação literária por meio do pai, assim como uma educação cultural devido aos saraus em sua casa. Seus textos apresentam um conhecimento da cultura clássica e mitologia grega, seguindo o modelo da erudição da época, o que demonstra que tinha uma educação superior quando comparada à de outras mulheres suas conterrâneas.
Era a caçula do casal, inclusive, entre filhos dos casamentos anteriores de seus pais. Não apenas a existência de saraus em sua casa, mas também a possessão paterna de escravos e diversos imóveis demonstram que era uma família rica e bem posicionada na sociedade porto alegrense. Seu avô paterno era um Morgado, uma posição que indica baixo grau de nobreza na sociedade portuguesa.
Segundo Hilda Agnes Hubner Flores seria a favorita de seu pai devido a sua erudição (Flores, 1991, 17). Possivelmente, seu talento nato para a literatura e o conhecimento lhe permitiram que seu pai auxiliasse em sua educação, como foi comum em muitas autoras mulheres ao longo dos séculos. Ainda segundo Flores, foi deixada como escolhida pelo pai para a educação de suas sobrinhas, para o quê recebia um auxilio monetário de forma oficial (Flores, 1991, 17-18).
Casou-se com José Joaquim Pena Penalva em 23 de março de 1822. Com seu marido, morou em Porto Alegre e no Rio de Janeiro, devido a função dele na sociedade, que era o Cônsul português para o sul do país. Ainda que seus sonetos demonstrem ter sido uma união por amor, o casal se divorciou segundo os moldes da época em 8 de agosto de 1843, quando Ana Eurídice retornou a capital gaúcha. Faleceu em Paraíba do Sul, uma cidade carioca, próxima a fronteira com Minas Gerais, em 23 de junho de 1863.
A poetisa e contista apresentou opiniões semelhantes a de sua contemporânea (e possivelmente conhecida) Nísia Floresta Brasileira Augusta em relação a situação das mulheres no período.
Durante a Revolução Farroupilha se posicionou a favor dos imperiais, e em “A filosofia por amor” a autora defendeu que as mulheres passassem a participar das preocupações políticas, ou seja, daquilo que diretamente influenciaria a vida dela, de seus maridos e filhos (Cf. Retamozo, s.d, 139). Para além disso, “fez uso da temática da guerra como mote para a criação literária” segundo Maria Helena de Campos Bairros, em sua tese de doutorado (2004, 75). Especialmente, através de uma homenagem ao Major Marques de Souza.
Já para Flores, na crônica “Diálogos”, encontrada no texto acima mencionado, “ela põe a desnude seus anseios femininos e mostra ser mulher avançada para seu tempo, inquieta ante os acontecimentos bélicos, pronta para a ação” (Flores, 1991, 23). A mesma autora classifica este texto como “argumentação feminista” (Flores, 1991, 26) chegando a culpar os homens pela dependência feminina, ou seja, levanta aquilo que Nísia Floresta e Mary Woolstonecraft tanto lutaram contra, o direito à liberdade.
Em seus textos, apresenta-se a vida da autora na fazenda da família, incluso durante o período da Revolução Farroupilha, que demonstra o “ambiente de fartura que Ana desfrutava no sítio Belmonte”, mas que não excluía deste local “a desolação” que chegou com a guerra (Flores, 1991, 22)
‘Ai de mim! Meu coração também tem mudado! Nele está a sede de uma imortal melancolia.” (Barrandas, Op Cit. Flores, 1991, 23)’.
Outra temática encontrada em seus textos é o casamento. No conto “Eugênia ou a filósofa apaixonada” a autora se posiciona contra o casamento arranjado, enquanto em “A queda de Safo” Ana Eurídice parece demonstrar “as funestas consequências do amor obcecado pela paixão” (Flores, 1991, 33).
A obra da autora não é facilmente encontrada, mas trechos podem ser lidos na bibliografia abaixo apresentada, enquanto o Ramalhete existe em microfilme e em edição de 1990 pela PUC-RS.
Da autora
O Ramalhete ou Flores escolhidas no jardim da imaginação por A. Eurydice Eufrozina de Barandas. Porto Alegre, Typ.de I. J. Lopes, 1845.
Referências Bibliográficas
Retamozo, Aldira Corea, et al. “O papel da Mulher na Revolução Farroupilha”. Porto Alegre: Editora Thcê!, s. d.).
Flores, Hilda Agnes Hübner. “Ana Eurídice Eufrosina de Barandas”. In: Travessia — Revista de Literatura Brasileira, 1991 (23): 15-36. Acesso via «https://periodicos.ufsc.br/index.php/travessia/issue/view/1565»
Bairros, Maria Helena Campos de. A produção de poesia lírica das mulheres sul-rio-grandenses: uma escrita amarfanhada. Doutorado. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2004. Acesso via «https://tede2.pucrs.br/tede2/bitstream/tede/1976/1/428084.pdf»
Nota da articulista: Celebrando o 100º texto com uma autora gaúcha!
(*) Elen Biguelini é doutora em História (Universidade de Coimbra, 2017) e Mestre em Estudos Feministas (Universidade de Coimbra, 2012), tendo como foco a pesquisa na história das mulheres e da autoria feminina durante o século XIX. Ela escreve semanalmente aos domingos, no Site.
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