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Bet pandemia – Orlando Fonseca

"Erradicar o vírus, como já vimos em outros casos, será difícil"

Há uma pandemia solta pelo país, e não se trata de um vírus. Ao menos um vírus como os da família Corona, mas tem-se espalhado rapidamente, com a conivência de autoridades, clubes e mídia. Trata-se da “bet-pandemia” que tem contaminado um número crescente de brasileiros, desde o início deste ano, a uma média de 3,5 milhões por mês. No intervalo de tempo considerado, isso representa uma velocidade viral maior do que o período que o coronavírus levou para contagiar o mesmo número de pessoas no Brasil (11 meses, entre fevereiro de 2020 e janeiro de 2021). Tudo isso se deve à facilidade das apostas online, somada ao número, cada vez maior, de empresas de apostas. Em vista do endividamento crescente das famílias, acendeu uma luz entre autoridades e especialistas em doenças sociais. É preciso uma resposta urgente ao problema, antes que a conta seja mais alta do que as somas em dinheiro amealhadas pelas casas de apostas.

Segundo números que circulam na internet, e na imprensa, 86% das pessoas que apostam, nas chamadas Bets, têm dívida, e 64% estão negativadas na Serasa. Vinte e cinco milhões de pessoas passaram a fazer apostas esportivas em plataformas eletrônicas nos sete meses iniciais de 2024. De acordo com um estudo do Instituto Locomotiva, os apostadores desta modalidade são de baixa renda, estão endividados e possuem dois ou mais cartões de crédito, principal forma de pagamento das apostas online. A pesquisa ainda mostrou que quase metade dos apostadores é formada por jovens entre 19 e 29 anos, e 34% pertencem às classes CDE. Nas classes AB, 25% são apostadores. Segundo o Mapa Serasa Crédito de maio deste ano, 16,7% das pessoas entre 18 e 25 anos que pegam empréstimo consignado usam o dinheiro para apostas na internet.

Aposta é um vício. Segundo o Ministro Haddad, o país atravessa uma “pandemia das bets”. O testemunho do psiquiatra Fábio Aurélio Leite, de Brasília, dá conta desta tendência: o número de pessoas com compulsão em apostas tem crescido em seu consultório. Para os especialistas, o transtorno que acomete esse grupo pode ser chamado de jogo patológico, tornando-se preocupante a partir do momento em que atrapalha atividades sociais, ou leva o apostador a cometer atos irracionais para continuar jogando. O problema vai-se tornando grave, pela facilidade de acesso pelo celular, aliada à intensa publicidade nas redes sociais, através dos chamados influenciadores, e à falta de uma regulamentação atenta aos danos que se apresentam aos usuários.

O governo federal apresentou um projeto para regulamentar as casas de aposta online, cujo prazo de credenciamento se encerra semana que vem. Por estarmos tratando, como se vê, de um vício, como alcoolismo, como tabagismo, por se tratar de um vício social, é urgente a necessidade de tratamento e de abordagem social do problema. É preciso não apenas regulamentar o funcionamento das bets, mas também a publicidade, da mesma forma que, em outros tempos já se fez com a propaganda de bebidas alcoólicas e cigarro. A deputada federal, Gleisi Hoffmann, apresentou no início deste mês, um projeto de lei para proibir publicidade, divulgação e propaganda de empresas e casas de apostas online ou não, e também de produtos ligados a jogos de azar (na mesma linha do que também apresentou seu colega Reginaldo Lopes). Além de servir para orientar a população vulnerável dos perigos, é preciso também desmistificar a fala de personalidades do mundo artístico e esportivo, presentes em tais publicidades. Além de enquadrar influenciadores que alardeiam as benesses de tais apostas, pois os jogos são de “azar”, porque não há prêmios para a maioria, que além de amargar a derrota, amarga efeitos colaterais em sua saúde mental e financeira. É a vacina que falta, porque erradicar o vírus, como já vimos em outros casos, será difícil.

(*) Orlando Fonseca é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela “Da noite para o dia”.

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11 Comentários

  1. Resumo da opera III. Sem olhar a legislação, regulamentar a quantia que deve ser devolvida aos apostadores também é solução. Alas, as loterias do governo vão sofrer, não vão?

  2. Resumo da opera. Inadimplencia aumenta, bate na taxa de juros. Não na SELIC, na final ao consumidor. Depois perguntam porque as taxas são tão altas no Brasil. Ao inves de proibir publicidade negócio é limitar uso do cartão de credito em apostas ou limitar quantia por CPF se for juridicamente possivel. Algo do genero. O que teria outros efeitos.

  3. ‘Além de servir para orientar a população vulnerável dos perigos, […]’. Sim, a população segundo os vermelhos é uma criança a ser levada pela mão pelo Estado. Só esquecem que num governo de esquerda o Estado é um amontoado de ignorantes e desqualificados.

  4. ‘A deputada federal, Gleisi Hoffmann, apresentou no início deste mês, um projeto de lei para proibir publicidade,[…]’. Esta desclassificada vai ter dificuldade em conseguir os votos, logo é medida marketeira/cosmetica. Aprovada vai deixar muita gente sem renda.

  5. ‘Segundo o Ministro Haddad, […]’. Taxad está sendo ‘cevado’ para concorrer a presidencia. Fica no morde e assopra na economia. Molusco com L., abstemio, honesto e famigerado dirigente petista, é um terraplanista economico. Tem idéias furadas, mas Taxad ‘é contra’. Sem susto, é cruzar os braços e esperar.

  6. ‘Aposta é um vício.’ Para um minoria sim, é um vicio. Para outros a falta de vergonha na cara é um vicio. Olhando sob outra perspectiva ficar devendo, ficar negativado, etc. é coisa da moral pequeno burguesa. Tem muita gente que ligou o ‘dane-se’ com ‘f’ e não é de hoje.

  7. ‘ O testemunho do psiquiatra Fábio Aurélio Leite, de Brasília, dá conta desta tendência: o número de pessoas com compulsão em apostas tem crescido em seu consultório.’ Um consultorio de um especialista. Bota estatistica nisto. Alas, medico que estudou em Paris e trabalha com ‘canabis medicinal’ não parece muito coisa de classes CDE.

  8. ‘De acordo com um estudo do Instituto Locomotiva, os apostadores desta modalidade são de baixa renda, estão endividados e possuem dois ou mais cartões de crédito, principal forma de pagamento das apostas online.’ Instituto Locomotiva tem ligações com o PT. Dois ou mais cartões de credito porque mantem um padrão de vida acima das proprias possibilidades com divida. Ou seja, ‘complementam’ a renda.

  9. Das cortinas de fumaça. Há que lembrar o mesmo argumento para o numero de presos no Brasil. Numeros ‘inflacionados’. Ao final de curto periodo de tempo, se as condições continuassem as mesmas, estariamos todos presos.

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