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Educação Especial: a contribuição de Anne Sullivan – por Demetrio Cherobini

Então, “quem salvou Helen Keller das trevas da ignorância foi uma professora”

Anne Sullivan (1866-1936) foi uma educadora norte-americana que se celebrizou pelo trabalho realizado com sua aluna Helen Keller (1880-1968), menina surdo-cega que aprendeu a ler e escrever e ganhou fama internacional na vida adulta como escritora e ativista social. A história de ambas ficou imortalizada no filme O milagre de Anne Sullivan, de 1962, e também nos livros de Helen Keller.

De família muito pobre, Anne Sullivan perdeu parte da visão na infância, sendo em seguida abandonada pelo pai em um abrigo para crianças órfãs. Apesar das inúmeras dificuldades, conseguiu ingressar em uma escola para deficientes visuais, onde recebeu instrução formal e se formou professora. Logo depois, foi contratada pela família de Helen Keller, uma garotinha de sete anos de idade que havia ficado surda e cega em razão de uma doença diagnosticada na época como “febre cerebral”.

O primeiro contato entre as duas foi difícil. A própria Helen contou, anos mais tarde, em suas memórias, que naquele tempo agia como um “diabinho incorrigível” diante da professora – tinha crises terríveis, se debatia, agredia, quebrava objetos da casa etc. Mas, graças à persistência de Anne Sullivan, não só conseguiu se alfabetizar e se tornar uma grande leitora, como passou a escrever livros para contar sua incrível história.

O método de alfabetização usado por Anne Sullivan era relativamente simples: em uma das mãos da menina colocava objetos, por exemplo, água, e na outra soletrava a palavra á-g-u-a com o alfabeto manual para surdos. Dessa forma, Helen aos poucos entendeu que todas as coisas tinham nome e assim começou a compreender o mundo.

Tal história está contada em detalhe no livro Lutando contra as trevas (1955), de Helen Keller. Chama atenção aí a peculiar relação educativa que Anne Sullivan estabeleceu com sua jovem estudante. Essa relação baseava-se fundamentalmente em não sentir pena da condição deficiente de Helen, evitar a superproteção dos pais e tratar a menina de maneira exigente, como uma pessoa capaz de aprender e desenvolver capacidades. A seguinte declaração de Helen Keller é esclarecedora a esse respeito:

“Anne Sullivan tratou-me exatamente como a uma criança que vê e ouve, com exceção apenas de que, em vez de falar, escrevia as palavras em minha mão. Nunca permitiu que ninguém adotasse o excesso de zelo que pode tornar a deficiência uma tragédia. Não consentia que alguém elogiasse qualquer coisa que eu fizesse, a menos que estivesse bem feita. Encorajava minha família e meus amigos a falar-me livremente sobre todos os assuntos, para que eu aprendesse mais rapidamente a me expressar.

Agindo dessa forma, a professora conseguiu evitar muitas atitudes negativas por parte dos adultos que conviviam com Helen, como a , o mimo e a infantilização, que inibem o desenvolvimento da personalidade, e pôde ensinar habilidades fundamentais para o progresso pessoal da menina – sendo a linguagem a principal delas.

Anne Sullivan tinha, portanto, clareza de que a educação de uma pessoa com necessidades especiais não pode se basear em sentimentalismo e transigência, mas, ao contrário, precisa ser firme e coerente no objetivo de formar para uma vida ativa e participativa no interior da coletividade humana, e não para uma existência ensimesmada, isolada do mundo, acanhada e infrutífera – como muito se vê, infelizmente.

Foi por tal razão que Helen Keller afirmou: “Minha transformação em ser humano foi a obra da vida de minha professora.” Atente-se, então, para esta grande lição: quem salvou Helen Keller das trevas da ignorância não foi nenhum médico, aplicador de testes psicométricos ou escrevinhador de laudos e receitas; quem a salvou foi uma professora.

Somente no futuro, numa sociedade autoconsciente e auto-organizada, haverá condições de fazer com que essa grande experiência deixe de ser algo localizado e fortuito e se converta em regra geral na educação.

(*) Demetrio Cherobini, professor da rede municipal de Santa Maria, é licenciado em Educação Especial e bacharel e Ciências Sociais pela UFSM, mestre e doutor em Educação pela UFSM e pós-doutor em Sociologia pela Unicamp.

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