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Democracia – por Orlando Fonseca

“Falando nisso, será que existe mesmo uma polaridade no país?”

Mesmo sem ter em conta o resultado, as eleições representam uma celebração da democracia. Apesar dos ataques que vem sofrendo, o regime democrático ainda permanece soberano, e o exercício do voto consolida a vontade cidadã, para que se tenha uma república brasileira saudável.

Nos últimos anos, ela esteve a perigo, pela vontade de um grupo descontente com o sistema vigente, e saudoso dos tempos em que a exceção, o obscurantismo e a repressão desenharam um Brasil que perdeu importância no mundo.

Por isso, nestes dias em que se escolhem os representantes do parlamento local e as administrações municipais, onde se inicia a vida nacional, é preciso tornar a valorizar, repetir exaustivamente, que só a democracia pode fazer prosperar uma nação.

Com certeza, a vida democrática não se esgota no voto, mas é a partir dele que se constrói todo o resto. Exercê-lo de modo consciente é a única fórmula de se constituir um sistema justo e consequente, com a pluralidade de projetos, ideias e práticas. Mas de que consciência estamos falando mesmo? Houve época, no Brasil, em que o voto era exercido como se criava o gado no curral ou no campo: a cabresto. Aos eleitores só cabia a alternativa de escolher o que os seus patrões mandavam.

Esta prática, na infância da vida republicana, repetia o modo de vida na escravatura, que, ao menos na letra da lei, deveria ter acabado junto com a monarquia. Depois, ao longo de décadas e de aprendizado democrático, o povo foi tomando ciência de sua função e importância. No entanto, o voto a cabresto foi assumindo outras formas e ainda subsiste com novos disfarces.

Por isso a necessidade de se insistir que a consciência de que se fala é o conhecimento do papel do eleitor na construção da cidadania, fazer suas escolhas livremente, sem coerção monetária, ideológica ou mistificadora. Conhecendo os candidatos e se informando sobre suas propostas. Nos últimos processos eleitorais, constituiu-se um embate a que muitos chamam de polaridade e radicalismo. Consciência, sem dúvida, é mais do que se posicionar em um dos lados deste jogo.

Falando nisso, será que existe mesmo uma polaridade no país? A mim parece uma narrativa inventada, a partir de uma falsa impressão, para fabricar opostos. Na última eleição presidencial, houve uma disputa acirrada entre dois candidatos com propostas diametralmente opostas. O que, naturalmente, produz uma disputa capaz de formar grupos distintos. No entanto, a tal da radicalidade perdura em um dos polos, qual seja, o daqueles que, descontente com o resultado das eleições, tentaram dar um golpe, em 8 de janeiro do ano passado.

No outro polo, não se vê um radicalismo capaz de atentar contra os pilares da democracia, nem a difusão de um discurso de ataque. Para mim, a polaridade havida nas eleições, não perdura na produção de ideias nos campos opostos de direita e esquerda. Até porque, a atual presidência é exercida dentro do modelo de coalizão, única forma de dar certo, com uma tendência para o centro, e não para os polos opostos.

Quer dizer, deixemos de conversa fiada e vamos à luta: construir, democraticamente, um estado de direito, capaz de garantir dignidade e fortalecer a cidadania. E isso se faz, começando pelo voto, e ao longo dos mandatos, fiscalizar a ação de nossos representantes, com diálogo, e não com discurso de ódio, dentro das regras que permitem a composição de maioria.

O Brasil está precisando de uma harmonização eleitoral, que garanta a convivência entre a população, e que fortaleça a ação dos três poderes da república. Ao menos é nisso que eu acredito, vislumbrando a possibilidade de que o país cresça, começando pelo território vivencial das cidades, as quais começam um novo ciclo nesta semana, ou talvez mais alguns dias, com os resultados do segundo turno. Vida longa à democracia!  

(*) Orlando Fonseca é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela “Da noite para o dia”.

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