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Imprensa tradicional é refém das confusões de Marçal nos debates em São Paulo – por Carlos Wagner

A imprensa brasileira tornou-se refém do ex-coach Pablo Marçal (PRTB), 37 anos, um dos 10 candidatos a prefeito de São Paulo, a maior e mais rica cidade da América do Sul. A técnica usada por ele para se manter nos espaços nobres dos jornais é simples, eficiente e por demais conhecida pelos repórteres. Durante os debates, ele arma uma confusão que o torna manchete dos jornais. As redações não têm como deixar de colocar o nome dele em destaque nas matérias. Afinal das contas, não é todo dia que se vê em um debate, como aconteceu da TV Cultura no dia 15 de setembro, um episódio como o da “cadeirada do Datena”. Marçal provocou tanto o apresentador de TV José Luiz Datena, 67 anos, candidato à prefeitura paulistana pelo PSDB, que ele pegou uma cadeira e atingiu o ex-coach. Virou manchete nacional e notícia até em jornais ao redor do mundo. Na última segunda-feira (23), Marçal participou de um novo debate com outros candidatos no Grupo Flow. No final, baixou o nível com o atual prefeito, Ricardo Nunes (MDB), 56 anos, que concorre à reeleição. Foi expulso do programa e deu início a mais uma confusão. Nahuel Medina, 27 anos, da equipe de Marçal, deu um soco no olho esquerdo de Duda Lima, 51 anos, marqueteiro de Nunes. O caso foi parar em uma delegacia de polícia e nas manchetes dos jornais. Onde deve ficar por um bom tempo.

Aimprensa vem batendo na tecla de que os escândalos estão puxando a candidatura de Marçal para baixo nas pesquisas de intenção de votos. Realmente, estão. Há um empate técnico no primeiro lugar entre Nunes (25%), Guilherme Boulos (PSOL), 42 anos (23%), e Marçal (20%). Os dados são de um levantamento publicado na terça-feira (24/09), feito pela Quaest Pesquisa e Consultorias. Marçal tem 4,7 milhões de seguidores nas redes sociais, o que é um bom número. As lambanças nos debates lhe dão uma importante visibilidade fora da sua bolha. O que é fundamental para quem pretende concorrer a cargos políticos nacionais, como presidente da República. Dito isto, é o seguinte: se o objetivo dele fosse única e exclusivamente a prefeitura de São Paulo, a análise da imprensa sobre as consequências dos constantes conflitos à sua popularidade estaria correta. Mas não está totalmente correta pelo seguinte motivo. O objetivo de Marçal é se tornar conhecido nacionalmente. E não existe melhor palco para isso que os debates dos candidatos nas eleições municipais de São Paulo, que além de oferecer como prêmio o governo da maior, mais populosa e mais rica cidade da América do Sul, têm como pano de fundo a disputa entre o ex-presidente da República Jair Bolsonaro (PL), 69 anos, apoiando o prefeito Nunes, e o atual presidente, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), 78 anos, ao lado de Boulos. Marçal tentou disputar com Nunes o apoio do ex-presidente. Mas fracassou e recebeu um chute no traseiro dos filhos parlamentares de Bolsonaro, Carlos, 41 anos, vereador no Rio, Flávio, 43 anos, senador do Rio de Janeiro, e Eduardo, 40 anos, deputado federal por São Paulo. Eles entenderam que a intenção de Marçal era se adonar do movimento bolsonarista e empurrar o ex-presidente para fora da política. Tratei do assunto no blog em 17/09, no post Cadeirada do Datena elegeu Marçal prefeito de São Paulo?

Frente a esta realidade construída pelos filhos do ex-presidente, Marçal resolveu “patrolar” Bolsonaro, um termo usado nas redações que significa passar por cima. Para começar, incorporou à sua maneira de fazer política uma prática muito usada pelo ex-presidente durante as mais de três décadas em que foi deputado federal pelo Rio de Janeiro, que é a seguinte: “falem bem ou falem mal, mas falem de mim”. Sempre que dizia uma bobagem que acabava nas manchetes dos jornais, Bolsonaro se vangloriava do seu nome estar no noticiário e repetia para os seus colegas parlamentares a história do “falem bem ou mal, mas falem de mim”. Aqui, eu chamo a atenção dos meus colegas repórteres e leitores para o seguinte. Bolsonaro é analógico. Os rolos que armava para aparecer nos jornais dependiam da boa vontade dos editores. Marçal é digital. A divulgação das suas lambanças são feitas pela sua equipe e em segundos chegam a todos os cantos do planeta, graças às modernas tecnologias de comunicação. Por exemplo, o caso da “cadeirada do Datana” circulou o mundo. O cálculo de Marçal é simples. Se ganhar a prefeitura de São Paulo, ótimo. Mas o objetivo dele é crescer fora da sua bolha das redes sociais e usar isso para drenar até a última gota o prestígio político do ex-presidente. E, em 2026, usá-lo para concorrer a presidente da República. Lembro que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tornou Bolsonaro inelegível até 2030. Em 2026, o ex-presidente deverá indicar alguém para concorrer no seu lugar, o nome preferido por enquanto é o do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), 49 anos. Essa estratégia mantém o ex-presidente no jogo político. Abandonar o jogo não faz parte dos planos de Bolsonaro. De onde Marcel tirou a ideia de que pode ser o líder do bolsonarismo?

Essa pergunta será respondida pelo tempo. Qualquer coisa que se falar é especulação. Durante o seu mandato (2018 a 2022), Bolsonaro se manteve como um dos defensores das ideias da extrema direita, enaltecendo a ação dos torturadores do regime militar (1964 a 1985). E também fez laços de amizades com o ex-presidente dos Estados Unidos (2017 a 2021 ) Donald Trump (republicano), 78 anos. Trump tenta voltar ao cargo nas eleições presidenciais americanas de novembro. Concorre com a vice-presidente Kamala Harris (democrata), 59 anos. A disputa está praticamente empatada. Se ele vencer as eleições, mesmo que não dê a mínima atenção para Bolsonaro, o ex-presidente brasileiro pode “cantar marra” que seu amigo é presidente dos Estados Unidos. Esse procedimento movimenta as bases do movimento bolsonarista. Há um fator que devemos levar em consideração. Tanto o ex-presidente quanto Marçal não são pessoas que agem “conforme o planejado”. Aprendemos durante o governo do ex-presidente que ele não tem um plano de ação, pelo menos, alinhavado. Ele age conforma a conjuntura do momento. Durante o governo de Bolsonaro, todas as bobagens ditas por ele, e foram muitas, viravam manchete nos jornais porque tinham sido ditas pelo presidente da República. No caso de Marçal, a imprensa não tem como não publicar as suas lambanças nos debates da eleição de São Paulo.

SOBRE O AUTOR:  Carlos Wagner é repórter, graduado em Comunicação Social – habilitação em Jornalismo, pela UFRGS. Trabalhou como repórter investigativo no jornal Zero Hora de 1983 a 2014. Recebeu 38 prêmios de Jornalismo, entre eles, sete Prêmios Esso regionais. Tem 17 livros publicados, como “País Bandido”. Aos 73 anos, foi homenageado no 12º encontro da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (ABRAJI), em 2017, SP.

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